Título: Lula defende salário justo para servidores
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Fonte: O Globo, 24/02/2005, O País, p. 8

No momento em que o Legislativo e o Judiciário negociam reajuste salarial para parlamentares e ministros do Supremo Tribunal Federal, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva defendeu ontem salários mais justos e maiores para o funcionalismo público. Na cerimônia de entrega do Prêmio Nacional de Gestão Pública, Lula criticou a concepção de Estado mínimo defendida por seu antecessor, Fernando Henrique Cardoso. Para ele, o modelo ¿menospreza valores da convivência republicana, distorce direitos da cidadania, alimenta privilégios, a exclusão e impasses¿.

¿ Função importante no governo tem que ter salário condizente com a função que nós determinarmos que é importante. Porque, se não for assim, a máquina pública, com exceção de alguns órgãos, perderá tantos quantos forem formados para a iniciativa privada que, possivelmente, critica a máquina pública a fim de pegar os bons servidores que formamos durante muitos anos ¿ disse Lula.

Para Lula, o Brasil só terá uma máquina pública profissional e competente se respeitar o servidor público, que é concursado e não está a serviço de um presidente ou um ministro:

¿ Essa é a diferença fundamental de uma máquina pública que funciona para uma máquina em que os servidores são transformados em cabos eleitorais dos partidos que ganham as eleições. Essa relação de respeito, reconhecimento do valor do exercício da função de setores mais importantes do Estado permitirá que a gente tenha uma máquina invejável, que sirva de parâmetro para qualquer outra atividade no país.

¿Estou cansado de ouvir críticas¿

O presidente condenou ainda a diferença entre os salários pagos pelo serviço público e a iniciativa privada, que vem fazendo a máquina federal perder seus melhores quadros:

¿ Estou cansado de ler, ver e ouvir críticas a salários de servidores e, ao mesmo tempo, de ver servidores da iniciativa privada, não mais qualificados do que aqueles que estão sendo criticados, ganhando três ou quatro vezes mais do que os que estão na máquina pública.

Na avaliação de Lula, o Estado não pode ser mínimo e nem apenas socialmente justo.

¿ O Estado tem de ser aquilo que a sociedade precisa que a sociedade seja e ao mesmo tempo tem de estar a serviço de todos os brasileiros. Não apenas a serviço daqueles que conseguem chegar perto do Estado ¿ defendeu. ¿ É necessário que a gente tenha uma relação de respeito com o servidor, que não se candidatou, mas prestou um concurso, que não deve ter uma vida passageira, mas a vida inteira a serviço do Estado brasileiro e não a serviço de um presidente, um governador ou um ministro.

Lula criticou ainda a excessiva terceirização da máquina pública, que inviabilizaria a cobrança por um serviço de qualidade. Lembrou que reabriu e criou mais de 37 mil vagas nos setores de educação, segurança pública, saúde e previdência, metade delas para substituir funcionários temporários, terceirizados ou ligados a organismos internacionais. E não perdeu a oportunidade de dar mais uma alfinetada no ex-presidente Fernando Henrique.

¿ A imprevidência política que acionou o estrondoso apagão de 2001 teve contrapartida oculta e silenciosa, que solapou a máquina pública e corroeu o Estado ao longo de anos.

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Folha maior, com menos investimentos

BRASÍLIA. Com salários justos ou não, a bola de neve em que se transformou o gasto público com a folha de pagamento do funcionalismo não pára de crescer. Em 2003, o governo gastava R$75,8 bilhões para pagar ao pessoal da ativa, a aposentados e pensionistas do serviço público, mas este gasto vai saltar para R$90 bilhões este ano. A área econômica do governo reconhece que essa é uma camisa-de-força que impede qualquer folga para investimentos em projetos de infra-estrutura e saneamento e na área social. Na contramão do crescimento dos gastos com pessoal, este setores terão este ano apenas R$74,9 bilhões.

Fontes da área econômica atribuem o pesado ônus da folha à Constituição de 1988, que obrigou a União a assumir centenas de funcionários que eram regidos pela CLT. Eles se tornaram estatutários e passaram a ser da responsabilidade do Tesouro. Mesmo com este aumento desproporcional, os números do Ministério do Planejamento mostram que, de 1995 até 2004, os gastos com pessoal vêm sendo reduzidos se comparados com a Receita Líquida da União. Em 1995, eram gastos o equivalente a 28% da receita com a folha. Em 2004, esse gasto caiu para cerca de 18%.

Essa queda, no entanto, não foi conseqüência de milagre do governo passado ou do atual. No período, a carga tributária cresceu de 27,5% do PIB para algo em torno de 36%.

PSDB fecha questão contra reajustes

Partido considera inoportuno conceder aumento a juízes e parlamentares

BRASÍLIA. A executiva do PSDB fechou questão ontem contra projetos de reajuste salarial para o Judiciário e para o Legislativo. O partido não aceita sequer discutir o assunto agora. A decisão tem também o objetivo de sair na frente e marcar posição, já que o PT pode ir por caminho semelhante.

¿ Apoiar aumento seria politicamente desastroso para o partido e uma bóia para o PT, que está se afogando. Se o PT quiser ficar do nosso lado, ótimo ¿ disse o líder do partido, senador Arthur Virgílio (AM).

O líder na Câmara, Alberto Goldmann (SP), afirmou que não é a hora para tratar de aumento para parlamentares e juízes, quando o salário-mínimo é de R$260 e passará para R$300. Ele disse que o reajuste causaria um efeito cascata, com aumentos em estados e municípios:

¿ É uma tsunami salarial.

A reunião tratou também da sucessão presidencial. Tucanos de diversos estados pressionam a direção a antecipar o processo de escolha do candidato. O ex-governador de Mato Grosso Dante de Oliveira apresentou uma moção pedindo a escolha já. O PSDB do estado decidiu propor o nome do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin.

A idéia é seguir os passos do PFL, que fez do prefeito do Rio, Cesar Maia, pré-candidato, e o transformou em estrela no programa do partido.

¿ A inércia pode inviabilizar uma chapa futura com o PFL tendo um tucano na cabeça de chapa ¿ argumenta Dante.

Aécio, Tasso e FH também foram citados por tucanos

O governador de Minas, Aécio Neves, o senador Tasso Jereissati (CE) e o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso também foram citados.

¿ A bola da vez é Alckmin ¿ afirmou Virgílio.

O senador Álvaro Dias (PR) lembrou que o presidente Lula tem ampla exposição na mídia:

¿ Lula tem discurso de candidato e ocupa completamente o palanque eletrônico. Para concorrer com ele, só a Maria do Carmo ¿ disse Dias, referindo-se à personagem da novela "Senhora do destino".

Alckmin, no entanto, resiste à idéia de se expor. O PSDB quer vê-lo viajando pelo país e ontem, por meio do secretário de Governo de São Paulo, Arnaldo Madeira, foram feitos convites para visitas a diversos estados.

¿ O governador pensa em governar. Não é hora de decisão. Isso vai acontecer no segundo semestre ¿ disse Madeira.

FH: PT contribui para destruir partidos

Genoino rebate e diz que foi PSDB que descumpriu acordo na Câmara

SÃO PAULO. O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso criticou ontem, em Washington, o presidente do PT, José Genoino, dizendo que, ao estimular o troca-troca partidário para a eleição da nova Mesa da Câmara, o PT contribuiu para o ¿processo de destruição¿ dos partidos. As críticas foram feitas no "Bom Dia Brasil", da Rede Globo, ontem cedo. Genoino rebateu dizendo que foi o PSDB que preferiu ficar com uma candidatura avulsa contra o acordo para respeitar a proporcionalidade das bancadas na Casa.

¿ Genoino está numa posição clara: tudo o que eu falo, ele fala ao contrário, e diz errado, porque não sou a favor do quanto pior, melhor. Parece-me que está havendo no Brasil uma destruição do sentido de partido político. Cada vez mais, parece que são legendas. O governo, aparentemente pelo que eu vejo, ajuda nesse processo, tira deputado do partido e bota em outro. Os partidos de oposição perderam quadro ¿ disse Fernando Henrique.

Genoino diz que não vai polemizar com tucano

Na entrevista, Fernando Henrique disse ainda que não considera positivo ¿aquele troca-troca de partido, de deputados de um partido para outro partido¿:

¿ Acho que é preciso ter mais um partido, senão fica o PT preservado e os outros em uma geléia geral, eu sou contra isso ¿ afirmou o ex-presidente.

Em resposta, Genoino disse não querer polemizar com o ex-presidente, mas não aceitou as críticas:

¿ Os fatos e as ações falam por si. São públicos e não vou brigar contra as verdades. O PT propôs um acordo institucional com todos os partidos para fazer uma Mesa que respeitasse as bancadas partidárias. E parte considerável do PSDB preferiu a candidatura avulsa. É a polêmica política sem nenhum ataque e sem bate-boca ¿ disse Genoino.

`Financial Times¿: agenda de reformas corre risco

Jornal britânico diz que derrota do PT na Câmara vai dificultar aprovação de projetos

O risco de o presidente Luiz Inácio Lula da Silva não conseguir implementar uma agressiva agenda de reformas estruturais que ajudem a consolidar o crescimento econômico brasileiro foi tema de reportagem publicada ontem no jornal ¿Financial Times¿. O texto, cujo título é ¿Lula, sob ataque de todos os lados¿, justifica a dificuldade do governo para impor sua agenda com ¿a humilhante derrota¿ sofrida pelo PT para a presidência da Câmara.

Segundo o Financial Times, ¿o fracasso do PT para conquistar o cargo de liderança mina sua capacidade de definir a agenda da Câmara¿. Além disso, o jornal afirma que o novo presidente da Casa, Severino Cavalcanti, contestou vários projetos, criticou a política monetária do governo Lula e irritou líderes com seu discurso muitas vezes grosseiro.

Jornal diz que Severino é contra autonomia do BC

O ¿Financial Times¿ cita episódio em que Severino referiu-se ao ministro da Fazenda, Antonio Palocci, e ao presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, como ¿tecnocratas insensíveis¿ e disse que o Banco Central precisa de um cabresto. O fato mais ameaçador para o governo Lula, de acordo com o jornal, é que Severino se diz contrário ao projeto de lei para garantir a autonomia do Banco Central, considerado chave para aumentar a confiança dos investidores.

Reportagem explica que PT enfrenta problemas internos

O jornal descreve ainda os problemas políticos que o PT vem enfrentando depois da derrota na Câmara, com aliados descontentes exigindo ministérios em troca de apoio. Além disso, fala dos problemas internos do partido, e diz que a derrota do governo ¿deu força aos dissidentes nas fileiras do PT¿.

Sobre Severino, a reportagem do jornal britânico diz que ele apoiou protestos contra a MP 232, um projeto do governo, o que obrigou Palocci a negociar emendas com líderes do Congresso. O ¿Financial Times¿ explica que Severino se opõe à maior parte da agenda do PT, desde os direitos gays à pesquisa com células-tronco, e descreve-o como católico devoto e anticomunista convicto durante o regime militar.

A reportagem termina dizendo que Lula tentou minimizar as diferenças com Severino. E que o o novo presidente da Câmara ampliou seu apoio ao anunciar que vai praticamente dobrar os subsídios dos deputados.