Título: Ameaça de renúncia em peso na comissão de anistia acirra crise
Autor: Mendes, Vannildo; Monteiro, Tânia
Fonte: O Estado de São Paulo, 30/10/2008, Nacional, p. A15

Ameaças de renúncia e uma dura nota de repúdio da Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos aprofundaram ontem a crise gerada no governo pelo parecer da Advocacia-Geral da União (AGU) que considera perdoados pela Lei da Anistia os crimes de tortura cometidos na ditadura militar (1964-1985).

Entenda o processo que resultou na Lei da Anistia

Com o parecer, feito para contestar ação movida na Justiça paulista pelo Ministério Público em defesa da punição de violadores de direitos humanos, a União, segundo a comissão, ¿preferiu assumir postura que beneficia os torturadores¿.

Um dos conselheiros, Augustino Veit, chegou a pensar em propor renúncia coletiva, mas foi dissuadido pelos colegas, para não enfraquecer a posição dos ministros Tarso Genro (Justiça) e Paulo Vannuchi (Direitos Humanos), que lideram a ala do governo favorável à punição de torturadores. Veit foi convencido a assinar a nota, aderindo à posição de aguardar o julgamento da ação.

A proposta de renúncia, como apurou o Estado, será colocada em pauta se Vannuchi, em protesto, deixar a Secretaria de Direitos Humanos, à qual o conselho está ligado. Por meio da assessoria, Vannuchi informou que mantém a sua posição contrária à AGU, mas negou que esteja demissionário, preferindo aguardar o julgamento do STF, mesma posição de Tarso.

Na nota, a comissão alega que a AGU sustentou uma interpretação da anistia polêmica e sem guarida em qualquer instrumento legal, quando estende o benefício a agentes do Estado que torturaram.

'CHEFES'

¿Procurou isentar aqueles que foram chefes do mais famoso centro de torturas do País de devolver à União as indenizações pagas às famílias dos que ali foram mortos sob tortura¿, diz a nota, atacando a AGU. A comissão se refere aos coronéis reformados do Exército Carlos Alberto Brilhante Ustra e Audir Santos Maciel, acusados, em processo que corre na Justiça de São Paulo, de violações aos direitos humanos.

Procurada para se pronunciar sobre a nota, a AGU informou que sustenta a tese do perdão mútuo e tomará conhecimento dos termos da nota para se manifestar. Já os militares voltaram a rebater os críticos.

O general da reserva Osvaldo Pereira Gomes, que integrou a primeira comissão de desaparecidos e trabalhou na elaboração da Lei de Anistia, acusou os atuais membros de buscarem ¿holofotes¿ e usarem ¿velhas bandeiras¿, em vez de buscar o aperfeiçoamento democrático. Ele criticou, ainda, o que intitulou de ¿indústria das indenizações¿ - ¿porque sugou milhões de reais do contribuinte¿ - e defendeu o fim dos pagamentos.