Título: A ameaça inflacionária
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 07/01/2008, Notas e Informações, p. A3

Consumidores e empresários entram em 2008 exibindo otimismo e tanto os investimentos quanto as contratações devem crescer nos próximos meses, de acordo com as últimas pesquisas divulgadas no fim de ano por entidades acadêmicas, da indústria e do comércio. Todas as projeções apontam para um crescimento robusto do Produto Interno Bruto (PIB) - em torno de 4,5%, menor que o de 2007, mas ainda satisfatório. A principal preocupação exibida pela maior parte dos analistas é com a intensificação das pressões inflacionárias, a ameaça mais importante à elevação real do poder de compra dos salários.

Os cenários traçados para os preços estão longe de ser desastrosos, mas têm piorado de forma consistente. Os analistas do mercado financeiro aumentaram pela sexta vez consecutiva, na semana passada, a estimativa da inflação de 2007, medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), o referencial adotado para a política oficial. A mediana subiu de 4,35% para 4,36% nas últimas duas semanas do ano. Há um mês estava em 3,96%. A projeção para 2008 subiu de 4,25% para 4,30% nas semanas finais de dezembro. Há quatro semanas, a mediana era de 4,10%.

Segundo o Banco Central (BC), ¿persistem as perspectivas favoráveis ao cumprimento das metas de inflação¿. O cenário básico desenhado pela autoridade monetária ainda é razoavelmente otimista, com uma alta acumulada de 4,3% no final de 2008, pouco abaixo do centro da meta, 4,5%. Esses cálculos, no entanto, não anulam as advertências. Em seu último Relatório de Inflação de 2007, divulgado no final do mês passado, os técnicos do BC apontam um ¿cenário de maior risco de aceleração¿ dos aumentos de preços. De acordo com sua análise, o ¿cenário marcadamente benigno¿ observado em 2006 ¿arrefeceu em 2007¿.

Parte das ameaças é de origem externa e esse dado é amplamente reconhecido pelos analistas do setor privado e das instituições de pesquisas. Já no primeiro dia útil de 2008 o preço do barril de petróleo em Nova York encostou em US$ 100. Nada, por enquanto, indica um enfraquecimento das cotações do petróleo nos próximos meses, mesmo com o provável esfriamento da economia americana. Enquanto China, Índia e outros emergentes mantiverem o dinamismo exibido nos últimos anos, os preços desse e de outros produtos básicos permanecerão pressionados. O mesmo efeito ainda será observado, provavelmente, nas cotações dos produtos agropecuários - uma conseqüência da incorporação de grandes massas de trabalhadores aos mercados urbanos de consumo.

Uma segunda pressão importante será de origem interna. Os Índices Gerais de Preços (IGPs) subiram muito em 2007, puxados principalmente pelas cotações nos mercados atacadistas. Esses aumentos afetarão, em 2008, as correções de tarifas e outros preços indexados, como aluguéis e mensalidades escolares. Apesar disso, os técnicos do BC mostraram algum otimismo quanto à evolução dos preços administrados, mencionando a possibilidade de novos cortes nas tarifas de energia.

O câmbio, um importante fator de contenção dos preços nos últimos dois anos, será menos favorável aos consumidores em 2008, de acordo com as projeções do mercado. Segundo a última pesquisa Focus, o dólar valerá em média R$ 1,78, nos próximos 12 meses, e no fim do ano a cotação terá chegado a R$ 1,80, acima, portanto, da cotação final de 2007.

Com essas perspectivas, há poucas apostas em novos cortes da taxa básica de juros. Há um mês, projetava-se uma redução dos atuais 11,25% para 10,25% no fim de 2008. Na última pesquisa Focus, a projeção foi elevada para 10,75%. Para o ano todo, portanto, nada além de uma redução de 0,5 ponto porcentual, e, provavelmente, só no segundo semestre. Os mais pessimistas, naturalmente, não descartam um novo aumento da taxa nos próximos meses.

A evolução efetiva dos preços dependerá em boa parte da política orçamentária. Se o governo ceder à tentação de maiores gastos para interferir nas eleições municipais, o desmando financeiro se refletirá numa inflação maior. Como contrapartida, o salário real crescerá menos, ou até poderá encolher, mesmo com aumento do emprego, e uma nova alta dos juros será muito mais provável.

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