Título: Agências sufocadas
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Fonte: O Estado de São Paulo, 14/07/2007, Notas & Informações, p. A3

O governo Lula está sufocando financeiramente as principais agências reguladoras. Quem disse isso foram seus dirigentes, em audiência pública realizada quarta-feira, na Câmara dos Deputados. Recebendo recursos muito inferiores aos arrecadados e aos previstos em seus orçamentos, as agências não podem cumprir suas atribuições legais, com o risco de graves prejuízos para os consumidores e para o Tesouro.

A Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) arrecadará neste ano cerca de R$ 2 bilhões apenas com as taxas cobradas das operadoras de telefonia para sustentar o Fundo de Fiscalização das Telecomunicações (Fistel), mas seu orçamento anual autorizado é de R$ 255 milhões e ela só disporá de R$ 71 milhões para ações fiscalizatórias. Segundo seu presidente, Ronaldo Sardenberg, entre 1998 e 2006 caiu de 50% para apenas 13% a proporção entre a arrecadação e as despesas autorizadas pelo governo. ¿Isto impede o planejamento¿, disse Sardenberg.

A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) arrecadará R$ 332 milhões a título de taxa de fiscalização, incluída nas contas de consumo, mas seu orçamento é de apenas R$ 112 milhões. A Agência Nacional do Petróleo (ANP) teria direito a 28% da Participação Especial, espécie de royalty pago pelas empresas petrolíferas, o que lhe asseguraria R$ 2,612 bilhões neste ano, mas seu orçamento é de R$ 300 milhões e, com o contingenciamento de despesas, ela só receberá R$ 160 milhões.

É total o descompasso entre as responsabilidades das agências e os recursos de que dispõem. Elas são responsáveis pela fiscalização de segmentos de enorme importância econômica. Tem de acompanhar de perto as atividades de empresas estatais e privadas de grande porte. A Anatel, por exemplo, deve ainda ¿implementar, acompanhar e fiscalizar os programas, projetos e atividades que aplicarem recursos do Fust¿, o Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações. Mas a quase totalidade desses recursos não foi liberada.

A Aneel tem de licitar novas concessões, fixar critérios para a cobrança das Tarifas de Uso dos Sistemas de Transmissão e Distribuição (Tust e Tusd), gerir os contratos de concessão e implementar as políticas do governo federal para a exploração da energia elétrica. Terá, portanto, papel decisivo no esforço para evitar um novo apagão.

A ANP tem de implementar a política nacional para o petróleo, promovendo estudos para a delimitação de blocos exploratórios; regular a execução de serviços de geologia e geofísica; elaborar os editais e promover as licitações; autorizar a prática das atividades de refino, processamento, transporte, importação e exportação; estabelecer critérios para o cálculo de tarifas de transporte dutoviário; e fiscalizar a indústria do petróleo. A lei que criou a ANP obriga a agência, ao ¿tomar conhecimento de fatos que configurem ou possam configurar infração da ordem econômica¿, comunicá-los ao Conselho Administrativo de Defesa da Ordem Econômica (Cade).

Para tanto é preciso ter os meios, mas, ao contrário do que manda a lei, a União está-se valendo das agências para reforçar a caixa do Tesouro. De cada R$ 100,00 arrecadados pela Anatel, apenas R$ 13,00 ficam na agência e R$ 87,00 ajudam a aumentar o superávit primário, observou Sardenberg.

Ainda pior, segundo Haroldo Lima, diretor-geral da ANP, é a impossibilidade de fiscalizar adequadamente as 210 instalações de hidrocarbonetos em terra e 115 no mar, o que incumbe à agência. A cada 1% de erro no cálculo sobre o volume produzido, o governo perde R$ 100 milhões em royalties, em detrimento de 10 Estados e 800 municípios produtores, calcula ele. No segmento de combustíveis, a sonegação tributária pode atingir R$ 3 bilhões.

Não é novidade a má vontade do governo Lula com as agências, cuja independência formal incomoda o Executivo. Prova disto é que o relator do projeto de lei geral das agências desistiu de manter a figura do orçamento próprio, que lhes daria independência financeira. Elas continuarão a depender das liberações do Tesouro.