Título: Um ano depois, Nildo vive de bico
Autor: Mendes, Vannildo
Fonte: O Estado de São Paulo, 27/03/2007, Nacional, p. A10

Passado exatamente um ano da demissão de Antonio Palocci (PT-SP) do Ministério da Fazenda, por envolvimento na quebra ilegal do sigilo bancário do caseiro Francenildo dos Santos Costa, o Nildo, o inquérito contra o ex-ministro está parado no Supremo Tribunal Federal (STF), onde aguarda parecer do Ministério Público. Enquanto Palocci, hoje deputado federal, com foro privilegiado, lança livro, dá entrevistas e faz palestra como celebridade, Nildo perdeu o emprego, a mulher e a tranqüilidade.

Desempregado, ele vive o estigma do delator e sobrevive de bicos. Atualmente, ganha um salário mínimo - metade do que recebia na época do escândalo, como jardineiro diarista numa casa do Lago Sul.

Toda vez que surge uma promessa de trabalho - a última foi na Embaixada do Zimbábue -, é despachado quando o contratante vê a ficha e percebe de quem se trata. ¿A minha vida só fez piorar. Fiquei mais queimado do que ele (Palocci) por ter falado a verdade¿, lamenta.

Nildo é visto com desconfiança e alvo freqüente de chacotas. ¿Alguns, além de me recusarem o emprego, ainda perguntam se eu não recebi mesmo propina para denunciar o ministro¿, relata.

Até no Piauí, seu Estado natal, as conseqüências do gesto se fazem sentir na vida de sua família. A avó de Nildo passou mal dias atrás, ao ver seu nome citado nos jornais, quando o inquérito seguiu da Justiça Federal para o STF.

A mãe do caseiro, igualmente desempregada, sofre deboches freqüentes e é discriminada na hora de conseguir trabalho. ¿Ela está comendo o pão que o diabo amassou por minha causa¿, lamenta o caseiro.

O escândalo ainda agravou o relacionamento entre Nildo e a mulher , que o abandonou, assustada com as conseqüências do caso para si e para o filho.

Apesar de tudo, o caseiro garante que não está arrependido e hoje faria o mesmo. ¿A minha palavra é aquela até a morte. Falei o que vi. Fui criado e ensinado a não roubar e não mentir. Na minha cabeça, eu penso que, se tiver muitos outros brasileiros assim, o Brasil sai desse buraco em que se encontra.¿

Em março de 2006, em entrevista ao Estado, Nildo acusou Palocci, então o mais poderoso ministro do governo, de freqüentar uma mansão no Lago Sul onde lobistas de Ribeirão Preto realizariam festas e negócios escusos. Em retaliação, dirigentes do alto escalão do governo quebraram o sigilo bancário do caseiro e realizaram uma devassa ilegal em sua vida.

Quando o escândalo veio à tona, Palocci perdeu o cargo e passou a responder a processo por quebra de sigilo bancário e funcional, prevaricação e denunciação caluniosa. Caíram no escândalo o então presidente da Caixa Econômica Federal, Jorge Mattoso, e quatro altos assessores do governo.