Título: Projeto cria Território do Pantanal
Autor: Lígia Formenti
Fonte: O Estado de São Paulo, 02/05/2006, Vida&, p. A13

Proposta do deputado Gabeira para preservar região é atacada por governadores e não convence ambientalistas

Um projeto apresentado em novembro de 2003 pelo deputado Fernando Gabeira começa agora a despertar a atenção - e exaltar os ânimos - de governantes, ambientalistas e moradores do Centro-Oeste. O projeto propõe a criação do Território Federal do Pantanal, numa área de 138 mil km2 onde estão cinco municípios do Mato Grosso e 17 do Mato Grosso do Sul, todos em planície.

O texto foi aprovado no início do ano pela Comissão da Amazônia, Integração Nacional e Desenvolvimento Regional da Câmara dos Deputados e agora será apreciado na Comissão de Constituição e Justiça. Gabeira acredita que nesta nova etapa o projeto também será aprovado sem dificuldades. "Mas a tramitação ainda deve demorar, o que pode propiciar um bom debate", afirmou.

A idéia de propor a criação do Território surgiu depois de o deputado fazer uma visita à região e conversar com integrantes de um movimento de prefeitos que há tempos pede a alteração. Gabeira ficou convencido de que o Território seria uma arma eficaz para evitar problemas hoje comuns no Pantanal. "Além de evitar gastos com burocracia, o Território evitaria ações duplicadas, medidas esparsas para proteger e preservar a região", defende.

Para Gabeira, o fato de áreas do Pantanal estarem distribuídas em dois Estados acaba provocando um jogo de empurra na realização de políticas ambientais, sem falar na pulverização da aplicação de recursos. "Com a estrutura existente, não se consegue criar uma política única, extremamente importante para ações rápidas e eficazes", ponderou.

O projeto prevê uma etapa intermediária antes da criação do Território. O texto propõe a realização de um plebiscito para que as populações do Mato Grosso e Mato Grosso do Sul se manifestem sobre a idéia. Se a proposta for aceita, aí sim será enviado ao Congresso um projeto de lei complementar, propondo a criação do território.

Com o avanço do projeto no Congresso, as manifestações começam a ganhar corpo. Os dois governos já deram sinais claros de desaprovação. Uma reação esperada. Mato Grosso do Sul, por exemplo, perderia com a proposta 40% de seu território. A idéia de Gabeira também não convence ambientalistas. Para o diretor da ONG ambiental Ecoa, Alcides Faria, a criação de um Território teria um efeito contrário ao desejado. "Em vez de proteger, uma mudança como essa poderia deixar o campo livre para atividades predatórias na região", afirmou. Faria observa que o Território abrangeria somente parte do Pantanal, a área de planície. "O Pantanal é muito mais do que a área delimitada pelo projeto. Tem a área de planalto, extremamente importante."

O diretor de cerrado e pantanal da ONG Conservação Internacional, Ricardo Bonfim Machado, tem avaliação semelhante. Ele considera essencial para a preservação da região que se adotem medidas em todas as áreas. "Se a região do planalto não for atendida,haverá reflexos para a planície. Trata-se de um sistema único."

Para Machado, o caminho ideal seria a formação de um pacto entre os Estados, sociedade civil e governo federal. "A solução não está em mudanças administrativas, mas na criação de um plano em que todos tenham metas", observa.

Entre as medidas sugeridas por Machado está a valorização do gado pantaneiro. Tal atividade, perfeitamente adaptada à região, tem custos mais elevados do que outros sistemas de pecuária. "Para incentivar o produtor, o ideal é criar, por exemplo, selos de qualidade e procedência, que trariam compensações ao criador." Um sistema equivalente ao da venda de madeira certificada.