Título: Agora Lula quer ficar de bem com a imprensa
Autor: Tânia Monteiro
Fonte: O Estado de São Paulo, 30/04/2006, Nacional, p. A9

Após três anos e meio refratário a jornalistas, presidente passou a dar entrevistas a toda hora

Durante três anos e meio, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva viveu às turras com a imprensa. Foi acusado de inclinações totalitaristas ao patrocinar o projeto de criação do Conselho Nacional de Jornalismo, idéia enterrada sob uma avalanche de críticas. E ainda ameaçou expulsar do País o jornalista Larry Rohter, correspondente do conceituado The New York Times. Na quarta-feira, Lula comandará no Palácio do Planalto a solenidade de assinatura da Declaração de Chapultepec, um tratado internacional que defende a liberdade de imprensa.

A assinatura da declaração faz parte de uma estratégia de reaproximação com os jornalistas cujo objetivo é desfazer a imagem negativa consolidada ao longo de seu governo. A data do evento foi escolhida a dedo: 3 de maio é o Dia Internacional da Liberdade de Imprensa.

A ofensiva do governo incluiu dois importantes passos de bastidor. Em 2 de fevereiro, o porta-voz do Planalto, André Singer, aproveitou uma passagem por Nova York para visitar a redação do NYT, onde se avistou com o editor-executivo Bill Keller. Dois meses depois, em 6 de abril, Singer almoçou com Larry Rohter no restaurante do Clube de Golfe de Brasília.

No início de 2004, o mesmo Rohter esteve sob ameaça de ter o visto de trabalho cassado pelo governo brasileiro depois de escrever uma reportagem sobre o hábito de beber do presidente. Após muitos protestos, o Planalto recuou e desistiu da expulsão do jornalista, não sem antes Rohter se retratar afirmando que não queria ofender o presidente. O sonho do governo, agora, é conseguir que o NYT publique uma reportagem positiva sobre Lula.

Chapultepec é o nome da cidade mexicana em que foi lançada, em 1994, a declaração em defesa da liberdade de imprensa. Foi uma iniciativa da Sociedade Interamericana de Imprensa. O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso assinou a declaração em 1996, um ano e meio depois de ter assumido seu primeiro mandato. Lula assinará a sete meses do fim de seu governo.

Em seu prefácio, a declaração faz referência à intolerância dos governantes com a imprensa. O texto lembra que "políticos que declaram sua fé na democracia são seguidamente intolerantes diante das críticas públicas" e "setores sociais atribuem à imprensa culpas inexistentes, juízes mal esclarecidos exigem que os jornalistas divulguem as fontes que devem permanecer sigilosas, servidores autoritários negam aos cidadãos o acesso às informações públicas, inclusive as Constituições de alguns países democráticos contêm certas restrições à imprensa".

Singer afirma que o objetivo do Planalto com a assinatura da declaração é "colocar nos trilhos" a relação com a imprensa: "Trata-se de uma iniciativa do presidente Lula, cujo objetivo é reiterar o compromisso de seu governo com a liberdade de imprensa." O esforço para melhorar a relação com a mídia começou de forma sutil em outubro do ano passado, depois da crise do mensalão, quando Lula passou a dar entrevistas informais, o que não acontecia até então.

Durante do escândalo provocado pela violação da conta bancária do caseiro Francenildo dos Santos Costa, o presidente manteve distância de jornalistas. Mas agora passou a atender à imprensa onde quer que seja abordado.