Título: Caos ameaça administração federal
Autor: João Domingos
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/03/2006, Nacional, p. A11

Governo não previa que votação do orçamento atrasasse tanto e pode faltar dinheiro até para o cafezinho

O governo se preparou para o atraso na aprovação do Orçamento-Geral da União deste ano, reservando R$ 18 bilhões de restos a pagar do ano passado para 2006. Mas não para tanta demora.

Se o orçamento não for aprovado até o fim do mês, a administração federal corre o risco de entrar em colapso.

A previsão do Ministério do Planejamento é de que falte dinheiro até para a compra de produtos básicos, como papel higiênico e cafezinho, e que o pagamento das contas de luz, água e telefone seja suspenso.

O reajuste salarial que seria dado em janeiro para os servidores do Banco Central (BC), das agências reguladoras e do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) não pôde ser pago porque não há previsão orçamentária para o aumento.

Os servidores do BC preparam uma greve contra o atraso no reajuste. Deverão ser seguidos pelos do INSS.

Desde 2000 o Congresso não atrasava tanto a votação do orçamento.

Naquele ano, o Congresso só aprovou a lei orçamentária em maio e o então presidente Fernando Henrique Cardoso enfrentou o caos, com a falta de tudo.

O próprio Congresso entendeu que aquela lentidão na aprovação do orçamento não se justificava.

Assim, de 2001 a 2005, a votação ocorreu com regularidade e a lei com a previsão de receitas e despesas do governo federal em todas as áreas pôde ser executada sem tropeços ou sustos.

A crise política que atingiu o País desde junho, quando o então deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) denunciou a existência do mensalão, provocou uma paralisia no Congresso, que passou a se dedicar a três Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs): dos Correios, do Mensalão e dos Bingos.

Delas originaram-se 18 pedidos de cassação de mandatos de deputados, a base governista enfraqueceu e os partidos de oposição aumentaram seu poder de ataque.

PROVIDÊNCIAS

O ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, que foi presidente da Comissão de Orçamento, concluiu que não haveria possibilidade de o Congresso votar a lei orçamentária até o final do ano.

Desse modo, foram tomadas duas providências. Primeiro, a Lei de Diretrizes Orçamentárias, que tem de ser aprovada no primeiro semestre, previu a possibilidade de - em caso de não-votação do orçamento - o governo utilizar a cada mês 1/12 avos do orçamento para pagamento de custeio, como salários (mas somente o que já era previsto em 2005, e não reajustes que deveriam entrar em vigor neste ano).

Outra providência tomada pelo governo visou a garantir pelo menos uma parte dos investimentos. Afinal de contas, este é um ano eleitoral. Sem alarde, o governo preparou-se para evitar a paralisia em suas ações.

Inscreveu R$ 18 bilhões do orçamento de 2005 em restos a pagar neste ano. Desta quantia, reservou R$ 4,1 bilhões para investimentos.

Assim, pôde usar sem problemas R$ 440 milhões para fazer a operação tapa-buraco em 26 mil quilômetros de rodovias federais.

Mas, como tudo na vida, o dinheiro uma hora acabará.

Na previsão do Ministério do Planejamento, isso ocorrerá já em abril.

O primeiro repasse a ser suspenso deverá ser o destinado às obras previstas no Projeto Piloto de Investimentos (PPI), como a Ferrovia Norte-Sul, a BR-101, os metrôs de Belo Horizonte, Salvador e Recife e o Corredor Expresso de São Paulo.

Também serão afetadas as melhorias de acesso e modernização de instalações nos portos do Rio de Janeiro, Vitória, Santos, Sepetiba (RJ), São Francisco do Sul (SC) e Areia Branca (RN). Para estas obras estão previstos R$ 2,36 bilhões.