Título: Cirurgia de estômago cresce 233%
Autor: Simone Iwasso
Fonte: O Estado de São Paulo, 11/02/2006, Vida&, p. A27

Indicada para pacientes com índices altos de obesidade, as cirurgias para redução de estômago cresceram 233% nos últimos dois anos no País - um aumento que foi vertiginoso na rede privada e bem mais lento no Sistema Público de Saúde (SUS), segundos dados da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica (SBCB). Nesse período, a prática estendeu seu alcance e começou a ser cada vez mais feita em adolescentes e idosos nas clínicas particulares.

No entanto, uma portaria do Ministério da Saúde deverá facilitar o procedimento para os cerca de 8 mil brasileiros que esperam há anos pela cirurgia gratuita em 52 centros cadastrados. "Há uma demanda reprimida. Temos cerca de 1,5 milhão de obesos mórbidos. Queremos ampliar as técnicas, dobrar as cirurgias e aumentar o valor pago por elas", diz Amâncio Paulino de Carvalho, diretor do Departamento de Atenção Especializada do ministério. A nova portaria deve também reduzir a idade mínima para 16 anos ou mesmo 14, em alguns casos.

Uma portaria semelhante, editada em julho do ano passado, foi suspensa por falta de verba. Dessa vez, os R$ 30 milhões necessários para dobrar as 2.266 cirurgias feitas em 2005 pelo SUS, como espera o diretor, estão previstos no Orçamento da União, que está no Congresso. "Se tudo correr como esperamos, em março editaremos a portaria."

Com ela, o SUS cobrirá as três técnicas mais usadas hoje: "restritiva", "restritiva e desabsortiva" e "desabsortiva" (ver quadro). Poderão se candidatar pacientes com Índice de Massa Corpórea (IMC) acima de 40 (para se chegar ao índice, deve-se dividir o peso, em quilos, pela altura, em metros, ao quadrado). Quem tiver IMC entre 35 e 40, e sofrer de doenças como diabetes e hipertensão, que são agravadas pela obesidade, também poderá entrar na fila.

ADOLESCENTES

"Tentei todas as dietas, ginásticas, remédios e sempre fui obesa. Tinha épocas que não queria ir à escola, não colocava biquíni e não queria sair. Por isso disse para minha mãe que queria operar", conta Laís, de 16 anos, que fez a cirurgia com 14. Com 1,75 metro, ela passou de 113 para 75 quilos. "Na sala de espera, todos ficavam surpresos porque eu era muito nova. Mas agora eu tenho amigos, namorado, comecei a viver de um jeito diferente", conta. Apenas a família sabe da operação.

Experiências como a de Laís poderão se tornar mais freqüentes. "Trabalhamos com o ministério e levamos em conta a idade biológica do paciente e não somente a cronológica, tendo como base a resolução do Conselho Federal de Medicina para as cirurgias. Isso quer dizer que para um adolescente ou para um idoso a cirurgia pode ser muito importante e útil. Vai depender do estado de saúde dele", diz o médico Luiz Vicente Berti, do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo (USP) e vice-presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica.

A mudança significa que poderão fazer a redução de estômago na rede pública - desde que amparados por uma equipe multidisciplinar - adolescentes a partir dos 16 anos; em casos excepcionais, de 14 anos. Até então, o acesso estava limitado a pessoas de 18 a 60 anos.

Com 127 quilos e 1,73 metro, o estudante Tiago Fernandes Martins, de 17 anos, também recorreu à cirurgia após passar por uma bateria de exames e especialistas. "Atrapalhava minha vida. Até para arrumar trabalho era mais difícil", conta, cerca de 25 dias após passar pela sala de operação e com 12 quilos a menos.

CUIDADOS

Resultados como de Lais e Tiago animam os obesos, mas exigem cautela. A cirurgia traz muitos benefícios, mas não faz milagre. "Temos 0,5% de taxa de mortalidade, índice aceito mundialmente. E algumas pessoas apresentam problemas que precisam ser corrigidos depois. Mas, no geral, quando bem indicada, para casos que precisam, as cirurgias auxiliam a perda e manutenção do peso", diz João Batista Marchesini, da Universidade Federal do Paraná e presidente da SBCB. Ele alerta para técnicas apresentadas em programas de televisão, que perderiam mais peso e mais rapidamente. "Isso não existe e não é aceito pela comunidade médica. A cirurgia não pode ser banalizada."

Lais entendeu a mensagem. "Emagreci, mas depois engordei um pouquinho. Vi que precisava ajudar a cirurgia a dar mais resultado no meu corpo, mudando minha alimentação e me cuidando mais."