Título: Azaléia vai fabricar na China e deixa de ser 100% brasileira
Autor: Fernando Scheller
Fonte: O Estado de São Paulo, 06/03/2006, Economia & Negócios, p. B5

Após fechar uma fábrica no Rio Grande do Sul, no ano passado, cortando centenas de postos de trabalho, a fabricante de calçados femininos Azaléia vai terceirizar parte da produção de sua nova coleção com um parceiro chinês. Serão cerca de 30 modelos a serem produzidos na China, segundo informou ao Estado Paulo Ricardo Wolff, do departamento de exportações da empresa. Presente à feira GDS, o executivo afirmou que transferir a produção para a China é a única forma de combater o aumento de custos causado pela queda do dólar no Brasil.

"Deixamos oficialmente de ser uma empresa 100% brasileira. Todos esses calçados aqui não serão mais made in Brazil", explicou Wolff, referindo-se às cerca de 30 amostras do estande da Azaléia na GDS, principal feira do setor de sapatos na Alemanha. Os calçados serão fabricadas em território chinês a partir dos próximos meses. "Precisamos do dólar a R$ 2,90, pelo menos."

De acordo com o executivo, apesar de a Azaléia já possuir alguns contratos de produção fora do Brasil, essa tendência deve ser agora acentuada. "Desde que o dólar começou a cair, há quase dois anos, estamos subsidiando parte das vendas externas para manter as posições de mercado." Ele afirma, porém, que "segurar o rojão" do real valorizado é quase impossível. "Nossas vendas no mercado externo caíram. Já representaram 25% do faturamento. Hoje, estão em 20%. Estamos numa curva descendente".

FUGA E ESPERANÇA

O diretor-executivo da Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados), Heitor Klein, afirmou que o movimento de fuga de empresas brasileiras não se resume à Azaléia - e a China também não é o único destino das empresas que procuram cortar custos. "A Dumont-Paquetá já anunciou que vai transferir parte de sua produção para a Argentina. E eu tenho notícia de mais duas empresas que devem seguir o mesmo caminho", disse Klein, sem citar nomes.

Entretanto, há quem afirme que a etiqueta made in Brazil ainda faz toda a diferença. Neste grupo estão companhias como a Bical, a Sapato Terapia e a Samello. "Trabalhamos com produtos de alta qualidade. Nossos sapatos já são conhecidos e são feitos no Brasil, não concorremos com os sapatos feitos na China, mas com os produzidos na Europa", diz Maurício Avila, gerente de vendas internacionais da Samello. Segundo Marcelo Machado, da Bical, a estratégia de fabricar na China pode ter um efeito negativo: a perda da credibilidade com clientes internacionais.

NEVE

Além da crise do setor, o mau tempo na Alemanha também atrapalhou a participação brasileira na GDS. No primeiro dia da feira, estandes de pelo menos cinco empresas nacionais - Itapuã, Bottero, Dilly (Try On), Beira-Rio e Kiuty - estavam vazios, praticamente impossibilitando a realização de negócios. "E não há prazo para a entrega da bagagem", informou Charles Weber, gerente da Bottero.

Na sexta-feira, Frankfurt teve a maior tempestade de neve dos últimos 30 anos, o que causou o fechamento do aeroporto internacional por um dia inteiro e o cancelamento de cerca de 500 vôos, causando confusão no setor de bagagens. Além das empresas que ficaram sem amostras, muitos dos participantes brasileiros - entre eles, o diretor-executivo da Abicalçados, Heitor Klein - ficaram só com a roupa do corpo.