Título: Grileiros ocupam delta no Piauí e briga vai à Justiça
Autor: Luciano Coelho
Fonte: O Estado de São Paulo, 02/01/2006, Nacional, p. A6

O maior cartão-postal do Piauí, o Delta do Parnaíba, é alvo da ação de grileiros. Especuladores e grandes proprietários da região estão se apoderando de ilhas que pertencem à União para explorar a criação de gado e extração de caranguejo-uçá, segundo denúncias de autoridades fundiárias. E a questão já está na Justiça, em Parnaíba. A situação provoca conflito com antigos moradores da área, que estão sendo expulsos das ilhas, enquanto as superintendências do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra)do Piauí e Maranhão tentam estimular as famílias a permanecer na terra. O Banco do Nordeste abriu crédito para as famílias que vivem da extração de caranguejo, agricultura familiar e pesca artesanal. Também está preparado o assentamento de 1.195 famílias na Ilha das Canárias, em Araiozes, no lado maranhense

No total, a disputa envolve uma área de cerca de 500 mil hectares, parte deles já na região do cerrado piauiense, envolvendo três municípios: Morro Cabeça no Tempo, Júlio Borges e Avelino Lopes. As principais ilhas do Delta do Parnaíba servem de pasto para gado.

Por meio da Federação dos Trabalhadores em Agricultura (Fetag), alguns dos moradores expulsos conseguiram, na Justiça, a manutenção temporária da posse das áreas onde estão. Podem ficar na área, mas seu direito deve ser cassado no decorrer deste ano, quando expira o prazo judicial.

"Os trabalhadores que plantam em pequenas áreas estão sendo vítima da perseguição dos latifundiários, que permitem que o gado entre nas plantações para pastar", disse Antônio Soares, diretor de políticas agrárias da Fetag.

Há três tipos de ilhas na região do Delta. Algumas são particulares, com título de posse definitivo. É o caso da ilha da família Clark, que usa a área para turismo e preservação ambiental. Outras ilhas estão sendo disputadas na Justiça e as demais são áreas de reserva ecológica - não podem ser usadas para grandes projetos de cultivo, mas se permite que pequenos agricultores explorem a área, desde que respeitem princípios de preservação ambiental.

ESPECULAÇÃO

Na avaliação do presidente do Instituto de Terras do Piauí (Interpi), Francisco Guedes, a especulação com terras nas regiões do Cerrado e do Delta do Parnaíba está acentuada. Ele conta que no Cerrado a terra é comprada a R$ 12 o hectare e vendida a empresários por mais de R$ 120 - o que corresponde a uma variação de 900%.

O Interpi vem tentando rastrear as irregularidades nessas operações. "Tem o caso da irmã de um padre que compra as posses por um preço bem barato e revende para empresários. O pior é que estão repassando terras da agricultura familiar para a especulação", diz Guedes. Segundo ele, já foram adotadas medidas para coibir os abusos. Os pequenos agricultores dos três municípios afetados, ressalta ele, estão sendo cadastrados e só em Morro Cabeça no Tempo foram listadas cerca de 200 famílias. Também vem sendo providenciado o levantamento cartográfico, topográfico e jurídico das terras.

O presidente do Interpi é incisivo quando se refere aos negócios com terras sob suspeita de irregularidades: "Quem compra terra grilada está cometendo uma irregularidade. É como comprar um carro roubado. Quando a situação for regularizada, pode perder a terra e o dinheiro que investiu, além de responder perante a Justiça. Nós estamos atentos e vamos tomar as providências necessárias. Ninguém pode dizer que comprou estas terras de boa-fé. Foi de má-fé."