Título: Com os olhos voltados para a Síria
Autor:
Fonte: Jornal do Brasil, 15/02/2005, Internacional, p. A7

Se há incertezas sobre o real motivo do ataque perpetrado ontem, em Beirute, que matou o ex-primeiro-ministro libanês Rafik Hariri, não há dúvidas de que a culpa recairá sobre a Síria. Sobre isso, nem mesmo a declaração do grupo Vitória e Jihad, que assumiu o atentado, faz muita diferença.

- Por todos os ângulos, os efeitos do ataque serão sentidos em Damasco - afirma Michael Young, analista da política libanesa, no jornal The Christian Science Monitor. - Ninguém vai procurar culpados em outro lugar.

De fato, Hariri era considerado um membro poderoso da crescente oposição à presença dos 16 mil soldados sírios no Líbano, já condenados, em setembro de 2004, por um resolução das Nações Unidas, aprovada sob pressão dos Estados Unidos e da França. Segundo analistas, a morte do ex-primeiro-ministro, que era amigo do presidente francês, Jacques Chirac, vai impulsionar os argumentos da oposição, um grupo rival ao presidente Emil Lahoud, amigo de Damasco. Tudo isso, às vésperas de eleições parlamentares no Líbano, marcadas para maio.

- Se o pleito fosse hoje, os candidatos de Hariri venceriam com folga - afirma Farid Khazen, da Universidade Americana em Beirute. - O ataque vai reforçar e consolidar a oposição, acrescenta. Khazen também se preocupa com a intensificação da violência no país, já castigado por 15 anos (1976-1991) de conflitos envolvendo palestinos, sírios e israelenses.

- Hariri era o mais conhecido e influente político libanês. Um ataque deste tipo mostra o quão longe alguém pode ir hoje no Líbano para defender objetivos políticos - afirma.

Em outubro, Marwan Hamade, outro político contrário à ocupação síria, escapou por pouco de uma bomba colocada em uma rua de Beirute.

Os sírios afirmam que foram convidados pelo governo libanês para entrar e pacificar o país em meados dos anos 1970. Damasco diz que a presença das tropas no Líbano garante a segurança do país e que o enfraquecimento dos laços entre Damasco e Beirute é um convite à instabilidade na região.

Outra conseqüência certa, dizem os analistas, é o aumento da pressão dos EUA sobre Damasco, a quem Washington acusa de abrigar dirigentes e membros da insurgência iraquiana, inclusive parentes do ex-ditador Saddam Hussein. Tema de discursos recentes do presidente Geroge Bush, os EUA dizem que os sírios devem parar também de apoiar grupos radicais palestinos como o Hisbolá, que ataca Israel do Sul do Líbano. No departamento de Estado, a Síria é listada como um país ''que apóia o terrorismo''.