Valor Econômico, v. 20, n. 4963, 19/03/2020. Brasil, p. A8

Governo reforça socorro com renda extra e mais crédito

Fabio Graner
Edna Simão
Lu Aiko Otta
Mariana Ribeiro
Fabio Murakawa
Matheus Schuch


No dia em que formalizou o pedido para decretação de estado de calamidade pública, o governo anunciou uma nova rodada de medidas para combater os efeitos econômicos do coronavírus. Entre as iniciativas, o pagamento de R$ 200 para pessoas que estão na informalidade, por três meses, o reforço de linhas de crédito do Banco do Brasil, a flexibilização temporária das leis trabalhistas, o parcelamento de dívidas tributárias e o socorro ao setor aéreo.

As iniciativas foram informadas em entrevista coletiva com a presença do presidente Jair Bolsonaro e seus principais ministros, como Paulo Guedes

(Economia), Henrique Mandetta (Saúde), Tarcísio Freitas (Infraestrutura). Todos usaram máscaras, mas para falar muitas vezes as tiraram. Bolsonaro disse que as medidas emergenciais têm como objetivo mitigar os efeitos da crise do coronavírus. “A intenção do estado de calamidade pública é garantir saúde e empregos. ”

Ele listou algumas medidas que já haviam sido anunciadas dois dias antes. E, entre as novidades, o presidente ressaltou que o Banco do Brasil terá R$ 24 bilhões para linha de crédito pessoal e outros R$ 48 bilhões de crédito para empresas, e o socorro ao setor aéreo.

Paulo Guedes falou na sequência e informou que o governo decidiu transferir R$ 200 para trabalhadores informais durante três meses, medida que terá um custo fiscal de R$ 15 bilhões (R$ 5 bilhões ao mês). O texto da legislação ainda está sendo construído pelos técnicos da área econômica. Segundo o secretário especial de Previdência e Trabalho, Bruno Bianco, a medida deve atingir até 20 milhões de pessoas, sendo que a maior parte já estaria no cadastro único de programas sociais, que será a referência para o dinheiro. O governo ainda estuda como fará com as demais pessoas que não têm emprego formal e também não estão integradas ao cadastro.

No Planalto, Guedes detalhou os motivos pelo qual o governo optou pelo caminho de decretar calamidade pública. Segundo ele, o cenário apurado pela área técnica era que o governo teria de contingenciar (bloquear) R$ 37 bilhões em recursos orçamentários em 2020 para cumprir a meta fiscal. O motivo é a perda de arrecadação pelo impacto da crise, além de outros problemas como a necessidade de retirar das contas R$ 16 bilhões que viriam com a privatização da Eletrobras.

O ministro admitiu que isso seria muito complicado em momento em que a economia brasileira precisa de “esforço contracíclico”, expressão pouco usual para um orgulhoso liberal. “Teríamos de agudizar a crise”, reconheceu Guedes. "Estão suspensas as metas de resultado primário deste ano", disse.

Sem essa restrição, o governo poderá fazer mais medidas para proteção social e também para o reforço na área da Saúde. Também estão no radar medidas de auxílio financeiro para Estados e municípios, principalmente para reforçar o atendimento na saúde.

O secretário especial adjunto de Fazenda, Jefferson Bittencourt, explicou que a medida não elimina as demais regras fiscais (teto de gastos e “regra de ouro”), mas ajuda o governo a ter capacidade de ação em um momento de alta instabilidade e incerteza nas projeções.

Até agora, as medidas do governo somam R$ 170 bilhões, mas o impacto fiscal disso é bem menor. A maior parte das iniciativas ou será revertida neste ano, como os adiamentos de impostos e antecipação de benefícios, ou é fora do Orçamento, como as do FGTS.

Sobre o reforço de renda aos informais, Guedes destacou que os valores serão pagos na Caixa e no INSS, buscando ao máximo mecanismos virtuais. Bruno Bianco explicou que a ideia é depositar o dinheiro nas contas dos beneficiários que já estão no cadastro único e têm conta bancária.

Guedes disse que medidas não param por aí. “A cada 48 horas, vamos nos reunir e, à medida que for necessário, vamos aprofundando respostas. ”. Outra iniciativa informada pelo ministro é que o governo deve bancar parte dos salários pagos por micro e pequenas empresas. Essa ideia está sendo discutida junto com mecanismos de suspensão do contrato de trabalho, que o governo prepara nas medidas trabalhistas.

Na entrevista, o presidente da República disse que não pretende deixar as empresas do setor aéreo quebrarem porque isso seria muito pior. “Quebra das empresas não interessa. Custo seria maior”, destacou. Tarcísio Freitas anunciou depois medidas como o adiamento de outorgas dos aeroportos, que estava em estudo, conforme antecipou o Valor.

Dentro da linha de passar um símbolo de esforço conjunto contra a crise, outros ministros falaram. Rogério Marinho, do Desenvolvimento Regional, disse que sua pasta poderá colocar unidades não ocupadas do Minha Casa, Minha Vida à disposição do Ministério da Saúde se houver necessidade de espaços para quarentena fora dos hospitais. Também serão analisados alguns fundos para auxiliar regiões mais fragilizadas, como Norte e Nordeste.