Correio Braziliense, n. 21761, 15/10/2022. Política, p. 3

TSE apura ligação de Dantas com juiz

Luana Patriolino


O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decidiu abrir um procedimento administrativo para apurar a suposta relação entre o juiz Maurício Cesar Breda Filho, do Tribunal Regional Eleitoral de Alagoas (TRE-AL), com o governador-tampão Paulo Dantas (MDB), afastado do cargo por determinação do Superior Tribunal de Justiça. O gestor é investigado na Operação Edema, da Polícia Federal, por suposta prática de rachadinha. 

A apuração foi determinada pelo ministro Benedito Gonçalves, atendendo a um pedido do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que apoia Rodrigo Cunha (União Brasil), adversário de Dantas na disputa pelo governo do estado. 

“Ao identificar elementos que subsidiam o processamento da reclamação disciplinar, não antecipo qualquer conclusão de mérito sobre o cometimento de falta funcional ou mesmo sobre a adequação da medida cautelar requerida. Ante o exposto, recebo a reclamação disciplinar e determino que seja a autoridade reclamada intimada para, no prazo de três dias, prestar informações sobre o teor da reclamação”, escreveu Benedito Gonçalves.

Lira alega que o juiz teria agido para favorecer Dantas e o senador eleito Renan Filho (MDB-AL). Ambos são apoiados pelo senador Renan Calheiros (MDB-AL), desafeto do presidente da Câmara.

O deputado sustenta que Breda Filho foi nomeado presidente do Conselho Estadual de Segurança Pública de Alagoas (Conseg-AL) por Dantas e, apesar de licenciado do cargo, tem “inequívoca vinculação próxima” ao governador. Também argumenta que o juiz tomou decisões “mais benéficas” à coligação que apoia a reeleição de Dantas do que à coligação integrada pelo PP, que apoia Cunha.

Na decisão, Benedito Gonçalves ressaltou que o juiz não teria cumprido “estritamente” a ordem cronológica no exame de medidas liminares. “Deve-se destacar que a amostra de processos é pequena e foi selecionada por Arthur Lira, sendo possível cogitar que não represente todo o cenário”, frisou. “Além disso, a observância de ordem cronológica é preferencial, e não impositiva, sendo que diversos fatores, inclusive a análise prévia quanto à prioridade de medidas urgentes a serem concedidas e a similaridade a outras matérias já apreciadas podem influir na ordem de prolação de decisões liminares. Ainda assim, é pertinente examinar o contexto maior em que se inserem as decisões destacadas na reclamação.”

Dantas assumiu o governo alagoano em maio deste ano porque o então gestor, Renan Filho, se afastou para concorrer ao Senado. Ele é apoiado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que criticou a operação da Polícia Federal de que o gestor foi alvo e o afastamento dele do cargo (leia Entenda o caso). 

 

Solidariedade

Os delegados de Polícia Civil de Alagoas saíram em defesa de Gustavo Xavier do Nascimento, delegado-geral da corporação citado no inquérito da Operação Edema. Em razão de relato da delegada Mariana Cavalcante, sobre uma ligação recebida de Nascimento, a Polícia Federal alegou “interferência” de Nascimento na apuração, o que foi visto pela ministra Laurita Vaz, relatora do inquérito no STJ, como “atrevimento”.

Em defesa do colega, os delegados da Polícia Civil do estado disseram ver “evidente tentativa de criminalizar o diálogo institucional” com base nas declarações da delegada da PF. Segundo eles, foi apresentada “versão falaciosa” a respeita da conversa travada entre Nascimento e a delegada, com o “objetivo de atender seus próprios fins, configurando uma afronta à verdade e à Polícia Civil de Alagoas”.

O relato de Mariana Cavalcante, remetido ao STJ, trata de uma ligação de Nascimento, feita para ela em 19 de agosto. Nas palavras da ministra Laurita Vaz, o delegado da Polícia Civil teria “forçado uma nova oitiva” de um dos supostos operadores das rachadinhas, José Everton, que “confessou” participação no suposto esquema após ser flagrado saindo da Caixa Econômica Federal com R$ 32 mil e diversos cartões de “fantasmas” da Assembleia Legislativa do estado.

Segundo a delegada da PF, Nascimento teria lhe dito que um “advogado” estava acompanhado de pessoa que queria prestar “depoimento complementar”, no caso José Everton. Ele então teria pedido que a PF fosse até sua sala para proceder a nova oitiva, possibilidade negada pela delegada, que “esclareceu que não seria esse o procedimento”.

Os delegados da Polícia Civil em Alagoas sustentam que, “ao contrário do que se quis demonstrar”, Nascimento “cumpriu com seus deveres funcionais quando foi procurado pelo investigado José Everton e seu advogado para prestar depoimento na sede Polícia Civil”. (Com Agência Estado)

 

Entenda o caso

O governador afastado de Alagoas, Paulo Dantas, é suspeito de operar esquema de contratação de funcionários fantasmas na Assembleia Legislativa do estado para desvio de salários. Na terça-feira, a ministra Laurita Vaz, do STJ, ordenou o afastamento de Dantas do cargo — confirmado, na quinta-feira, pela Corte Especial do tribunal. O gestor nega irregularidades e diz que o inquérito tem motivação política para atingir sua candidatura. Ele foi o mais votado no primeiro turno e segue líder nas pesquisas.

 

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