O Globo, n. 32609, 17/11/2022. Política, p. 4

Frente ampla, porém petista

Paula Ferreira
Alice Cravo
Jeniffer Gularte
Eduardo Gonçalves
Geralda Doca


Eleito com uma ampla aliança de partidos de centro e de esquerda, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) montou uma equipe de transição para seu governo com integrantes de 16 legendas diferentes. Dos 290 nomes anunciados até ontem, o GLOBO identificou que ao menos 130 têm filiação partidária. A prevalência é de petistas, que representam mais da metade —são 66 ao todo.

Além da participação de siglas que fizeram parte da coligação de Lula na campanha eleitoral, o time da transição incorporou indicados por partidos que devem fazer parte da base aliada do novo governo, como MDB e PSD, cada um com pelo menos sete integrantes escalados para trabalhar na equipe.

Ainda que Lula diga que participar desse processo não significa assumir cargos no futuro governo, a ocupação das cadeiras na transição dá pistas sobre a composição de forças e a preferência de cada uma das siglas para eventual atuação na Esplanada dos Ministérios.

O vice-presidente eleito e coordenador-geral da equipe, Geraldo Alckmin, afirmou ontem que o futuro governo deverá ter um número de ministérios semelhante ao de núcleos temáticos em funcionamento durante a transição: 31. Atualmente, a gestão de Jair Bolsonaro mantém 23 pastas no Executivo federal.

— Não é obrigatório cada grupo técnico ter um ministério correspondente, mas eles são muito próximos. Não é exatamente igual, mas são próximos. São as áreas de maior preocupação e maior empenho em políticas públicas —afirmou.

PSB contemplado

O PSB, partido de Alckmin, por exemplo, é o segundo com a maior participação no grupo da transição, com 13 nomes. A sigla ganhou assentos no núcleo temático de Ciência, Tecnologia e Inovação, entre os quais o do vice-presidente da Fundação João Mangabeira (FJM), Alexandre Navarro. A legenda também possui representantes nos grupos de Turismo e Cidades.

Na equipe que vai discutir políticas públicas voltadas aos indígenas, que devem ser incorporadas ao futuro Ministério dos Povos Originários, o PSOL é quem tem mais representantes, com dois nomes: as deputadas eleitas Sônia Guajajara (SP) e Célia Xakriabá (MG). A legenda é a terceira com a maior quantidade de filiados na transição, com nove.

Ao GLOBO, o presidente do PSOL, Juliano Medeiros, afirmou estar satisfeito com a participação do partido na equipe, mas que ainda deve sugerir mais uma “dezena” de nomes para a transição.

— Por ora as nossas indicações foram atendidas — disse Medeiros, que faz parte do conselho político do governo de transição.

O PT, por sua vez, é maioria nos núcleos de Educação e Saúde, que reúnem cinco ex-ministros de gestões petistas, mas também coordena as áreas de Economia, Relações Exteriores e Cidades. Na semana passada, integrantes da legenda chegaram a demonstrar insatisfação nos bastidores com a perspectiva de ficarem sem espaço diante da necessidade de Lula em acomodar os demais aliados. Com representação em pelo menos 29 dos 31 grupos da transição, porém, a avaliação interna é de que foi possível equilibrar a pressão dos demais partidos.

Mesmo filiados a legendas, alguns nomes são considerados como “cota pessoal” de Lula. É o caso do ex-governador do Maranhão e senador eleito Flávio Dino (PSB), um dos poucos que já ouviram do próprio presidente que terá espaço na Esplanada. Ele integra o grupo de Justiça e Segurança Pública e é hoje o favorito para assumir a pasta a partir de janeiro.

Outro exemplo é a participação da senadora Simone Tebet (MDB-MS), coordenadora do grupo de assistência social. O partido, que durante a campanha optou por liberar seus filiados, tem representantes ainda nos núcleos de desenvolvimento regional, turismo, juventude e no de indústria, comércio e serviços, que deve voltar a ser um ministério na gestão de Lula.

A participação na campanha também foi considerada como decisiva para a inclusão do deputado André Janones (Avante-MG) no grupo. Ele teve o nome anunciado ontem para a equipe de comunicação. Além do parlamentar, a sigla conta com Guilherme Ítalo no conselho político.

A montagem da equipe de transição ainda tem servido para Lula fazer acenos em busca de novas alianças. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), por exemplo, tem um nome de sua confiança na transição: o senador Alexandre Silveira (PSD-MG), que faz parte do grupo de Infraestrutura.

O processo de transição também trouxe de volta à cena personagens que já ocuparam cargos importantes durante os dois primeiros governos de Lula e na gestão de Dilma Rousseff (PT)

A lista de novos integrantes do núcleo de relações exteriores tem dois ex-chanceleres: Celso Amorim, que ocupou o posto ao longo da gestão Lula, e o tucano Aloysio Nunes Ferreira, titular do Itamaraty durante o governo de Michel Temer. Nunes Ferreira foi um dos primeiros quadros do PSDB a indicar apoio a Lula. Esse grupo conta ainda com Cristovam Buarque (Cidadania), ministro da Educação sob comando do petista, entre 2003 e 2004.

Defesa à espera

Desde que foi eleito para o terceiro mandato, Lula tem reafirmado que o meio ambiente estará na sua prateleira de prioridades. Três ex-comandantes da pasta foram incorporados à equipe. São eles Marina Silva (Rede), uma das favoritas para voltar ao cargo, e Carlos Minc (PSB), ambos ex-ministros de Lula, e Izabella Texeira, que ocupou a cadeira por escolha de Dilma.

Outro membro do primeiro escalão da época de Dilma, o ex-ministro da Ciência e Tecnologia Celso Pansera passará a integrar o núcleo da transição voltado à área que ele comandou. O grupo responsável pelo desenvolvimento regional contará com o governador do Pará, Helder Barbalho (MDB), que foi ministro da Integração Nacional de Temer, assim como da secretaria nacional de Portos e de Pesca e Agricultura de Dilma.

Miguel Rosseto, anunciado ontem como novo integrante da transição no núcleo de desenvolvimento regional, já foi chefe da pasta de Desenvolvimento Agrário quando Lula era presidente e ministro do Trabalho de Dilma.

Em meio à profusão de nomes já anunciados por Alckmin, o núcleo relacionado à Defesa ainda aguarda as indicações. Em função da relação do presidente Jair Bolsonaro com militares e desgastes ocorridos no passado, especialmente no governo Dilma, a área é considerada sensível, o que tem alongado a indefinição.