Valor Econômico, v. 20, n. 4889, 28/11/2019. Brasil, p. A12

Estados seguem com oferta de incentivo fiscal
Marta Watanabe 


Paralelamente ao apoio a uma reforma tributária que deve eliminar os atuais tributos sobre consumo, os governos estaduais prosseguem com a oferta de incentivos fiscais do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). Distrito Federal, Alagoas, Sergipe, Rio Grande do Norte e São Paulo estão entre os Estados que já estabeleceram incentivos sob a vigência da Lei Complementar (LC) 160, de 2017, que regularizou incentivos ilegais anteriores. Os alvos de incentivos são diversos. Eles vão desde a soja em grão, passando por açúcar e álcool e chegando até os incentivos a atacadistas e à implantação de indústrias. A ideia dos benefícios continua a mesma: a de atrair empresas ou garantir a competitividade de quem já produz localmente.

Ao mesmo tempo que convalidou incentivos irregulares e estabeleceu prazo de validade de até 15 anos para eles, a LC 160 permitiu o que os Estados passaram a chamar de “cola”. Ou seja, um Estado pode copiar o benefício oferecido por outro ente, desde que seja da mesma região. Isso poderá ser feito no decorrer de até 15 anos de validade dos incentivos.

No Distrito Federal, a ideia, segundo o secretário de Economia, André Clemente, é diversificar a economia da região. O governo local quer atrair indústrias diversas, principalmente de alto valor agregado, como da área de tecnologia e farmacêutica. Para isso, implantou o Emprega DF, programa dirigido tanto à produção industrial como ao comércio atacadista. O programa inclui, entre outros, crédito presumido de até 67% do ICMS sobre produtos fabricados no Distrito Federal.

No Centro-Oeste, Goiás, lembra o secretário, é reconhecido pelo grande volume de incentivos que oferece desde governos anteriores. O próprio Estado calcula em cerca de 50% da arrecadação do ICMS a renúncia com imposto, em razão de benefícios fiscais. O governo do Distrito Federal, porém, resolveu copiar os incentivos de outro vizinho. “Fizemos a ‘cola’ dos benefícios de Mato Grosso do Sul, que são mais agressivos”, diz Clemente.

Na região Nordeste, diz George Santoro, secretário de Fazenda de Alagoas, a cola de incentivos tem sido feita de forma tranquila. Não há, segundo ele, uma disputa acirrada de redução de alíquotas, que caracterizava mais a chamada “guerra fiscal”. O colado tem ficado ciente da cola pelo próprio colador, afirma Santoro.

Foi dessa forma, conta ele, que o governo alagoano copiou o incentivo que Pernambuco dá para o setor sucroalcooleiro. O secretário explica que a tradicional produção de açúcar do Estado sempre foi voltada à exportação. Agora, porém, com a demanda menor do mercado externo, o açúcar passou a ser vendido dentro do próprio Estado. A questão é que a alíquota de ICMS, de 18%, era alta demais. Foi por isso que o Estado colou o incentivo pernambucano para cobrar imposto de 6%, como resultado de um crédito presumido.

Mais recentemente, diz Santoro, Alagoas também copiou, junto com o governo sergipano, o incentivo dado pelo Maranhão para a soja e o milho. No caso de Alagoas, o diferimento de ICMS reduz o imposto de 18% para 2% para o produtor, incentivando a produção de grãos. O Estado, diz o secretário, não tinha incentivo para a soja porque a importância tem crescimento mais recente. Segundo dados do governo alagoano, o cultivo de grãos foi retomado com mais força no Estado em 2015 e a área plantada tem se expandido em cerca de 30% ao ano.

Tanto no caso do açúcar como da soja não há renúncia fiscal, destaca. “Porque não tínhamos a venda doméstica do açúcar produzido no Estado e nem a comercialização dos grãos. São todas arrecadações adicionais”, diz ele. O secretário destaca também que, diferentemente do que se fazia na chamada guerra fiscal, os incentivos que os Estados têm oferecido hoje com base na regra da cola são legais e não deixam os contribuintes na insegurança jurídica.

Além de colar, Alagoas também foi copiado, segundo Santoro. O Rio Grande do Norte, afirma ele, colou benefício alagoano que, por meio de crédito presumido, reduz para até 1,5% o ICMS para os centros de distribuição.

Embora mais pontuais e dentro da legalidade, alguns benefícios fiscais atuais também suscitam disputas mais acirradas. O querosene de aviação (QAV), por exemplo, foi alvo de recente disputa de alíquotas de ICMS neste ano. O estopim se deu quando o Estado de São Paulo anunciou em fevereiro a redução de 25% para 12% do ICMS sobre o querosene de aviação.

A redução poderia ser estabelecida pela cola da alíquota sobre QAV do Rio de Janeiro. Ao mesmo tempo em que enviou à Assembleia Legislativa projeto de lei nesse sentido, o governo paulista também solicitou adesão a um convênio do Confaz que já garantia anteriormente alíquotas reduzidas sobre QAV em outros Estados. Após discussão acalorada no conselho, os Estados chegaram a um acordo, estabelecendo-se pisos mínimos do ICMS sobre QAV, conforme a região ou Estado.

No início deste ano São Paulo era o único Estado que cobrava 25% de ICMS sobre o produto, a maior alíquota do país sobre QAV. Mesmo assim, a iniciativa de reduzir o imposto causou reações imediatas. À época, Santoro, de Alagoas, explicou que o movimento de São Paulo provocou uma corrida pela redução de alíquota sobre QAV entre os Estados. Isso porque, segundo ele, em razão do tamanho de sua economia, uma iniciativa do governo paulista nesse sentido traz grande impacto na organização da malha das companhias aéreas, em detrimento dos Estados menores. Com a redução do ICMS sobre QAV de São Paulo, os demais Estados também passaram a cobrar alíquotas mais baixas sobre o combustível. Alagoas, por exemplo, que no início do ano já cobrava 12%, reduziu a alíquota. A alíquota sobre QAV no Estado chega atualmente a 5%.

Antes da iniciativa do QAV, São Paulo também ofereceu no início deste ano ao setor naval isenção de ICMS na construção de corvetas, benefício também colado do Rio de Janeiro. Na época o incentivo foi estabelecido para dar maior competitividade a um consórcio integrado por estaleiro paulista em uma licitação da Marinha. A isenção paulista suscitou reações do governo pernambucano, que chegou a questionar o benefício em reunião do Confaz. A licitação foi vencida por consórcio catarinense.