Valor Econômico, v. 20, n. 4872, 02/11/2019. Brasil, p. A6

Restrição de aval do Tesouro deve deixar crédito mais caro

Edna Simão
Lu Aiko Otta


Com a proposta de suspender a concessão de aval da União para operações de crédito de Estados e municípios, exceto as realizadas por organismos internacionais, a equipe econômica quer impedir que governos estaduais e municipais com elevado gasto com pessoal continuem tendo acesso à garantia do Tesouro por terem selo de bom pagador (ratings A e B). A medida vai integrar o pacote Mais Brasil, previsto para ser anunciado amanhã.

De acordo com dados do Tesouro, há Estados, por exemplo, que desrespeitam o limite de gasto com pessoal em relação à Receita Corrente Líquida (RCL) previsto na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), demonstrando dificuldades para pagamento de suas faturas, mas continuam tendo acesso ao crédito com aval do Tesouro por que têm um rating elevado. “Como fortaleceremos a federação, inclusive com descentralização de recursos, os entes precisam ter mais independência e responsabilidade na gestão das suas finanças”, explicou um interlocutor do governo.

Pela LRF, o limite de comprometimento de RCL com gasto de pessoal é de 60%, porém, se atingido 95% desse percentual (ou o equivalente a 57% da RCL), algumas vedações são acionadas: concessão de vantagem, aumento, reajuste ou adequação de remuneração a qualquer título; criação de cargo, emprego ou função; e e alteração de estrutura de carreira que implique aumento de despesa. Como não há restrição à concessão de crédito com aval, o risco de calote acaba se tornando mais alto para o Tesouro. Só neste ano o governo precisou honrar R$ 5,7 bilhões de dívidas não pagas por Estados e municípios.

Acre, Alagoas, Pará, Pernambuco e Piauí poderiam ter acesso ao crédito com aval do Tesouro por terem notas A e B, apesar de o gasto com pessoal desses entes ultrapassarem a marca de 57%, mostram dados do Tesouro. A restrição do governo prejudica, no entanto, quatro Estados - São Paulo, Amazonas, Ceará e Espírito Santos - que estão abaixo do limite de gasto com pessoal permitido pela LRF e têm rating A e B.

Durante as discussões na equipe econômica, houve debate para que as restrição fosse temporária, com duração de dois anos. Com isso, os Estados que aceitassem cumprir uma série de critérios de ajuste fiscal poderiam voltar a ter acesso ao crédito. Um interlocutor do governo disse,  no entanto, que deve prevalecer a ideia de limitar o aval do Tesouro apenas às operações com organismos internacionais.

Segundo fontes ouvidas pelo Valor, a decisão vai restringir ainda mais o acesso de Estados e municípios ao crédito e encarecer seus custos. Isso porque, os bancos - principalmente Caixa Econômica Federal e Banco do Brasil - vão ajustar a taxa de juros ao aumento do risco das transações, dado que os Estados têm comprometido uma parcela cada vez maior de sua receita com salários e aposentadorias.

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Nos últimos anos, a equipe econômica já tem restringido a concessão de aval do Tesouro Nacional para Estados e municípios. Neste ano, por exemplo, o limite de crédito para o setor público em operação de crédito interno com garantia da União é de R$ 13,5 bilhões, sendo que foi consumido apenas R$ 1,694 bilhão até 30 de outubro, ou seja, apenas 12,6%.