O Estado de São Paulo, n. 46696, 23/08/2021. Política p.A6

 

Criptografia da urna eletrônica será feita pela Abin

 

Weslley Galzo

A Agência Brasileira de Inteligência (Abin) renovou um contrato milionário com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para garantir a segurança das urnas eletrônicas. O acordo de cooperação mútua entre o órgão ligado ao Gabinete de Segurança Institucional (GSI) e a Justiça Eleitoral, no valor de R$ 2.455.140,00, mantém uma antiga parceria. Há 23 anos a agência atua no apoio à realização de eleições.

Na contramão da antiga aliança, o diretor-geral da Abin, Alexandre Ramagem, usou as redes sociais para atacar o modelo atual de urna e defender a proposta do voto impresso, bandeira do presidente Jair Bolsonaro, derrubada pela Câmara dos Deputados no último dia 10. "Voto auditável significa evolução das urnas eletrônicas e segurança ao pleito eleitoral", escreveu Ramagem no Twitter. "Assegura integridade e transparência aos resultados do sufrágio universal. Compromisso com a representatividade popular e a democracia. Eleições democráticas com contagem pública dos votos."

A publicação foi feita no dia 1.º de agosto, logo após um final de semana de manifestações bolsonaristas em defesa do voto impresso. Os eventos contaram com a presença de Bolsonaro, que, em discurso inflamado, afirmou que sem o comprovante do voto em cédula de papel não haveria eleição em 2022.

Assinado em 27 de maio, o termo do contrato entre a Abin e o TSE prevê apoio, orientação e técnicos e especializados, por parte da agência, nas áreas de criptografia, segurança de hardware e das comunicações, segurança e auditoria de sistemas de votação, segurança física e computação forense.

Ligado à família Bolsonaro, o atual diretor da Abin foi o pivô, em abril de 2020, do rompimento do então ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, com o presidente. Bolsonaro decidiu nomear Ramagem para o cargo de diretor-geral da Polícia Federal sem ouvir Moro. A nomeação foi suspensa pelo Supremo Tribunal Federal (STF), sob suspeita de que poderia atuar na instituição em defesa de interesses do presidente.

A tentativa frustrada de entregar o comando da PF a Ramagem foi atribuída a Carlos Bolsonaro, filho do presidente, que se tornou amigo dele durante a campanha de 2018. Na disputa eleitoral, Ramagem coordenou a segurança de Jair Bolsonaro após a facada sofrida pelo candidato em Juiz de Fora (MG). Procurado pela reportagem, ele não respondeu às tentativas de contato.

 

Longa data. A parceria entre a Abin e o TSE vai além de acordo pontuais. Em resposta ao Estadão via Lei de Acesso à Informação, o GSI afirmou que, desde 1998, a Abin elabora o códigofonte de algoritmos para uso exclusivo do tribunal em eleições – a função desse produto é cifrar dados – e realiza a assinatura do software dos arquivos de resultado das votações. Além disso, outros serviços de criptografia são oferecidos para garantir a segurança das urnas eletrônicas, dos softwares do TSE e das informações de funcionários do órgão.

A tecnologia criptográfica é fornecida integralmente pelo Centro de Pesquisa e Desenvolvimento para a Segurança das Comunicações (Cepesc), área da Abin responsável por desenvolver programas e ferramentas que garantem a transmissão segura de informações do governo federal. Nessa parceria que já dura 23 anos, José Carrijo, servidor aposentado da Cepesc, foi o elo entre a agência de inteligência e a Justiça Eleitoral.

Em 1995, Carrijo atuava como coordenador de criptografia da Abin. Naquele ano, ele foi convidado para comparecer à reunião no TSE na qual se discutiu o desenvolvimento da urna eletrônica. Anos depois, o tribunal firmou parceria com a agência de inteligência e Carrijo se tornou o responsável por coordenar a equipe que realiza os processos de cifrar e assinar os arquivos da urna eletrônica durante as eleições. "A urna eletrônica é um projeto brasileiro, robusto, de excelente qualidade técnica, desenvolvido e aprimorado pelo TSE a cada pleito eleitoral", afirmou. "Ela tem o objetivo de assegurar o voto do eleitor."

 

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Forças Armadas não são risco, diz FHC


Em evento, ex-presidente afirmou que é 'baixo' o risco de ruptura institucional no Brasil no atual momento

 

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) minimizou o risco à ordem e à Constituição no Brasil atual, mas destacou ser necessário esforço daqueles que têm mais compromisso com a vigência das leis para que seja reforçada e mantida a regra democrática. "Qual é a possibilidade de quebrar a regra no Brasil? Acho que é baixa", disse, em evento transmitido pela internet do grupo Parlatório com o tema O Futuro de uma Nação e curadoria do ex-presidente Michel Temer.

No domingo, reportagem do Estadão mostrou que ex-presidentes da República têm procurado comandantes militares para avaliar o risco de ruptura institucional no País. A reportagem mostrou que os militares têm afirmado que haverá eleições e que o vencedor será empossado, seja ele quem for. A articulação está sendo feita por todos os ex-presidentes, com exceção de Dilma Rousseff (PT).

No evento online, FHC disse não observar neste momento nenhum integrante das Forças Armadas dizendo que vai descumprir as regras e a Constituição. "Conheço pouco das Forças Armadas, mas não vejo nas Forças Armadas risco à ordem. Vivemos em sociedade que é livre. Neste momento nos cabe apoiar as normas, senão as pessoas se sentem à vontade para agir conforme seus impulsos. Temos que exercer nossa influência para cumprimento da ordem. Para isso tenho coragem", completou.

Na sequência, FHC disse que "o fato de ter presidente que é baixo oficial (referência a Jair Bolsonaro) não quer dizer que vai ser autoritário, mas pode ter ímpetos." Na abertura do debate, Temer disse que "toda vez que há desarmonia entre os Três Poderes há inconstitucionalidade".

A transmissão do grupo Parlatório também contou com a participação do ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Carlos Ayres Britto, do ex-ministro da Fazenda Joaquim Levy, do embaixador Rubens Barbosa, do presidente da Vibra Energia (nova marca corporativa da BR Distribuidora), Wilson Ferreira Júnior, e do general Otávio Rêgo Barros, que foi porta-voz do governo Bolsonaro.