O Globo, n. 32762, 19/04/2023. Economia, p. 12

Em caso de descumprimento, presidente terá de se explicar ao Congresso



O projeto de lei do novo arcabouço fiscal do país estabelece que o presidente da República precisará se justificar ao Congresso Nacional caso o governo não cumpra as metas de resultado das contas públicas. O presidente também terá que apontar medidas para corrigir o rumo das contas do governo.

De acordo com o texto, divulgado pelo Ministério da Fazenda, caso a meta de resultado primário não seja cumprida, “o presidente encaminhará mensagem ao Congresso Nacional, até 31 de maio do exercício seguinte, com as razões do descumprimento e as medidas de correção.”

O texto deixa claro, porém, que o descumprimento da meta não configura infração à Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Uma infração à LRF pode gerar até mesmo impeachment de um presidente da República. Hoje, a LRF manda o governo cumprir uma meta estabelecida pela Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO).

A meta continua existindo. O que muda é que ela deixa de ser uma imposição.

Pelo novo arcabouço fiscal, as contas públicas perseguirão uma meta de resultado, que pode variar. Hoje essa meta é fixa.

Em 2024, a meta é zerar o déficit. Considerando a variação, esse resultado pode ficar entre 0,25% do PIB de superávit e 0,25% do PIB de déficit.

A economista Elena Landau, ex-diretora do BNDES, diz que o texto não deixa claro se haverá outras penalidades em caso de descumprimento de metas. A previsão no texto é que o limite de gastos autorizados cairia de 70% do aumento das receitas para 50%.

—É uma regra supercomplexa, feita para substituir uma simples que foi furada pelo governo anterior. Não há uma punição clara em caso de descumprimento das metas, e a negociação começa mal porque se parte de um patamar já alto estabelecido pela “PEC da Transição” — afirma ela, em referência aos R$ 168 bilhões autorizados pela PEC fora do teto este ano.

A economista também criticou o volume de exceções previstos na regra, como a ideia de deixar de fora o parcelamento dos precatórios.

Para Sérgio Vale, economista-chefe da MB Associados, o novo arcabouço prevê “mimetizar o que o Banco Central faz em caso de descumprimento de metas, no caso, fazer uma carta ao Congresso quando não se cumpre.”

— O governo vai explicar o que vai fazer, os ajustes que promoverá, mas isso é insuficiente. O arcabouço não tem sinalização clara de penalidade em caso de descumprimento, e o risco é ser uma letra morta —ressalta.

Para ele, a redução do limite de crescimento de receita é “uma penalização frágil e pequena para o tamanho do déficit” do Brasil.

A meta do governo é zerar o déficit público em 2024. Mas, para Vale, será necessário fazer mudanças na proposta durante a tramitação para assegurar que esse alvo seja atingido. Ele calcula que, para estabilizar a dívida brasileira, o país precisaria de superávit primário de 2,5% do PIB. De acordo com as previsões do governo, o país deve ter superávit de 1% do PIB em 2026.

— Muita coisa ficou fora na regra, e não sabemos o que isso vai representar no Orçamento de 2024. Os precatórios, principalmente — diz Vale.