O Estado de S. Paulo, n. 46644, 02/07/2021. Economia, p. B6

Análise: Acordo sinaliza força do Ocidente e volta do liberalismo controlado

Vinícius Rodrigues Vieira


Independentemente dos detalhes, o acordo anunciado para assegurar um imposto mínimo de 15% sobre os ganhos de multinacionais sinaliza que o Estado intervencionista está de volta após pouco mais de 30 anos de regulação mínima do capital.

Interessante notar que, tal como na origem do liberalismo controlado que predominou entre 1945 e 1980, o acordo foi posto na mesa pelo Ocidente. À China e demais emergentes do G-20 coube aceitar a proposta formulada no âmbito do G-7 e da OCDE. Por mais que Pequim relute, EUA e aliados ainda dão as cartas na política global.

Todavia, parece exagerado considerar que o acordo represente o fim da race to the bottom – ou seja, a competição entre nações por investimentos mediante a oferta de condições favoráveis a retornos maximizados. De fato, quanto menor o imposto, maior tende a ser o lucro das corporações e, assim, os dividendos dos acionistas.

No entanto, de nada basta impor limites fiscais enquanto a ausência de direitos trabalhistas, regras contra a exploração de minorias e de legislação ambiental robusta prevalecerem nos confins do capitalismo. A falta de efetiva regulação global nessas esferas afeta o retorno mais que a tributação.

Mais importante que os 15% é o outro pilar da negociação: um aumento – ainda a ser definido – da tributação no local de consumo, em detrimento das jurisdições onde empresas produzem ou estão registradas. Tal medida deve reduzir a competitividade de países que, na prática, funcionam como paraísos fiscais. Mesmo assim, não se deve negligenciar o poder estatal em oferecer uma espécie de renúncia indireta, que inclui o acesso a subsídios e tecnologia. Isso para não falar que não está claro como o acordo vai lidar com distorções de taxação local, sobre os quais países federados, como Brasil, não dispõem de poder imediato. A guerra fiscal entre países pode ter fim, mas, dentro deles, tudo indica que a batalha continua.

Prof. de Relações Internacionais da FAAP e FGV