Título: ¿Teremos 3 milhões de habitantes¿
Autor: Soraia Costa
Fonte: Jornal do Brasil, 27/05/2005, Brasília, p. D3

Com a conclusão das reuniões regionais que discutiram a revisão do Plano Diretor de Ordenamento Territorial, a Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação (Seduh) começa, agora, a sistematizar as sugestões da população e separá-las em temas. O projeto de lei será levado à aprovação da comunidade em duas audiências regionais, ainda sem data marcada, antes de ser enviado à Câmara Legislativa. As principais preocupações da população dizem respeito às questões ambientais e de desenvolvimento e mobilidade urbanos. À frente da Seduh desde julho do ano passado, a secretária Diana Meirelles Motta coordena as atividades de revisão e destaca a importância da participação da comunidade no processo dizendo que ¿a eficácia da gestão urbana e das ações urbanas reside, especialmente, em trabalhar junto com a comunidade¿. De acordo com ela, todos os planos precisam levar em conta uma projeção de 3 milhões de habitantes para o Distrito Federal.

Além disso, a secretária destaca que cerca de 93% do território do DF tem algum tipo de restrição à ocupação no que diz respeito à regulação ambiental. Isso implica a conciliação da demanda habitacional e das demandas por atividades econômicas de desenvolvimento das funções urbanas, com as questões de ocupação do território. Diana trabalha com políticas públicas, principalmente na formulação de projetos de lei de política urbana e também de programas e projetos urbanos integrados desde 1980, quando passou a integrar o Conselho Nacional de Desenvolvimento Urbano, vinculado ao Ministério do Interior.

- Para que servirá o PDOT?

- O PDOT é um instrumento de política urbana que tem como responsabilidade maior a orientação das atividades públicas e privadas no território, atendendo a questões de habitação e regularização, seja habitacional ou fundiária, transporte e mobilidade urbana, de mobilidade urbana e questões relacionadas à sustentabilidade ambiental, ao desenvolvimento econômico e a outras atividades que vão ocorrer no território. Também as questões de desenvolvimento urbano, dos equipamentos públicos e privados do território.

- Em que ele mudará a vida das pessoas?

- Como ele é um instrumento, um meio de administração da cidade, em termos da cidadania, ele esclarece ao cidadão, orienta onde a cidade vai poder crescer, onde o cidadão se vê, aí, especialmente, se a sua vida vai ser simplificada, por uma questão de maior oferta de habitação em determinados locais, porque ele indica os locais onde poderá ter um maior adensamento da ocupação por áreas habitacionais e por áreas de atividade econômica.

- Se ele é um plano para o futuro, por que revisar?

- Justamente porque hoje, do jeito em que está, não contempla todas as transformações que ocorreram de 1997 para cá. As transformações foram muitas e algumas delas também ocorreram naturalmente, não vou dizer em desacordo com o plano, mas necessitam ser corrigidas e ajustadas ao plano. Então o plano urbano tem de ser revisto, sim. É muito importante, porque a dinâmica urbana é complexa e ocorre. Se os planos não conseguem absorver a dinâmica urbana real, não se tem condições de ter uma cidade legal. Então a idéia é que a gente faça uma revisão orientada, fundamentada, na realidade hoje. Por exemplo, nós estamos em uma área metropolitana onde é fundamental que tudo que se discuta considere um potencial de 3 milhões de habitantes. É fundamental que considere os municípios limítrofes ao Distrito Federal, os municípios do Entorno. É importante que consideremos todas as ocupações irregulares no DF visando justamente a regularização, porque é um princípio que temos que temos que reconhecer. É importante que este plano seja revisto porque tivemos o Estatuto das Cidades, que foi instituído em 2001 e o plano é de 1997. O Estatuto das Cidades incopora novos instrumentos - pelo menos 22 instrumentos de gestão urbana são instituídos - temos que adequar ao plano de Brasília, à lei federal. Outra coisa importante: tivemos o censo demográfico de 2000, que veio justamente no sentido de atualizar as tendências demográficas, porque é fundamental fazer um plano sabendo qual a capacidade de absorção e como é que as pessoas vão se situar no território. Tivemos também o plano de águas que foi estabelecido depois de 1997, então há muitos argumentos e de fato, toda dinâmica urbana tem que considerar a revisão periódica do plano. Estamos fazendo uma revisão que é necessária e fundamental.

- Qual é o prazo para o encaminhamento do projeto à Câmara?

- A idéia é que encaminhemos uma proposta de projeto-de-lei para a Câmara Legislativa no segundo semestre. Agora, esse trabalho está sendo feito ouvindo a comunidade, tivemos mais de 150 reuniões.

- A lei estabelece um prazo para a revisão?

- O que estava estabelecido em 1997 é que até quatro anos podia ter sido revisto. Então, achamos que já passou inclusive esse prazo mínimo de ser revisto e por isso mesmo a oportunidade é essa.

- Como está sendo a participação da comunidade e a qualidade das sugestões?

- A qualidade das sugestões está sendo muito proveitosa, muito bem orientada. Estamos recebendo sugestões de entidades de classe, de associações de moradores, de sindicatos, de organizações não-governamentais, tanto por internet quanto por documentos encaminhados à secretaria.

- Como foi a divulgação?

- A divulgação foi feita especialmente pelas administrações regionais. Tivemos um site na internet que comunica exatamente a agenda das reuniões, todas as informações sobre o plano, inclusive o PDOT de 1997, os trabalhos e as agendas das reuniões. Estivemos sempre informando as datas das reuniões regionais por meio de muita publicidade pelo rádio e pelos jornais.

- As pessoas estão reclamando que não houve uma orientação para grande parte da população, que muita gente não sabe as dferenças entre PDOT e PDL e qual é a importância desses planos. O que a senhora responde sobre isso?

- A primeira tarefa nossa era justamente explicar isso, o que é o PDOT, quais são seus objetivos e fazer com que as pessoas ficassem à vontade, apresentando propostas para a cidade. Não podíamos, de antemão, cercear a população no que diz respeito à questão do que ela deveria dizer inicialmente. Por isso foi um debate aberto, como deve ser de fato, a população se mostrando e mostrando suas dificuldades.

- Qual foi a metodologia usada para incentivar essa participação?

- Tivemos vários tipos de reuniões. Tivemos várias reuniões locais, em cada cidade - Só Taguatinga fez 10 reuniões - informando as pessoas e explicando o que seria aquilo. Depois tivemos audiências regionais que agregamos o território do DF em seis grandes áreas. Ainda vamos fazer duas grandes audiências gerais, com previsão para ser em julho, agosto, mas ainda não tem uma data definida. É importante que agora, com essa quantidade enorme de trabalhos que nós temos, com sugestões que recebemos, temos que sistematizar essas informações justamente para verificar a validade dessas informações nos órgãos competentes.

- Já tem alguma proposta sendo formulada, temas definidos?

- Nós trabalhamos todas as discussões com base em cinco itens. O tema relacionado à questão da regularização da habitação, que com certeza são temas que vão ter que ser contemplados, o tema da mobilidade do transporte urbano, o tema da infra-estrutura e do saneamento, o tema do patrimônio ambiental e do patrimônio construído e outros temas que foram colocados pela população. Mas em geral essas são os principais itens, porque como é um plano que está sendo construído junto com a comunidade, não podíamos dizer antecipadamente o que deveria ou não deveria ser discutido, apenas demos as grandes linhas de ação, que são matérias de plano.

- Quais foram as principais demandas já identificadas?

- Há muita demanda de regularização porque temos, especialmente na questão dos condomínios de classe média, cerca de 600 mil pessoas que vivem em áreas irregulares. Existem também muitas demandas relacionadas à questão das organizações não governamentais.

- Qual é o déficit habitacional do DF?

- Temos um déficit de 111 mil domicílios. É importante dizer que esse déficit ocorre em todas as faixas de renda - baixa, média e alta - mas o DF, é importante que se diga, tem o menor percentual do Brasil em termos de áreas urbanas informais de baixa renda - em torno de 6, 8%, enquanto no Brasil chega a 50, 60%.

- Como resolver esse problema?

- Nós temos de buscar um dimensionamento dessa demanda. Há estudos de demanda do GDF por faixa de renda e nós vamos fazer um esforço importante no sentido de tentar identificar como essa população poderia se abrigar na área metropolitana.

- No caso da área tombada, o que essa discussão do PDOT, pode trazer de mudança, de expansão, de desenvolvimento?

- Nós temos a oportunidade de aperfeiçoar e melhorar junto com todos os órgãos competentes das áreas federal e local para delimitarmos a área de atuação no que diz respeito à questão da gestão da área tombada e seus diferentes níveis de atuação.

- O PDOT pode prever soluções para problemas como estacionamento, falta de opções de lazer?

- Isso ele trata de forma indireta. Por exemplo, como ele é um plano macro, de ordenamento territorial geral do DF como um todo, vai tratar disso quando, especialmente, ele busca, por um lado, a descentralização das atividades econômicas e das funções urbanas. Quando ele busca a descentralização, orientando ocupação em outras áreas, naturalmente você, indiretamente, resolve e trata dessas questões de forma indireta. A idéia é esta, inclusive tratando a área tombada nesses termos, também.

- Outros planos diretores estão sendo discutidos. Qual a importância desses outros planos na discussão do PDOT? Como eles são utilizados na discussão do PDOT?

- Todas as demandas que nós estamos recebendo que são temas de Plano Diretor Local estamos encaminhando para um futuro processo de revisão, mas já estamos considerando agora.

- Já existe um anel de proteção à área tombada?

- O anel viário é uma proposta do DER e busca descongestionar a área central de Brasília e direcionar o tráfico pesado para um anel, principalmente por uma questão de preservação. Por Brasília passam as grandes ligações do País - leste, oeste, norte e sul. Neste sentido, todo o tráfico direcionado para cá seria desviado neste anel, que continuaria dentro do DF. Nós achamos que isto vai contribuir não só para o descongestionamento do tráfico pesado aqui, mas também para a preservação.

- Qual a importância da regularização dos condomínios?

- A importância primeiro diz respeito à cidadania. Isso é uma responsabilidade do gestor público urbano. A questão da regularização é um princípio que está no Estatuto das Cidades. Reuniões de âmbito internacional consagraram o principio da regularização fundiária não só para a população de baixa renda, mas também para a população de renda média.

- Por que essa importância? Ela vai gerar um projeto urbano?

- Se uma área é considerada irregular e ilegal você tem vários aspectos e impactos negativos. O primeiro ponto é que elas não são consideradas nos planos urbanísticos. Se uma área é ilegal e irregular não há como, do ponto de vista administrativo, incorporar aquela área para benefícios públicos, por exemplo, para programas de saneamento, programas de infra-estrutura e de transporte.

- O PDOT pode prever a privatização da Orla do Lago?

Com relação á Orla do Lago, o que nós estamos tratando diz respeito especialmente à questão do tratamento da área tombada. A Secretaria já está trabalhando o Plano Diretor da Área Tombada. A privatização nunca foi uma proposta trabalhada. Pelo contrário, trabalhamos uma visão que agrega as orientações de Lúcio Costa e a legislação do patrimônio.