Título: Simulações dissimuladas
Autor: Cristiane Crelier
Fonte: Jornal do Brasil, 24/07/2005, Economia & Negócios, p. A22

As simulações de aposentadoria na previdência privada confundem o consumidor. Quem já acessou um site de instituição financeira interessado em fazer um plano e realizou simulações de aposentadoria em mais de uma empresa se questiona como é possível ter resultados tão diferentes no cálculo.

- Fiz uma simulação em dois bancos diferentes, indicando a renda que eu gostaria de ter na minha aposentadoria. Porém, o resultado de quanto eu deveria contribuir por mês para ter essa renda fornecido por um deles era metade do apresentado pelo outro. Parece até propaganda enganosa - comenta Marcelo Mendonça.

O economista Leonardo Diz, da Associação Pro Teste Consumidores, explica o porquê das discrepâncias.

- Não se pode considerar propaganda enganosa. Os sites deixam bem claro que não é garantido o retorno, que é mera simulação. O problema é que as instituições usam fórmulas diferentes para o cálculo, trabalham com diversos índices de correção e rentabilidade média esperada, tabelas de expectativa de vida, taxas de administração e carregamento etc - explica Diz, para quem o que há é falha na informação. - Os bancos deveriam deixar bem claro para o usuário do programa de simulação a forma como a instituição faz o cálculo e chega àquele resultado.

O Jornal do Brasil fez uma pesquisa pelos sites das instituições financeiras que oferecem produtos PGBL e VGBL. Verificou-se que a maioria esclarece apenas qual foi a rentabilidade média estimada utilizada para o cálculo (alguns permitem que o usuário escolha essa rentabilidade), a taxa de repasse do excedente financeiro e o índice de correção aplicado. Em alguns, é informada a taxa de carregamento. Alguns, porém, não dão informações. Os que melhor esclarecem o consumidor sobre os detalhes da fórmula de cálculo são o Bradesco e o Santander - que indicam, inclusive, a tábua atuarial adotada. Curiosamente, esses são também os que apresentam resultados com valores mais altos de contribuição em comparação aos demais para se atingir a mesma renda após o mesmo período de acúmulo, talvez pela minúcia do cálculo.

- As vantagens são oferecidas por uma instituição com base no que ela quer oferecer para o cliente e, logicamente, visando ao lucro dela mesma. Podem variar como variam as taxas de administração bancária. O que ocorre é que algumas instituições se lançam como extremamente vantajosas, e o consumidor tem que ficar atento pois a escolha de um plano de previdência é como casamento: pretende-se que dure a vida toda. Se a diferença é de duas ou três vezes, vale ficar atento. É a concorrência que provoca essas variações - comenta Marcos Zumba, diretor jurídico da Associação Centro de Cidadania em Defesa do Consumidor e Trabalhador (Acecont).

Vale frisar que os resultados são todos fictícios, baseados em projeções, e, por isso, não resguardam o consumidor de ter surpresas no futuro - como as que já ocorreram em alguns dos antigos planos de previdência privada.

- Em 1980, adquiri um Plano de pensão vitalícia da Capemi (Caixa de Pecúlio dos Militares), que prometia uma pensão de sete a 11 salários mínimos, após pagamento por um período mínimo de 14 anos. Após 15 anos, fui ver como estava a minha pensão. Na Capemi, entretanto, fui informado de que o meu plano não existia mais, que a minha pensão seria de R$ 1,09 e que, para ter uma pensão integral, deveria alterar os valores pagos, pois estavam defasados, e pagar mais 15 anos. Eles disseram não me encontraram para recadastramento, mas eu sempre trabalhei no mesmo lugar - conta Delfino Correa Goulart.

A Capemi informou que problemas semelhantes ocorreram com outros contribuintes em razão dos inúmeros planos econômicos - que reduziram as contribuições a quantias irrisórias. Segundo a Susep, alguns planos foram bloqueados à comercialização por serem inadaptáveis à Lei nº 6435/77, que dispõe sobre o funcionamento das instituições de previdência privada. ''O bloqueio resultou, porém, no distanciamento entre os valores dos benefícios e das contribuições e a realidade econômica do país'', reconhece a autarquia.