O Globo, n. 32790, 17/05/2023. Política, p. 6

Por unanimidade, TSE cassa Deltan e deputado se diz alvo de “vingança”

Daniel Gullino
Rafael Moraes Moura


Por unanimidade, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) indeferiu ontem o registro de candidatura do deputado Deltan Dallagnol (Podemos-PR), ex-coordenador da força-tarefa da Lava-Jato em Curitiba. Na prática, isso significa a cassação de seu mandato. A decisão deve ser cumprida imediatamente, mas ele ainda poderá apresentar recurso ao próprio TSE e ao Supremo Tribunal Federal (STF).

O relator do caso na Corte’, ministro Benedito Gonçalves, considerou que Deltan pediu exoneração do cargo de procurador para evitar uma eventual punição administrativa, que poderia torná-lo inelegível.

— Constata-se, assim, que o recorrido agiu para fraudar a lei, uma vez que praticou, de forma capciosa e deliberada, uma série de atos para obstar processos administrativos disciplinares contra si e, portanto, elidir a inelegibilidade — afirmou Gonçalves em seu voto.

A decisão foi baseada na Lei da Ficha Limpa, que determina que são inelegíveis por oito anos os magistrados e membros do Ministério Público que “tenham pedido exoneração ou aposentadoria voluntária na pendência de processo administrativo disciplinar”.

Seguiram o voto do relator o presidente do TSE, Alexandre de Moraes, e os ministros Cármen Lúcia, Carlos Horbach, Nunes Marques, Raul Araújo e Sérgio Banhos.

O pedido de cassação, apresentado pela federação PT, PCdoB e PV e pelo PMN, foi rejeitado pelo Tribunal Regional Eleitoral do Paraná (TRE-PR). Os partidos recorreram ao TSE.

Pela decisão, os votos recebidos por Deltan, serão destinados a seu partido.

Estratégia jurídica

Derrotado por 7 a 0 no plenário do TSE, Deltan já traçou a estratégia jurídica para tentar salvar seu mandato, segundo o blog da coluna de Malu Gaspar, do GLOBO.

O placar unânime a favor da cassação surpreendeu tanto aliados quanto adversários de Deltan, que avaliavam que o ex-coordenador da Lava-Jato em Curitiba poderia ganhar algum apoio após o Ministério Público Eleitoral ter se manifestado contra a condenação.

Segundo a equipe da coluna apurou, Deltan pretende acionar o Supremo para susdica, pender os efeitos do julgamento de ontem. É o que fizeram outros parlamentares que também foram cassados pelo TSE, como o deputado estadual pelo Paraná Fernando Francischini, então no PSL, e o federal Valdevan Noventa (PL-SE), ambos bolsonaristas.

Nos dois casos, o ministro Nunes Marques suspendeu as condenações impostas pelo plenário do Tribunal Superior Eleitoral. Depois, a Segunda Turma do STF derrubou as liminares, provocando uma nova reviravolta e mantendo as sanções que haviam sido impostas pela Corte Eleitoral.

Aliados de Deltan torcem para que o recurso caia nas mãos de algum ministro da Primeira Turma, onde figuram magistrados mais simpáticos à Lava-Jato: Luiz Fux e Luís Roberto Barroso.

Se o caso parar nas mãos de um ministro da Segunda Turma, uma reviravolta é considerada virtualmente impossível, já que o colegiado reúne magistrados mais críticos à operação, como Dias Toffoli e Gilmar Mendes.

Deltan esteve à frente da força-tarefa da Lava-Jato em Curitiba até o fim das atividades do grupo. Ele deixou o cargo de procurador no Paraná para se candidatar a deputado federal no ano passado, alcançando a maior votação do estado.

Em nota, Deltan afirmou que “344.917 mil vozes paranaenses e de milhões de brasileiros foram caladas nesta noite com uma única canetada, ao arrepio da lei e da Justiça”. No texto, ele diz ainda que seu sentimento é de “indignação com a vingança sem precedentes que está em curso no Brasil contra os agentes da lei que ousaram combater a corrupção”.

O advogado de Deltan, Leandro Souza Rosa, afirmou na sessão que ele não era alvo de nenhum processo administrativo disciplinar aberto (PAD) no Conselho Nacional de Ministério Público (CNMP) no momento em que pediu exoneração, em novembro de 2021.

— Com base no princípio da confiança, da segurança juríDeltan formalizou o seu pedido de exoneração, porque o seu órgão de fiscalização disse que ele não tinha absolutamente nenhum processo administrativo disciplinar aberto —argumentou.

Entretanto, Gonçalves considerou que havia outros tipos de procedimentos abertos no CNMP, de caráter preliminar, que poderiam acarretar em PADs, e que por isso ele antecipou sua saída. Eram 15 procedimentos, incluindo nove reclamações disciplinares.

Pela legislação eleitoral, ele só precisaria deixar o cargo seis meses antes do pleito, no início de abril de 2022.

O relator ainda ressaltou que a exoneração de Deltan ocorreu 16 dias após o CNMP determinar a demissão de um colega seu na força-tarefa da Lava-Jato, Diogo Castor de Mattos, que foi responsável por um outdoor em defesa da operação.