Título: Da fila à cidadania
Autor: João Henrique
Fonte: Jornal do Brasil, 18/06/2005, Outras Opiniões, p. A15

Desde minha posse à frente da Prefeitura de Salvador, instaurei uma ampla fiscalização sobre todas as agências bancárias da capital baiana em uma ação administrativa que sintetiza, na prática, minhas prioridades: a defesa do cidadão/consumidor e a inclusão social.

Esta fiscalização visa, apesar das ferrenhas críticas do poder econômico, a preservar a legislação em vigor. Tudo gira em torno de uma lei aprovada em agosto de 2001 que jamais foi cumprida pela iniciativa privada ou fiscalizada pelo poder público: a lei que obriga os bancos a manter, no setor de caixas, funcionários em número compatível com o fluxo de usuários, de modo a permitir que cada cidadão seja atendido em, no máximo, 15 (quinze) minutos

A lei, de autoria do então vereador em Salvador e hoje deputado federal Daniel Almeida (PCdoB), determina que, ao descumprirem a lei, os bancos sejam advertidos, multados e até tenham o alvará de funcionamento cassado.

Antes de mais nada, tal lei - que na prática regulamenta no município um artigo do próprio Código de Defesa do Consumidor - é destinada ao cidadão que, fiel às suas obrigações, se vê rotineiramente desrespeitado em seus direitos básicos de consumidor. Desrespeitado, no caso, para atender a interesses econômicos de outrem.

A fiscalização, levada a efeito por mais de 50 fiscais da Prefeitura de Salvador, permitiu, por exemplo, a interdição de agências bancária por tempo indeterminado, a autuação de mais de 80 agências bancárias e embargo de 8 delas por 5 dias. Ressalte-se que a interdição é a última pena prevista pela lei (antes dela, cabe ao poder público notificar, multar e embargar por 15 dias úteis a agência que descumprir a lei).

Mais do que a legislação, porém, a fundamentação de toda essa fiscalização é a defesa do consumidor. Nenhum cidadão pode, nos dias de hoje, ficar à mercê da boa vontade de banqueiros e permanecer por horas a fio para ser atendido.

Embora possa parecer uma medida dura, a lei deve ser aplicada com rigor para garantir que o cidadão seja o maior beneficiado. Visa possibilitar o pleno exercício da cidadania para os seus mais de 2,6 milhões de habitantes de Salvador.

Precisamos relembrar que, à medida que promoveram demissões em massa nos últimos anos para atender seus interesses, as agências bancárias levaram os cidadãos a enfrentar filas intermináveis, transformando o simples pagamento de contas em um calvário. Pior, tal calvário não é alvo dos mandatários desse país pelo simples fato de não terem vontade política para enfrentar o poder econômico.

Prevista na legislação municipal de várias capitais brasileiras, a lei da fila simplesmente não ''decola''. Em Salvador, ao arrepio do Código de Defesa do Consumidor, o que persiste são as tentativas de liminarmente vetá-la sob o argumento de que cabe à União legislar sobre sua atuação e que fiscais municipais não poderiam sequer entrar nas agências. Com a lei respeitada, o atendimento deve melhorar nos bancos e quem sabe novos empregos possam ser criados.

Como vice-presidente da Frente Nacional dos Prefeitos, da região nordeste, pretendo nacionalizar essa discussão. O atual deputado Daniel Almeida, a exemplo do que fez o atual ministro Ricardo Berzoini, aliás, já apresentou um projeto de lei na Câmara Federal para tornar essa lei válida em todo o território nacional.

Assim como vem ocorrendo em Salvador, tenho certeza que a sociedade civil organizada vai aplaudir e trabalhar pela aplicação dessa lei. Na capital baiana, além do apoio explícito da população, nossa fiscalização conta com o apoio de entidades como a OAB, a ABI e os conselhos federal e regional de economia. Através do telefone 156, pela Internet ou diretamente nas administrações regionais, o cidadão pode denunciar filas bancárias e solicitar a fiscalização.

Com essa e muitas outras ações, Salvador vai se tornar mais humana, menos desigual e mais inclusiva.