Título: Negócios de fantasmas
Autor:
Fonte: Jornal do Brasil, 21/05/2005, Opinião, p. A10

Na inquietante sucessão de maus exemplos alastrados na República, pontuada pelos vícios implacáveis da prevaricação na política, a discussão sobre a criação da chamada CPI dos Correios abriu nova rodada de um jogo tão antigo quando vergonhoso: a transformação das assinaturas de apoio à instalação da comissão em moeda de troca para barganhas e acordos nada edificantes. Assim tem repetido a história partidária brasileira. Assim têm imergido governo e oposição, do Executivo e do Legislativo. Entre as ruidosas tentativas de barrar ou instalar a CPI para investigar esquema de propina na estatal - sob suposta influência do presidente do PTB, Roberto Jefferson -, sobressai-se mais uma vez a utilização dos conchavos espúrios, o relativismo moral a adoçar o confete das disputas partidárias e a inexistência de critérios mais sólidos para justificar as ações de parlamentares e legendas.

O mal-estar atual, convém ressaltar, revela-se da mais alta gravidade, cujas conseqüências políticas tendem a tornar-se especialmente perturbadoras. Superá-lo é desafio urgente para o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, sob pena de estender de modo preocupante a sensação de descontrole institucional generalizado. Esta é a percepção de eleitores, da opinião pública e de algumas das vozes mais sensatas de Brasília. Uma ruína moral que aflige os homens de bem e ameaça a democracia.

Tal inquietação decorre, como o JB vem insistindo, da crescente fragilização do sistema partidário brasileiro. Mais: da intensa mutação sofrida pelas legendas, muitas delas eficientes máquinas de ''operação empresarial'', veículos de intermediação de negócios instituídos para garantir dividendos particulares de líderes e parceiros. Os partidos transformaram-se, enfim, em ambiente propício à sobrevida de fantasmas insaciáveis, capazes de amedrontar o país.