Título: 'Como uma ovelha no matadouro'
Autor: Olivia Hirsch
Fonte: Jornal do Brasil, 15/05/2005, Internacional, p. A12

''Fui mutilada na genitália quando tinha 10 anos. Minha avó, já falecida, me disse que me levariam ao rio para uma certa cerimônia e que depois me dariam muita comida. Como uma criança inocente, fui levada como uma ovelha ao matadouro.

Quanto entrei na mata secreta, fui levada a um quarto escuro e despida. Estava vendada e nua. Fui então carregada por dois homens fortes ao local da operação. Quatro mulheres me forçaram a deitar de barriga para cima e em dupla seguraram minhas pernas. Outra sentou no meu peito para impedir os movimentos. Enfiaram um pedaço de tecido na minha boca para abafar os gritos. Fui então raspada.

Quando a operação começou, me debati muito. A dor era terrível e insuportável. Durante a briga, fui cortada seriamente e perdi sangue. Todos que participaram da operação estavam embriagados. Outros dançavam, cantavam e pior: estavam nus.

Fui mutilada na genitália por um canivete cego.

Depois da operação, não deixaram que outras pessoas me ajudassem a caminhar. A coisa que colocaram na ferida a estancou, mas doía. Foram momentos terríveis. Queria urinar sempre, mas fui forçada a ficar em pé. A urina chegava ao ferimento e a dor voltava. Às vezes, tinha que me forçar a não urinar pelo medo da dor terrível. Não me deram qualquer anestésico durante a operação ou para evitar a dor posterior, ou antibióticos para a infecção.

Depois, tive hemorragia e fiquei anêmica. Isso foi atribuído à bruxaria. Sofri por muito tempo de infecções vaginais agudas''.

Hannah Koroma, Serra Leoa, em depoimento à Anistia Internacional