O Estado de S. Paulo, n. 46588, 07/05/2021. Economia &
Negócios, p. B1
STF derruba regra de lei que permite a prorrogação de prazos de
patentes
Rafael Moraes Moura
Por 9 votos a 2, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu ontem derrubar uma
norma que permite a prorrogação do prazo de patentes concedidas pelo Instituto
Nacional de Propriedade Industrial (Inpi). Ao
analisar uma ação da Procuradoria-Geral da República (PGR) que contesta a Lei
de Propriedade Industrial, o Supremo firmou um entendimento que deve levar à
redução do prazo de patentes, afetando a indústria como um todo, especialmente
o setor farmacêutico, químico e de biotecnologia.
Os
ministros ainda precisam definir a partir de quando deve ser implantado esse
entendimento. Na próxima quarta-feira, o plenário deve esclarecer se o fim do
prazo esticado atinge inclusive patentes farmacêuticas que já foram prorrogadas
e estão em vigência há mais de 20 anos, como defende o relator do caso, Dias Toffoli.
Em
vigor desde 1996, a Lei de Propriedade Industrial prevê que as patentes têm
prazo de 15 anos a 20 anos, tempo contado a partir da data do pedido (depósito)
feito ao Inpi. Depois desse período, podem ser feitas
versões genéricas de medicamentos, equipamentos e outras invenções livremente.
A
polêmica gira em torno de uma regra da mesma lei que determina que o prazo de
vigência da patente não será inferior a dez anos, no caso de invenções, e de
sete anos para modelos de utilidade (atualizações de algo já existente), prazo
contado a partir de outro marco temporal: a concessão da patente pelo Inpi. Como não há prazo para o instituto conceder a
patente, não há como saber quando a proteção cairá. Muitas invenções acabam protegidas
para além de duas décadas, prazo padrão no resto do mundo.
“O
exercício do direito de propriedade industrial não pode se transmudar em abuso
do poder”, observou o ministro Edson Fachin. “O
consumidor não pode ser indefinidamente vinculado aos preços e
disponibilidade dos produtos definidos pelo detentor do monopólio, sem
perspectiva de quando terá acesso a novas possibilidades daquele produto.”
Saúde. Em
um longo voto, Toffoli defendeu o entendimento de
que, de agora em diante, não se pode mais prorrogar o prazo das patentes para
nenhum produto em nenhuma hipótese. Ou seja: o prazo de vigência das patentes
deve ficar limitado ao período de 20 anos a partir do depósito feito no Inpi.
Toffoli, no entanto, avalia que a decisão do Supremo
deve retroagir nos casos de produtos farmacêuticos e equipamentos de saúde,
considerando as bilionárias despesas do Sistema Único de Saúde (SUS), ampliadas
em um momento de pandemia. Dessa forma, para ele, somente nos casos da área de
saúde, o relator quer que caia a patente que já tenha sido prorrogada. Esse
ponto - que pode atingir um total de 3.435 patentes - ainda precisa ser
esclarecido pelo plenário.
Segundo
relatório do Tribunal de Contas da União (TCU), entre 2008 e 2014, a quase
totalidade dos produtos farmacêuticos tiveram as patentes estendidas por um
prazo superior a 20 anos. De acordo com o TCU, a exploração protegida pela
patente de produtos farmacêuticos dura, em média, 23 anos.
Risco. Apenas
o presidente do STF, Luiz Fux, e o ministro Luís
Roberto Barroso defenderam a manutenção da norma que prevê a prorrogação das
patentes. “Contratos serão rompidos, investidores serão pegos de surpresa com
essa declaração de inconstitucionalidade (do trecho da lei)”,
frisou Fux.
Para
a Associação Brasileira das Indústrias de Medicamentos Genéricos (PróGenéricos), o entendimento da Corte corrige “distorção
histórica” e deve permitir a ampliação do acesso a medicamentos no País. “As
empresas terão segurança jurídica para planejar com antecedência o lançamento
de genéricos e biossimilares a partir do vencimento
das patentes”, disse a presidente da PróGenéricos,
Telma Salles.
Em
nota, a Associação Brasileira da Propriedade Intelectual (ABPI) lamentou a
decisão. Para a entidade, mudança no dispositivo deve gerar insegura jurídica
sobre o tema: “A ABPI sente-se na obrigação de alertar, no entanto, que a
eliminação deste dispositivo – em vigor há mais de 25 anos – poderá gerar
insegurança jurídica e desestimulo à inovação no País .”/ Colaborou
Wesley Gonsalves