O Globo, n. 31485, 20/10/2019. País, p. 10

Crivella corteja Bolsonaro para cristalizar voto conservador

Maiá Menezes


A um ano das eleições municipais, o prefeito Marcelo Crivella (Republicanos) já põe em prática uma estratégia eleitoral oposta à usada na disputa de quatro anos atrás. Se no primeiro turno de 2016 ele buscou ampliar sua base desvinculando-se da Igreja Universal do Reino de Deus, agora quer justamente reforçar o seu lado conservador diante do eleitorado.

Para consolidar o movimento, o apoio do presidente Jair Bolsonaro (PSL) e de seu grupo político para a reeleição é o sonho de consumo no Rio do Republicanos, novo nome do PRB. A ‘bolsonarização’ de Crivella vem sendo articulada pelo ex-deputado federal Rodrigo Bethlem, seu principal estrategista político no momento.

O desejo é ter como vice na chapa do prefeito alguém indicado por Bolsonaro — o nome do deputado federal Hélio Lopes (PSL-RJ), está cotado. A ideia é tirar do campo da direita um concorrente forte e apostar que a máquina e sua capacidade de entrega de obras na reta final do mandato faça a diferença. Não deixar o governador Wilson Witzel (PSC) lançar um nome competitivo também é fundamental nesse contexto político. Os acenos de Crivella na direção do bolsonarismo se sucedem. No dia 1º de setembro, o prefeito publicou em sua página no Facebook imagens da última visita do presidente ao Templo de Salomão, da Universal, em São Paulo.

No mesmo mês, num movimento que se alinha ao perfil de Bolsonaro, de defesa de valores conservadores nos costumes, Crivella defendeu a apreensão, na Bienal do Livro, de exemplares de uma revista em quadrinhos na qual dois personagens gays se beijavam. Embora a iniciativa tenha sido alvo de críticas e questionada judicialmente, os estrategistas do prefeito comemoram a repercussão da medida nas redes sociais justamente entre os eleitores cariocas mais conservadores.

Outro movimento de aproximação com a família Bolsonaro deu-se na semana passada com a nomeação do novo secretário de Ordem Pública do Rio. Gutemberg Fonseca é amigo do senador Flávio Bolsonaro (PSL) e do próprio presidente. Na posse, na última sexta-feira, o deputado estadual Rodrigo Amorim (PSL), ao começar a discursar, disse que representava Flávio no evento.

Nas eleições do ano passado, Gutemberg foi o principal responsável pela campanha do governador Wilson Witzel (PSC) na internet. É dele o mérito de conseguir colar a imagem de Bolsonaro na do então candidato. Gutemberg chegou a ser nomeado secretário de Governo de Witzel, mas acabou deixando o Palácio Guanabara justamente quando o governador decidiu se distanciar de Bolsonaro devido às suas ambições eleitorais em 2022.

— Esse xadrez político é entre a prefeitura e Presidência — desconversa Gutemberg sobre os motivos da sua nomeação.

— O Gutemberg já tinha uma boa relação com o Crivella, mas dada a proximidade com o Flávio e com o próprio Jair, isso nos aproxima do governo federal. É uma pessoa com boa relação com o Bolsonaro. Óbvio que isso facilita ainda mais — diz um aliado de Crivella no Rio.

Visões divergentes

A crise no PSL nas últimas duas semanas fez crescer dentro do Republicanos a corrente de deputados federais que defendem a entrada de Bolsonaro no partido — Patriota e PMB também sinalizam interesse. Na cúpula nacional do antigo PRB, contudo, a ideia é rechaçada. Não há interesse em entregar para a família do presidente a gestão do fundo eleitoral do partido, que em 2018 movimentou R$ 67 milhões.

São comuns os momentos em que há clara divergência entre os estrategistas ligados a Crivella e o seu partido em Brasília. Recentemente, o presidente da legenda, Marcos Pereira, esteve no Rio e ficou irritado com o perfil de assessores de vários gabinetes de vereadores e deputados. A orientação de Pereira foi trocar por quadros mais qualificados assessores que ganharam postos apenas por serem de pessoas ligadas a igrejas.

A impopularidade do prefeito detectada em algumas pesquisas tem causado insatisfação na Universal. Um indício da fragilidade de Crivella diante do seu partido em Brasília foi exposto nos últimos meses. A deputada federal Rosangela Gomes (RJ) se recusou a assumir uma pasta no governo Witzel e impediu que o filho de Crivella, também Marcelo, assumisse a vaga de deputado em Brasília. Apesar dos obstáculos, o grupo ligado a Crivella acredita na ida ao segundo turno porque veem problemas nas campanhas dos possíveis rivais.

No campo da esquerda, o deputado federal Marcelo Freixo (PSOL) terá que enfrentar a deputada estadual Martha Rocha (PDT) e o deputado federal Alessandro Molon (PSB). Com relação ao ex-prefeito Eduardo Paes (DEM), os aliados de Crivella acreditam que ele continuará impactado pelo desgaste de ter sido do MDB dos ex-governadores Sérgio Cabral e Luiz Fernando Pezão, presos.