O Globo, n.31.624, 07/03/2020. País. p.14

Congresso tem de aprovar PEC para ter R$ 6 BI do orçamento
Manoel Ventura 

Naira Trindade
 

 

Apesar do acordo com o Executivo sobre o Orçamento impositivo manter nas mãos do Congresso R$ 19 bilhões, cerca de 30% desse valor só serão gastos se os próprios parlamentares aprovarem um projeto em tramitação no Senado. Trata-se da Proposta de Emenda à Constituição chamada de PEC Emergencial. Esse texto permite cortar 25% dos salários e da jornada de trabalho de servidores públicos durante o período de crise nas contas públicas, e foi enviada pelo Ministério da Economia ao Senado em novembro do ano passado.

O dinheiro que será economizado com salários será direcionado para investimentos já escolhidos pelos parlamentares. O Orçamento deste ano foi montado prevendo uma economia de R$ 6,1 bilhões com salários,por conta da PEC Emergencial. A maior parte desse valor, R$ 5,8 bilhões, está alocado nas despesas escolhidas pelo relator do Orçamento, o deputado Domingos Neto (PSD-CE).

O restante — R$ 251 milhões — está nas mãos do Poder Executivo. Estão nessa lista de gastos condicionados ações de desenvolvimento regional, mobilidade urbana, fomento ao setor agropecuário, infraestrutura turística, o programa

Minha Casa Minha Vida e assistência social, por exemplo. A maior parte está alocado no Ministério do Desenvolvimento Regional. A vinculação entre o gasto e a aprovação da PEC Emergencial foi feita pelo próprio relator do Orçamento, ainda no ano passado. A lei estabeleceu que, caso a PEC não seja aprovada, esse valor será recomposto para o pagamento dos salários. E os gastos do relator, serão cancelados. A lei não deu, por outro lado, prazo para

isso ocorrer. Em conversas internas, técnicos do Ministério da Educação já demonstraram preocupação com a medida. A equipe econômica também tomou um susto quando soube que o relator já havia vinculado uma economia ainda incerta a uma série de despesas. Mas viu na medida uma chance de fazer a PEC avançar no Congresso. Por enquanto, a proposta está na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. A PEC Emergencial faz

parte de um pacote de propostas do ministro da Economia, Paulo Guedes, para reequilibrar as contas públicas. Ela estabelece medidas para controlar os gastos obrigatórios, especialmente o corte proporcional de jornada e salário dos funcionários federais.

O problema do valor indicado pelo relator não é necessariamente de receita, mas de falta de espaço para gastar. Ou seja, não adiantará ao Congresso encontrar uma fonte de arrecadação para executar as despesas de relator, se não aprovar a PEC. Isso ocorre por conta do teto de gastos, regra que limitou o crescimento das despesas federais. O aumento dos gastos obrigatórios reduzem o espaço para as despesas com investimentos. Por isso, o governo defende a aprovação da PEC Emergencial.

O acordo sobre o Orçamento foi fechado nesta semana, após dias de tensão entre o Executivo e o Legislativo. O Congresso manteve um veto do presidente Jair Bolsonaro, mas pode ter o poder de indicar R$ 19 bilhões em despesas. Antes, eram R$ 30,1 bilhões. Três projetos que tratam desse assunto ainda precisarão ser votados pelos parlamentares.

PROJETOS ALTERADOS

O Congresso pode encerrar a primeira fase desse acordo na próxima semana com a votação da proposta. Na Comissão Mista de Orçamento, os projetos foram modificados pelo deputado federal Cacá Leão (PP-BA) para adaptações jurídicas, como definir a forma pela qual Domingos Neto fará a indicação de prioridades. A tendência é que membros da comissão analisem as mudanças do relator na terça-feira e, no mesmo dia, o tema seja levado ao plenário do Congresso.

Os partidos Podemos, Novo e até mesmo o PSL, ex-legenda de Bolsonaro, já avisaram ao líder do governo no Congresso, Eduardo Gomes (MDB-TO), que pretendem obstruir ao máximo a votação na comissão. O presidente do colegiado, Marcelo Castro (MDB-PI), porém, tem como encurtar os procedimentos. A expectativa de líderes do centrão é que a proposta seja aprovada já na próxima semana. Gomes defende que o assunto se encerre já na próxima semana para distensionar o clima político e poder focar no envio da reforma administrativa.

— Ninguém aguenta mais essa tensão. É preciso mudar a pauta —afirmou. A próxima semana antecede os atos contra Congresso Nacional e Supremo Tribunal Federal. Aliados de Rodrigo Maia (DEM-RJ) e Davi Alcolumbre (DEMAP) têm orientado os dois presidentes a manter a “cautela” para não acirrar os ânimos da população. Mesmo assim, a previsão de votar os projetos do acordo está mantida sob o argumento que o Executivo está satisfeito com a negociação.