O Estado de S. Paulo, n. 46867, 10/02/2022. Política, p. A11

‘Jantar dos derrotados’, diz Doria sobre ala contrária à candidatura

Lauriberto Pompeu
Adriana Ferraz
Carolina Ercolin
Haisem Abaki


 

A dissidência interna no PSDB ganhou contornos de guerra declarada. Ontem, o governador de São Paulo, João Doria, classificou o encontro ocorrido na noite anterior, em Brasília, entre representantes da ala tucana contrária à escolha de seu nome como pré-candidato à Presidência, como um "jantar de derrotados". Na reunião, líderes e parlamentares do PSDB debateram estratégias para evitar que a candidatura seja confirmada na convenção partidária – entre julho e agosto – caso o governador paulista não consiga crescer nas pesquisas de intenção de voto.

Segundo relatos de participantes ouvidos pelo Estadão, a ideia é ampliar o diálogo com o resto da legenda e, se o desempenho de Doria não melhorar nas pesquisas, até articular uma maioria para que o nome dele seja rejeitado na convenção partidária, que vai definir a posição oficial do partido na disputa presidencial.

A reunião em uma chácara localizada na fronteira do Distrito Federal com Goiás juntou o deputado Aécio Neves (MG), o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, o senador Tasso Jereissati (CE) e o ex-senador José Aníbal (SP). O anfitrião do jantar foi Pimenta da Veiga, ex-governador de Minas Gerais e expresidente do partido. Todos eles apoiaram Leite nas prévias que deram vitória a Doria. Tasso se apresentou à disputa interna, mas desistiu de formalizar sua candidatura e se uniu ao governador gaúcho.

"O PSDB é maior do que cinco pessoas", disse Doria em entrevista à Rádio Eldorado. "Foi um jantar de derrotados, com todo respeito. Todos eles foram derrotados nas prévias. Eu entendo que na vida pública, e também na vida privada, você tem que compreender vitórias e derrotas. Eu tive, circunstancialmente, uma vitória nas prévias do PSDB, mas tive a grandeza de cumprimentar o Eduardo Leite, e todos aqueles que o apoiaram, de maneira educada. Não me parece que cinco pessoas sentadas num jantar possam representar o PSDB", afirmou.

Desgaste. O encontro, contudo, gerou desconforto no Palácio dos Bandeirantes e entre aliados de Doria. Sobre a viabilidade da candidatura, o governador declarou que poderá se dedicar mais às eleições quando sair do cargo, em abril, e começar a viajar pelo País.

Após as prévias, Doria fez acenos para a ala que apoiou Leite. Com aval do governador paulista, a bancada do PSDB na Câmara elegeu Adolfo Viana (BA) como líder. O deputado endossou a candidatura de Leite no processo interno, mas agora trabalha para Doria. Outra tentativa de unir o partido foi escolher o presidente do PSDB, Bruno Araújo, como coordenador da campanha. Mas, mesmo tendo chegado ao comando da legenda apadrinhado por Doria, o dirigente mantém proximidade com Leite e Aécio.

A ofensiva da ala contrária à candidatura própria quer cobrar um plano que mostre que o projeto presidencial de Doria pode decolar. A ideia é levar o debate até o limite, no prazo para o partido registrar no Tribunal Superior Eleitoral a candidatura. Foi a primeira vez que o grupo se reuniu desde a derrota de Leite nas prévias.

'Rejeição'. "Mais que o baixo desempenho nas pesquisas, apesar da intensa exposição, especialmente pós-prévias, o que mais preocupa estes líderes do partido é a altíssima e persistente rejeição que o candidato escolhido tem no seu próprio Estado, a 45 dias de deixar o mandato", afirmou Leite ao Estadão.

Tasso e Aníbal têm defendido o nome da senadora Simone Tebet (MS), que é pré-candidata a presidente pelo MDB. O cearense chegou a debater o assunto com o ex-presidente Michel Temer (MDB) e com o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB). Tasso tem dito que Simone tem baixa rejeição e espaço para crescer.

Em outra frente, Leite foi sondado pelo presidente do PSD, Gilberto Kassab, para ser candidato ao Planalto pela sigla. Além disso, quadros históricos do partido, como Tasso e o ex-chanceler Aloysio Nunes Ferreira, têm sido procurados pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para conversas que constrangem o projeto eleitoral do paulista.

Preocupa ainda essa ala do PSDB a eleição para a Câmara, onde o partido perdeu espaço. Até 2018, a sigla costumava ficar entre as três maiores bancadas, sempre com mais de 50 deputados, mas hoje tem 32. A disputa pelo fundo eleitoral também afeta esse processo, como mostrou o Estadão.

Não lançar candidatura à Presidência significa liberar mais recursos para as eleições para deputado. /Lauriberto Pompeu, Adriana Ferraz, Carolina Ercolin e Haisem Abaki