O Estado de S. Paulo, n. 46138, 12/02/2020. Política, p. A8

Congresso cede e reduz valor de emendas
Daniel Weterman
Camila Turtelli
Julia Lindner
Idiana Tomazelli
Jussara Soares


 

Depois de ameaçar impor uma derrota ao presidente Jair Bolsonaro para controlar R$ 46 bilhões do Orçamento da União, neste ano eleitoral, o Congresso cedeu e fez um acordo com o Palácio do Planalto. Pelo acerto fechado ontem com os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), o governo voltará a ter autonomia sobre a aplicação de parte desse dinheiro.

Na prática, o acordo vai devolver ao Executivo a administração de R$ 11 bilhões das despesas discricionárias, que incluem investimentos e gastos com custeio da máquina pública. A verba havia sido “carimbada” pelos parlamentares para a execução de emendas e, se o Congresso não concordasse em voltar atrás, a equipe econômica não poderia bloquear os desembolsos, o que dificultaria o cumprimento da meta fiscal em eventual situação de perda de receitas.

As negociações para que Bolsonaro conseguisse retomar a autonomia no manejo dos recursos provocaram alívio no Planalto, principalmente para o ministro da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos, responsável pela articulação política. Agora, o governo enviará um novo projeto de lei com as modificações acertadas.

O Estado revelou que o Congresso brigava para ter o direito de comandar o destino de R$ 42,6 bilhões do Orçamento. Há três dias, porém, o sistema do Senado que monitora as emendas parlamentares foi atualizado e o valor subiu para R$ 46 bilhões.

Em sessão agendada para hoje, deputados e senadores devem derrubar apenas o veto de Bolsonaro ao dispositivo do projeto que obriga o governo a pagar as emendas do relator do Orçamento, que hoje é o deputado Domingos Neto (PSD-CE), conforme a ordem de prioridade estabelecida pelo Congresso. Após as negociações, Maia, Alcolumbre e líderes do Centrão concordaram em manter os vetos mais sensíveis à equipe econômica.

Ficarão de fora do projeto, por exemplo, o prazo de 90 dias para o governo garantir o pagamento das emendas e também a punição, caso o Executivo não cumpra o compromisso.

Com o acordo fechado ontem, porém, a fatia do Orçamento que será destinada a emendas de deputados e senadores cairá de R$ 46 bilhões para R$ 35 bilhões. As emendas são tradicionalmente usadas pelos parlamentares como moeda de troca em votações de interesse do Planalto. Ganham ainda mais importância em um ano eleitoral como este, de disputas municipais, já que os recursos são enviados para os redutos dos parlamentares.

‘Meio verdadeiro’. Mesmo após o acerto anunciado ontem, Maia manifestou descontentamento com o Planalto. “Tínhamos entendido que o discurso do governo, do ministro Paulo Guedes (Economia), de empoderar o Parlamento, era 100% verdadeiro. É meio verdadeiro. Para a gente não tem problema, nós não estamos nessa disputa”, afirmou o presidente da Câmara.

Na outra ponta, Alcolumbre disse que o resultado garante a obrigação do governo de destinar recursos para prioridades escolhidas pelo Legislativo. “O orçamento impositivo de fato assegura ao Congresso o poder de deliberar sobre o orçamento público, restabelecendo o que sempre foi direito do Parlamento”, argumentou Alcolumbre.

As reuniões a portas fechadas prosseguirão até a votação, prevista para hoje. “O Congresso não está cedendo nada. Estamos vivenciando a experiência do Orçamento Impositivo, que é nova. Todo mundo está com muita responsabilidade para que isso não crie nenhuma dificuldade orçamentária”, comentou o líder do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE)./ Daniel Weterman, Camila Turtelli, Julia Lindner, Idiana Tomazelli e Jussara Soares