Valor Econômico, n. 5244, 07/05/2021. Política, p. A8

 

Lira centraliza debate de projeto dos Correios

Raphael Di Cunto

Marcelo Ribeiro

07/05/2021

 

 

Quebra de monopólio enfrentava resistência nas comissões da Câmara dos Deputados

O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), centralizou os debates sobre o projeto de lei de quebra do monopólio dos Correios nos serviços postais, que abre espaço para a privatização da estatal, e decidiu retirar a proposta das comissões permanentes, onde o modelo sugerido pelo governo Bolsonaro enfrentava resistência.

O projeto foi enviado pelo governo em fevereiro. Lira quer votar o texto “entre julho e agosto” e, há duas semanas, a Câmara aprovou requerimento para que a proposta possa ser analisada direto no plenário. O pedido de urgência, porém, também faz com que os projetos tramitem em várias comissões ao mesmo tempo - o rito normal é debatê-los em um colegiado por vez.

A urgência fez com que o projeto fosse remetido na semana passada para a Comissão de Ciência e Tecnologia, comandada pela oposição. O presidente, deputado Aliel Machado (PSB-PR), indicou no mesmo dia o colega Gervásio Maia (PSB-PB) como relator no colegiado - responsável por negociar alterações e elaborar um parecer, que seria contrário à privatização.

A distribuição também levou o texto para as Comissões de Finanças e Tributação, que analisaria os impactos econômicos, e a de Constituição e Justiça, que verificaria a admissibilidade. Ambas são controladas por aliados do governo Bolsonaro, mas que ainda não tinham escolhido os relatores para a matéria.

Além disso, o texto já era debatido na Comissão de Desenvolvimento Econômico, presidida pelo deputado Otto Alencar Filho (PSD-BA), que é da base do governo, mas é crítico da ideia.

Alencar defende que os Correios se tornem uma empresa de economia mista, com capital aberto, como a Petrobras.

Lira determinou na segunda-feira que o projeto saísse desses colegiados e fosse para uma comissão especial, formada para tratar exclusivamente do assunto. Nesse caso, o presidente e relatores são escolhidos por ele - o responsável pela relatoria será o deputado Gil Cutrim (Republicanos-MA), que já estava indicado.

Cutrim disse que a exclusão das comissões permanentes visou “sintetizar o debate” e que a comissão especial não deve ser instalada. “Não mudou nada do que foi tratado comigo. Estou em conversa com os setores e vou emitir o parecer direto no plenário”, afirmou.

Para Otto Filho, a alteração “provavelmente foi uma estratégia para acelerar a quebra do monopólio”. A mudança causou reclamações na oposição. “Foi uma manobra para evitar o debate, a apresentação dos pareceres. Nosso parecer já estava pronto, seria contra a privatização. É lamentável”, disse Gervásio Maia.

Ao Valor, Lira disse que haverá muito tempo para debater a proposta até a votação no plenário, “em julho ou agosto”, e que a comissão especial será instalada. “Quando a Câmara aprova a urgência de um projeto, eu posso trazer para o plenário direto. O fato de mandar para as comissões é para acelerar, não para dificultar, e se tiver obstrução em qualquer comissão, posso mandar para uma comissão especial”, disse.