Título: Assistencialismo sobre rodas
Autor: Waleska Borges
Fonte: Jornal do Brasil, 28/03/2005, Rio, p. A13

Vereadores transportam doentes em ambulâncias de forma irregular e sobrecarregam hospitais de emergência

Ambulâncias e kombis têm sido usadas por vereadores e deputados para transportar, nem sempre de maneira correta, doentes para hospitais. Enquanto o Sistema de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) não sai do papel, os parlamentares se dedicam ao assistencialismo com a ajuda de patrocinadores e recursos próprios. Em muitos casos, os veículos não estão adequadamente equipados, alertam representantes da classe médica, que afirmam ainda que a falta de triagem destes serviços superlota as unidades hospitalares e compromete o atendimento.

O presidente do Conselho Distrital de Saúde da Zona Oeste, Adelson Alípio, preocupa-se com a proliferação das ambulâncias sociais. Na maioria dos casos, os veículos são disponibilizados nos centros sociais dos parlamentares, que têm seus nomes estampados nas ambulâncias improvisadas. Segundo Alípio, sem equipamentos e profissionais treinados, há risco no transporte do paciente:

- O assistencialismo por parte dos parlamentares através destes veículos clandestinos mostra a fraqueza do poder público.

O presidente do Sindicato dos Médicos do Rio de Janeiro (SinMed), Jorge Darze, acredita que o transporte sem qualquer avaliação prévia contribui para o congestionamento do sistema de saúde.

- Os parlamentares são eleitos para legislar e apresentar projetos para que as pessoas não precisem desse tipo de atendimento. Além disso, esses veículos viram outdoors circulantes - enfatiza Darze.

O médico Aloísio Tibiriçá, coordenador de saúde pública do Conselhor Regional de Medicina do Rio de Janeiro (Cremerj), diz que é comum a remoção de pacientes em veículos de deputados e vereadores:

- Em geral, estes veículos são praticamente clandestinos e não fazem parte do registro oficial de ambulâncias na Vigilância Sanitária Estadual.

O coronel Marcelo Domingues Canetti, comandante do Grupamento de Socorro de Emergência (GSE) - unidade especializada do Corpo de Bombeiros - explica que os serviços de transportes de urgência e emergência têm de cumprir as normas regulamentadas pela portaria 2048, de novembro de 2002, do Ministério da Saúde, por exemplo cadastrando o veículo junto aos Sistema Único de Saúde (SUS).

Os vereadores não se constrangem com o trabalho de assistencialismo. De acordo com levantamento do Conselho Municipal de Saúde, pelo menos 15 deles têm ambulâncias no Rio. Segundo o vereador Jorge Babu (sem partido), ele tem três ambulâncias para prestar ajuda à população. Por dia, são atendidas cerca de 10 pessoas.

- Se não houvesse este socorro, as pessoas acabariam morrendo. Mantemos este serviço com sacrifício, muitas vezes, compramos gasolina com dinheiro do próprio bolso - argumenta Babu informando que os condutores dos veículos têm curso de primeiros socorros.

O vereador Chiquinho Brazão (PMDB) conta que, junto ao deputado Domingos Brazão (PMDB), tem oito ambulâncias para atender moradores de Jacarepaguá, Bento Ribeiro e São João de Meriti. Ele diz que a crise na saúde aumentou a procura pelo serviço.

- Na ausência do poder público, alguém tem que atuar. O problema existe e as pessoas precisam ser removidas. Se não tivesse a ambulância, elas iriam de trem, caminhão ou ônibus - defende o vereador, enfatizando que não exige o título de eleitor para prestar o serviço.

Em Campo Grande, o centro social da vereadora Lúcia Helena Pinto, a Lucinha, (PSDB), fica a menos de 50 metros do Hospital Rocha Faria. Segundo moradores do bairro, ela presta ajuda à população com ambulâncias. A vereadora não foi encontrada pelo JB.

O vereador Marcelino D'Almeida (PFL) tem um centro médico em Realengo. O local presta atendimentos de clínica geral e fisioterapia, principalmente para pessoas idosas.

- A população cresce e está cada vez mais humilde. Não podemos brincar com a vida das pessoas - diz Marcelino.

Apesar das informações dos vereadores, o prefeito Cesar Maia declarou não conhecer parlamentares com ambulâncias no Rio. ''Na Baixada há muitos'', acrescentou.

- Este é um problema superado, pois o Ministério da Saúde assumiu um programa que criou - argumentou o prefeito.