O Globo, n. 32023, 10/04/2021, Economia, p. 15

 

Legislativo pressiona TCU para que órgão fique fora da disputa

Geralda Doca

10/04/2021

 

 

Na batalha com o governo em torno do Orçamento, a cúpula do Congresso vem pressionando ministros do Tribunal de Contas da União (TCU) para que a Corte não entre na disputa neste momento e impeça o presidente Jair Bolsonaro de sancionar o projeto. O argumento é que órgão tem função de assessorar o Legislativo.

Pelo menos dois ministros dos nove que compõem o tribunal defendem a tese de que a sanção de Bolsonaro não implica crime de responsabilidade fiscal, o que poderia abrir espaço para que o presidente sofra um processo de impeachment. O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), tem feito interlocução com pelo menos quatro ministros: Bruno Dantas, Augusto Nardes, Vital do Rêgo e Aroldo Cedraz. Lira já disse que não vê erro técnico no texto aprovado pelo Congresso. Apesar dos argumentos em defesa do projeto, o ministro Jorge Oliveira, que até dezembro era ministro-chefe da Secretaria-Geral do Governo e orientava o presidente em relação a vetos, tem tido uma posição cautelosa sobre os riscos para Bolsonaro, de olho na reeleição. Oliveira, segundo uma fonte, tem mantido conversas com o Planalto e com a equipe econômica. Uma das questões levantadas é que as contas do presidente serão julgadas em junho de 2022, a poucos meses das eleições e, até lá, o ambiente político e econômico poderá ser alterado. Haverá tempo suficiente para mensurar erros que eventualmente forem cometidos agora, como, por exemplo, se o Orçamento aprovado pelo Congresso obrigar um contingenciamento que resulte na paralisação da máquina pública e na falta de dinheiro para pagar salários e benefícios ou para comprar vacinas contra a Covid-19. De acordo com a fonte, ao vetar o Orçamento, Bolsonaro se livraria do "garrote do Congresso", já que ninguém sabe como a situação política estará em junho do ano que vem e uma reprovação de contas pode afetar os rumos de um eventual processo de impeachment e as condições de o presidente se reeleger.

CRISE LONGE DO FIM

Esse interlocutor lembra que, quando o Tribunal começou a julgar as contas da ex-presidente Dilma Rousseff, seis ministros eram a favor da rejeição e, no final, todos votaram contra ela. O parecer inconclusivo da área técnica do TCU, divulgado na terça-feira, com pedido de informações adicionais ao Ministério da Economia e à Casa Civil, é uma mostra de que a conclusão dos trabalhos vai demorar. Além disso, a presidente do TCU, ministra Ana Arraes, decidiu que o ministro Aroldo Cedraz, relator das contas do presidente em 2021, é quem vai relatar o processo, que ainda será aberto. Na representação encaminhada por grupos de parlamentares para que o TCU se posicione sobre a questão, eles pediram que processo fosse direcionado a Bruno Dantas, que relatou as contas públicas em 2020 e ainda tem processos sob análise. Um dos principais problemas apontados é que as despesas obrigatórias do governo foram subestimadas no texto final do Orçamento de 2021. Para engordar as emendas parlamentares, deputados e senadores cortaram as despesas obrigatórias em R$ 26,4 bilhões.