O globo, n. 31769, 30/07/2020. País, p. 8

 

Trava de 8 anos

Bruno Góes

André de Souza

30/07/2020

 

 

Toffoli quer quarentena maior para juízes nas eleições e tem apoio de Maia

 O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), ministro Dias Toffoli, sugeriu ontem que juízes e integrantes do Ministério Público só possam disputar uma eleição pelo menos oito anos depois de deixarem o cargo, e pediu que o Congresso aprove uma lei nesse sentido. Em resposta, o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), prometeu pautar “em breve” a proposta.

Hoje, é preciso esperar seis meses para ser candidato. A proposta em discussão na Câmara só valeria para casos futuros. Assim, caso aprovada, não impediria por exemplo, a eventual candidatura presidencial do ex-juiz Sergio Moro em 2022. Ele deixou o cargo em 2018 para se tornar ministro da Justiça a convite do então presidente eleito Jair Bolsonaro.

Na Câmara, sempre houve apoio de líderes de centro em torno de uma proposta de quarentena para juízes que deixem a carreira para disputar eleições.

— É um assunto que tem que ser analisado com toda a cautela — diz Carlos Sampaio (SP), líder do PSDB na Câmara.

—Existe uma preocupação concreta de alguns parlamentares de que se use a carreira como trampolim para uma candidatura e isso deve ser objeto de reflexão. O importante é que qualquer medida seja para frente, e não para trás, para não parecer que é algo direcionado a alguém.

Em sessão do CNJ que discutia o caso de um juiz que participava de “lives” político-partidárias, Toffoli destacou que os juízes têm que observar limites constitucionais, legais e éticos de modo a preservar sua imparcialidade. Ele afirmou que já vem defendendo a ideia de fixar um prazo maior de inelegibilidade há algum tempo.

— Quem quer ser candidato, seja como magistrado, seja como membro do Ministério Público, tem que deixar a magistratura, tem que deixar o Ministério Público. E há que haver um período de inelegibilidade, sim —declarou Toffoli.

O presidente do STF demonstrou preocupação com os reflexos de candidaturas de ex-magistrados na respeitabilidade e imparcialidade do Judiciário. E, sem mencionar nomes, disse que há magistrado que, incensado pela imprensa, já pensa em candidatura a presidente.

—Volto a pedir ao Congresso Nacional: estabeleçam prazos de inelegibilidade para membros da magistratura e do Ministério Público que deixarem suas carreiras para que não possam, magistrados e membros do Ministério Público, fazer dos seus cargos e das suas altas e nobres funções meios de proselitismo e demagogia.

Provocado a falar sobre o assunto após a fala de Toffoli, Rodrigo Maia afirmou:

— O presidente Toffoli está correto. Já existem projetos tramitando na Casa e essa matéria está sendo amadurecida e está muito perto de se chegar a um entendimento, que as carreiras não podem ser utilizadas como trampolim. A estrutura do Estado não pode ser utilizada como trampolim pessoal.

O presidente da Câmara afirmou que a postura de Toffoli pode acelerar a tramitação da matéria:

— Muita gente queria votar no primeiro trimestre, mas a pandemia acabou atrasando. Estava na ordem do dia, mas certamente com a posição do presidente do Supremo a pauta é refeita.

PRAZO EM DISCUSSÃO

O período proposto por Toffoli, de oito anos, também será levado em consideração, segundo Maia. Para ele, “o parlamento deve ouvir” o ministro. No início do ano, deputados quase votaram uma proposta que limita a prerrogativa de magistrados e integrantes do Ministério Público.

De autoria do deputado Fábio Trad (PSD-MS), o projeto cria uma quarentena de seis anos e vale também para o registro de candidaturas de integrantes das Forças Armadas e das Polícias Militares. A proposta ganhou força após o motim de policiais no Ceará, antes da epidemia do novo coronavírus chegar ao Brasil. Trad avalia, no entanto, que o prazo de oito anos é muito longo.

—Acho que oito anos já é uma punição. Até porque temos que lembrar que o prazo da Ficha Limpa é inabilitação de oito anos. Então, eu coloquei seis anos — defende o deputado, que esclarece que o prazo só valerá para quem se fastar do cargo depois da provação da lei:

— Quando começou o debate se valia para o Moro, ou não valia, eu deixei claro: não retroage. É daqui para a frente.

O presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), Eduardo André Brandão, avaliou que o prazo de oito anos é excessivo, mas concordou com um período de inelegibilidade maior do que o que existe atualmente, de seis meses.

— A Ajufe sempre se posicionou contra qualquer proposta para juízes se candidatarem a cargos eletivos. Porém, depois que ele sai da magistratura por aposentadoria ou exoneração, o prazo de oito anos proposto parece exagerado. Lembrando que hoje já existe uma quarentena de três anos para o juiz que deixa o cargo, aposentado ou exonerado, atuar nos tribunais de origem —disse Brandão.