O globo, n.31705, 27/05/2020. País, p. 4 e 5

 

Alvo

Chico Otavio

Juliana Castro

Juliana Dal Piva

Vera Araújo

27/05/2020

 

 

 Recorte capturado

Um ano e sete meses depois de ser eleito com a bandeira do combate à corrupção e o apoio da família Bolsonaro, o governador do Rio, Wilson Witzel, virou um dos alvos de uma operação da Polícia Federal, a partir de duas investigações conduzidas pela força-tarefa da Lava-Jato no Rio e pelo Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ). Agentes cumpriram mandados de busca e apreensão em 12 endereços, incluindo o Palácio Laranjeiras e a casa na qual ele morou, no Grajaú. O principal objetivo era o recolhimento de supostas provas do envolvimento de Witzel e sua mulher, Helena, em fraudes relacionadas a contratos emergenciais para o combate à pandemia do coronavírus no estado.

O governador reagiu: disse que a chamada Operação Placebo deixou claro o aparelhamento político da Polícia Federal pelo presidente Jair Bolsonaro, a quem chamou de “fascista” e “tirano”. Este, por sua vez, sorriu quando foi perguntado sobre o assunto e parabenizou a PF.

Em sua decisão, o ministro Benedito Gonçalves, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), afirmou: “após narrativa das condutas dos investigados e das empresas contratadas, já dispostas no referido inquérito, o MPF imputa indícios de participação ativado governador do estado quanto ao conhecimento e ao comando das contratações realizadas com as empresas ora investigadas, mesmo sem ter assinado diretamente os documentos, vez que sempre divulgou todas as medidas em sua conta no Twitter”.

De acordo com as investigações, interceptações telefônicas apontam alterações contratuais nas empresas que teriam como intuito ocultar a movimentação dos recursos públicos recebidos e que há “prova robusta” de fraudes nos processos que levaram à contratação do Instituto de Atenção Básica e Avançada à Saúde (Iabas) para gerir os hospitais de campanha “tudo com a anuência e comando da cúpula do Executivo. Para o MP, Witzel “mantinha o comando das ações”. Em sua decisão, Gonçalves afirma que as provas nos autos lhe deram “convicção quanto a indícios veementes de autoria e materialidade”,para justificar a concessão das buscas.

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Agentes apreendem computadores e celulares do governador 

27/05/2020

 

 

Durante o cumprimento dos mandados de busca e apreensão, a Polícia Federal esteve no Palácio Laranjeiras, residência oficial do governador do Rio, de onde levou computadores e celulares de Witzel. Os agentes também foram à casa onde ele morava com a família, no Grajaú. No endereço, funciona, segundo a Polícia Federal, o escritório de advocacia comandado pela primeira-dama.

Os mandados tiveram por base duas investigações, conduzidas pela força-tarefa da Lava-Jato no Rio e pelo Ministério Público estadual. Ambas relacionam o nome de Witzel a empresários e gestores envolvidos em desvios de recursos destinados ao combate à Covid-19. Um dos indícios foi obtido por promotores estaduais ao ouvirem, durante seis horas, na semana retrasada, o depoimento do ex-subsecretário estadual de Saúde Gabriell Neves, que se encontra preso na Penitenciária José Frederico Marques, em Benfica.

Um outro indício que motivou as buscas e apreensões realizadas ontem foi uma prova arrecadada nas investigações da Operação Favorito, realizada pela força-tarefa da Lava-Jato há duas semanas. Mantida sob sigilo, ela ligaria o governador ao empresário Mário Peixoto, acusado de montar um esquema com cem pessoas físicas e jurídicas para fraudar contratos na área de saúde.

Em nota, Witzel negou qualquer tipo de envolvimento no esquema de desvios de recursos públicos destinados ao atendimento do estado de emergência na saúde pública.

O advogado Alexandre Lopes, que representa o empresário Mário Peixoto, preso desde o último dia 14, afirmou que o seu cliente não tem irregularidades nos contratos firmados com o governo do estado. Ele negou qualquer vinculação de Peixoto com a empresa que tem contrato com a primeira-dama. “A empresa foi constituída por Alessandro Duarte e possui atividade própria e autônoma”, frisou.

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MPF vê vínculo suspeito entre primeira-dama e empresas investigadas 

Chico Otávio 

Luiz Ernesto Magalhães

Juliana Castro 

Juliana Dal Piva

27/05/2020

 

 

Um contrato entre o escritório de advocacia da primeira-dama do estado, Helena Witzel, e a empresa DPAD Serviços Diagnósticos Limitada levou o ministro Benedito Gonçalves, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a expedir os 12 mandados de busca e apreensão da Operação Placebo. A DPAD tem entre seus sócios Alessandro de Araújo Duarte, apontado como operador do empresário Mário Peixoto. Na decisão do ministro, também são citados depósitos feitos pela empresa em nome da mulher do governador.

Um documento que liga Helena a Duarte, preso no último dia 14 com Peixoto, foi encontrado há duas semanas, durante apreensões realizadas pela Operação Favorito, etapa da Lava-Jato que apura desvios em contratos na área da saúde envolvendo organizações sociais.

O Ministério Público Federal (MPF) informou ao STJ que as provas obtidas demonstram“vínculo bastante estreito e suspeito entre a primeira-dama do estado e as empresas de interesse de M.P. (Mário Peixoto), em especial o contrato de prestação de serviços e honorários advocatícios entre seu escritório de advocacia e a empresa DPAD Serviços Diagnósticos LTDA, bem como comprovantes de transferência de recursos entre as duas empresas”.

O MPF relatou ainda mensagens encontradas pela Polícia Federal em que são mencionados pagamentos a Helena Witzel. Segundo os investigadores, foram achados no e-mail de Alessandro Duarte mensagens do dia 14 de abril de 2020 com “documentos relacionados a pagamentos para a esposa do governador.”

MÃO DE OBRA TERCEIRIZADA

Na investigação contra o esquema de corrupção montado pelo ex-governador Sérgio Cabral, o mesmo MPF encontrou provas de que o escritório de advocacia da ex-primeira-dama Adriana Ancelmo era usado nas operações de lavagem de dinheiro da quadrilha comandada por ele. Adriana chegou a ser condenada a 18 anos de prisão por participação no esquema.

De acordo com o site da Receita Federal, os sócios controladores da DPAD são Alessandro de Araújo Duarte e Juan Elias Neves de Paula.

Alessandro também é um dos donos da Rio de Janeiro Serviços e Comércio Ltda., empresa que, segundo as investigações, tem vínculos com Peixoto e mantém contrato com a Fundação Estadual de Saúde no valor de R$ 27 milhões para fornecer mão de obra terceirizada a hospitais.

E-mails encontrados na caixa de mensagens de Juan Elias mostram ainda que ele teve acesso a planilhas que detalham os custos de montagem dos hospitais de campanha para atendimento às vítimas do coronavírus pelo Instituto Iabas, que administra as unidades graças a um contrato de R$ 836 milhões. A suspeita é que a suposta organização criminosa de Peixoto possa estar expandindo sua influência para contratos da organização social.

Em nota, o escritório da primeira-dama, o HW Assessoria Jurídica, alegou que “a diligência (feita no escritório) nada encontrou que pudesse comprovar alegações de seus requerentes e afirmou que “prestou serviços para a empresa apontada pelo MPF, tendo recebido honorários, emitido nota fiscal e declarado regularmente os valores na declaração de imposto de renda do escritório”. O escritório, no entanto, não explicou quais foram os serviços. Por fim, informou que Helena Witzel “lamenta que a operação tenha sido imbuída de indisfarçada motivação política”.

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Helena exerce influência nos corredores do Guanabara 

Ludmilla de Lima

27/05/2020

 

 

Assim como o marido, Helena Witzel tem fama de durona. E esse jeito, reconhecido pelas pessoas mais próximas, ela levou para o Palácio Guanabara, onde o governador, ao tomar posse, lhe deu um gabinete ao lado do seu, antes destinado à Casa Civil. Quem convive com os dois não nega a influência da primeira-dama sobre as decisões de Witzel, que, nas suas agendas, tem o hábito de elogiar a mulher publicamente. Apesar de presença quase que constante no palácio e ao lado do ex-juiz federal, Helena tem uma atuação discreta fora dos bastidores: uma vez, em conversa informal na presença de jornalistas, ela manifestou que quem tem que “brilhar” é o marido.

Ela não dá entrevistas e, nas redes sociais, aparece mais em ações do Rio Solidário, do qual é presidente de honra. No dia 16 de abril, Helena completou 39 anos. Mãe de três filhos com o governador, ela foi aluna do ex-juiz na faculdade, em Vila Velha, no Espírito Santo.

Ela divide com Witzel o discurso “linha dura”.

—Essas denúncias são uma triste surpresa — afirma uma pessoa que convive com Helena há anos.

—Ela sempre se colocou como durona, até mais que o marido. Casada com Witzel, não poderia ser diferente.

De Bonsucesso,vascaína e fã de carnaval, Helena também é desconfiada. Ela e Witzel são vistos no palácio como um casal “fechado”. Um funcionário antigo do Guanabara disse ao GLOBO no ano passado:

— A sensação é que não elegemos um governador, mas, sim, um casal.