Título: Regras mais flexíveis para a Esplanada
Autor: Rodrigues, Gizella
Fonte: Correio Braziliense, 05/12/2012, Cidades, p. 21

O Plano de Preservação do Conjunto Urbanístico de Brasília, em tramitação na Câmara Legislativa, divide a região central em seis áreas e permite a ocupação de três delas. A norma prevê a exploração do espaço em quatro datas comemorativas

Apesar de o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) no DF querer proibir a realização de festas no gramado central da Esplanada dos Ministérios, tramita na Câmara Legislativa uma proposta menos rigorosa para a ocupação do cartão-postal de Brasília com palcos e tendas. O Plano de Preservação do Conjunto Urbanístico de Brasília (PPCUB), enviado em setembro pela Secretaria de Habitação, Regularização e Desenvolvimento Urbano (Sedhab) para a análise dos deputados distritais, libera três pontos entre a Rodoviária do Plano Piloto e o Congresso Nacional para a realização de espetáculos cívicos, políticos, esportivos, culturais ou religiosos.

De acordo com o PPCUB, a Praça dos Três Poderes, o gramado em frente ao Congresso e o espaço em frente ao terminal de Brasília estão protegidos e não admitem, em hipótese alguma, ocupações de qualquer tipo. Corridas, caminhadas, passeatas e procissões que não necessitem da montagem de estruturas podem ocorrer em toda a Esplanada dos Ministérios. Além disso, o projeto elaborado pelo GDF inclui uma data para a realização de grandes eventos na Esplanada não prevista pelo Iphan: 1º de maio — para o órgão de proteção ao patrimônio, o local estaria liberado apenas em 21 de abril, em 7 de setembro, no Natal e no ano-novo.

O secretário de Habitação, Geraldo Magela, argumenta que as estruturas provisórias não podem interferir na visibilidade do conjunto urbanístico e arquitetônico da Esplanada dos Ministérios. Segundo ele, o governo estipulará prazo para elas ficarem montadas. “É para ser provisório mesmo, montada em um dia e tirada no outro. Vamos estabelecer um limite de tempo para a ocupação. Não será dada autorização para um circo ficar quatro meses”, garante.

Com as novas regras, acrescenta Magela, o governo quer criar o hábito de eventos culturais e religiosos em outras áreas, como o entorno do Estádio Nacional de Brasília Mané Garrincha, o Centro de Convenções, a Torre de TV ou o Parque da Cidade. “Todas essas áreas são perto da Rodoviária, não queremos perder a noção de centro da cidade. A Esplanada dos Ministérios deve ser valorizada como uma área turística a ser visitada”, afirma.

O superintendente regional do Iphan, José Leme Galvão, não quis comentar as regras estipuladas pelo PPCUB, porém admite negociar com o GDF antes de editar uma portaria proibindo a ocupação da Esplanada dos Ministérios por eventos como a Bienal do Livro, o Dia de Nossa Senhora Aparecida, o Dia do Evangélico e competições de motocross e de vôlei de praia. “Não quero fazer um ofício unilateralmente. Não adianta fazer restrições que não serão cumpridas pelo GDF. O ideal seria fazer normas de comum acordo”, afirmou. Segundo ele, o Iphan pediu que o governo retire o regime de urgência do PPCUB para que a proposta seja discutida com mais tranquilidade.

Para saber mais

Proteção nacional

Brasília é protegida por três instâncias: a local, a nacional e a mundial. Em 14 de outubro de 1987, o Governo do Distrito Federal publicou o decreto que tombou Brasília em nível distrital. O decreto foi elaborado pelo arquiteto Ítalo Campofiorito a pedido do então governador do DF, José Aparecido, e acabou sendo usado como argumento para reivindicar o título de Patrimônio Cultural da Humanidade, concedido pela Unesco dois meses depois. A Unesco, no entanto, exigiu que Brasília também fosse protegida nacionalmente, o que foi feito pelo Iphan em 14 de março de 1990. A Portaria nº 314, de 8 de outubro de 1992, delimitou a área tombada da capital a leste pela orla do Lago Paranoá; a oeste pela Estrada Parque Indústria e Abastecimento (Epia); ao sul pelo Córrego Vicente Pires; e ao norte pelo Córrego Bananal.

Conflito de competência

Fontes ligadas ao GDF contaram ao Correio que as declarações de José Leme Galvão causaram um mal-estar. Para o governo, por exemplo, o Iphan editar uma portaria sobre o assunto seria conflito de competência. O governador Agnelo Queiroz esteve com a presidente nacional do Iphan, Jurema Machado, e a ministra da Cultura, Marta Suplicy, e combinou com elas que as decisões sobre a área tombada seriam tomadas em conjunto entre o órgão federal e o GDF.

A ocupação do canteiro central da Esplanada é um dos 10 pontos do PPCUB que ferem o tombamento de Brasília, segundo o Ministério Público do DF e Territórios. Parecer assinado pela arquiteta Vera Ramos, assistente técnica da Promotoria de Defesa da Ordem Urbanística (Prourb), aponta que, ao permitir manifestações de cunho cívico, político, esportivo, cultural e religioso com montagem de estruturas provisórias no Eixo Monumental, o PPCUB “não altera a situação atual e continua prejudicando a visibilidade do Congresso Nacional e dos demais prédios da Esplanada dos Ministérios”.

Três perguntas para José Carlos Coutinho, arquiteto e professor da UnB

O senhor acha que o tombamento protege Brasília? A preservação deixa a desejar. Estamos, hoje, vivendo as glórias do tombamento e esquecendo o principal, que é conservar o patrimônio. Tanto que já vieram três comissões da Unesco para fiscalizar a preservação de Brasília e há um temor muito grande que a cidade perca o título de Patrimônio Cultural da Humanidade. Durante a visita deste ano, houve uma polêmica muito grande e o receio de que a Unesco não confirmasse o título. Temos que lutar em vez de festejar.

Na sua opinião, o título está em risco? Não. Acho que Brasília ainda justifica a condição de patrimônio. Mas é preciso abrir os olhos com as agressões ao Plano Piloto, responsável por dar o título a Brasília. As agressões são grandes, muitas delas provocadas por políticos, em especial os da Câmara Legislativa, que aprovam, ano após ano, leis que descaracterizam a cidade. Também é preciso ampliar a área tombada, não faz sentido ir até uma ponta do lago e à outra, não. A destruição da área tombada é causada pela falta de normas que podem disciplinar o crescimento da área externa do Plano Piloto.

Qual é a opinião do senhor sobre a proibição de montagem de estruturas provisórias no gramado central da Esplanada dos Ministérios? Há uma série de tentativas de desconfigurar o Plano Piloto e o desrespeito à área tombada. Ainda bem que o Iphan vai tomar essa medida. É preciso urgentemente estancar a destruição do Plano Piloto antes que algumas ocupações se tornem irreversíveis, como os puxadinhos. Estão montando no Museu Nacional uma estrutura para a Cúpula das Américas que vai acontecer na semana que vem. Há poucos dias, montaram um palco para as comemorações do Dia do Evangélico. É um absurdo. Esse é um espaço nobre, há outros locais para isso. Essas estruturas comprometem a dignidade da Esplanada. Imagine montarem um circo na área cívica da capital. É uma total falta de respeito.Mariana Raphael/Esp. CB/D.A Press - 3/12/12 Tendas de evento realizado na última sexta-feira atrapalham a visão na Esplanada dos Ministérios: polêmica na ocupação da área central