O globo, n. 31669, 21/04/2020. Economia, p. 22

 

Caso Flávio: ministro do STJ vê indício de crimes

Chico Otavio

Juliana Dal Piva

21/04/2020

 

 

Ao negar recurso, relator no Superior Tribunal de Justiça sobre ‘rachadinhas’ envolvendo filho do presidente afirma que quebra de sigilo foi autorizada em duas decisões judiciais ‘devidamente fundamentadas’

 Ao recusar recurso do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), o ministro Felix Fischer, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), afirmou, em decisão obtida pelo GLOBO, que a quebra do sigilo fiscal e bancário do filho mais velho do presidente Jair Bolsonaro foi autorizada “em decisões judiciais devidamente fundamentadas” e ainda “no amparo de fortes indícios de materialidade e autoria de crimes”. Na última sexta-feira, Fischer rejeitou o pedido da defesa de Flávio, que pretendia parar a investigação sobre peculato e lavagem de dinheiro em seu antigo gabinete na Alerj.

“Ao contrário do que o recorrente informa, que a investigação tenha acontecido em face de pessoa politicamente exposta, com vazamento de seus dados fiscais e bancários por cerca de dez anos, fato é que, conforme consignado nos presentes autos, a quebra de sigilo foi autorizada em duas decisões judiciais devidamente fundamentadas (no amparo em fortes indícios de materialidade e autoria de crimes; na suposta formação de grande associação criminosa, com alto grau de permanência e estabilidade na Alerj; e, como se não bastasse, na imprescindibilidade da medida)”, escreveu o ministro, relator do caso no STJ.

O pedido da defesa do senador foi feito no início do mês passado. Os advogados do senador apresentaram recurso à Corte depois que seus pedidos junto à 3ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio tinham sido negados.

O recurso na Corte foi a 9ª vez que a defesa de Flávio tentou paralisar as investigações, desde janeiro do ano passado. O senador argumenta que ocorreu quebra de sigilo fiscal e bancário na comunicação feita pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf ) sobre suas movimentações atípicas.

Os relatórios de inteligência financeira, que instruíram a primeira fase das investigações, revelaram movimentações atípicas de recursos no gabinete de Flávio, na época em que era deputado estadual no Rio. O primeiro mostrou a movimentação atípica de R$ 1,2 milhão do ex-assessor Fabrício Queiroz — o documento abriu as investigações. Depois, por meio de outro relatório, ficou conhecido que o senador fez 48 depósitos de R$ 2 mil totalizando R$ 96 mil ao longo de cinco dias em junho de 2017. Esse relatório é um dos que a defesa alega ter havido quebra de sigilo bancário sem autorização judicial. Em abril de 2019, o TJ do Rio autorizou a quebra de sigilo fiscal e bancário de Flávio e outras 95 pessoas e empresas.

Um dos argumentos da defesa de Flávio é que teriam ocorrido comunicações informais entre MP-RJ e o Coaf para obter relatórios. A afirmação foi rejeitada por Fischer: “No que tange especificamente à suposta ausência de formalidade nas comunicações entre o d. Ministério Público e o Coaf, o v. acórdão recorrido também foi expresso ao confirmar as alegações ministeriais de que a troca de e-mail não ultrapassou o próprio âmbito do Ministério Público e de que as comunicações entre este e o Coaf respeitaram o decidido pelo col. Supremo Tribunal Federal”.

Outro ponto levado pela defesa ao STJ é que as informações no relatório do Coaf seriam minuciosas demais e teriam constituído uma “devassa” nas contas do senador. Fischer concordou com o que foi decidido pelo TJ-RJ e citou trecho da decisão da 3ª Câmara Criminal do Rio.

“O acórdão rechaçou a tese defensiva coma simples exposição docas o concreto :‘ Ao contrário do que diz a Impetrante, não houve qualquer devassa indiscriminada na conta do ora Paciente, cuja análise se limitou ao período e 2017 e 2018, quando exercia o mandato de Deputado Estadual; não há a indicação de quem seriam os depositantes do referido numerário, nem muito menos, de maneira geral, para quem o Paciente teria feito as transferências”, escreveu.

Fischerdis se ainda que a defesa não apresentou provas da “devassa” e destacou não ter observado nos autos “abuso de poder” ou “ilegalidade flagrante.” Na última sexta-feira, o advogado Frederick Wassef, que atua na defesa de Flávio, disseque“a defesa nunca tentou impedira investigação das chamadas “rachadinha” apenas age contra irregularidades praticadas no processo.