Valor econômico, v.19, n.4732, 17/04/2019. Política, p. A10

 

Impeachment de Crivella antecipa sucessão

Cristian Klein

17/04/2019

 

 

A possibilidade do impeachment do prefeito Marcelo Crivella (PRB) está antecipando em um ano os movimentos no tabuleiro da sucessão municipal no Rio. Sem a presença de um substituto imediato - o vice-prefeito Fernando Mac Dowell morreu no ano passado - a cidade pode viver uma eleição fora de época no segundo semestre, caso o impeachment seja aprovado pela Câmara Municipal, o que é a tendência no momento. Do Psol de Marcelo Freixo ao PSL bolsonarista; do religioso e histriônico Cabo Daciolo ao deputado federal Alessandro Molon (PSB); do ex-prefeito Eduardo Paes (DEM) ao juiz federal Marcelo Bretas, já se vislumbra uma largada de pré-candidatos.

O clima de polarização que elegeu Crivella em 2016 - num laboratório da corrida presidencial que culminou na vitória de Jair Bolsonaro - pode se repetir, embora articulações ao centro estejam sendo feitas. Pela esquerda, o Psol é a força mais expressiva e tem como nomes o deputado federal Marcelo Freixo - derrotado no segundo turno por Crivella - e o vereador Tarcísio Motta. Pela direita, as apostas recaem sobre o PSL, embalado pela onda bolsonarista, ainda vista como capaz de fazer a cabeça dos eleitores. O deputado estadual Rodrigo Amorim - que quebrou a placa de rua em homenagem à vereadora assassinada Marielle Franco (Psol) - é apontado como o pré-candidato do grupo político de Bolsonaro.

A disputa pela Prefeitura do Rio - antecipada ou não - terá como característica ser um teste de força para o bolsonarismo em seu ninho eleitoral. Não se sabe até que ponto o presidente da República vai se engajar na campanha para eleger o seu candidato. Na disputa ao Palácio Guanabara, o clã Bolsonaro apoiou o atual governador Wilson Witzel (PSC) apenas na reta final, com a associação à candidatura ao Senado de Flávio Bolsonaro e também à de Arolde de Oliveira (PSD), impulsionado pelo voto evangélico.

Personagem influente sobre o eleitorado que é reduto de Crivella, o pastor Silas Malafaia, líder da igreja Assembleia de Deus Vitória em Cristo, vê na volta do ex-prefeito Eduardo Paes (DEM) uma alternativa para a sucessão. "Acho que o cara - que se não tiver nenhum peso de Lava-Jato, de condenações - ainda acho que [é] o Eduardo Paes... Se não tiver [condenação]. Se tiver, tchau. É um administrador, um cara competente", defende.

Derrotado por Witzel no ano passado - quando adversários fizeram questão de grudar sua imagem à do ex-governador Sergio Cabral, preso por corrupção -, Paes voltou a trabalhar para a empresa chinesa BYD, fabricante de veículos elétricos, e tem evitado entrevistas. Na Câmara, vereadores apontam para as pretensões de seu braço-direito, o deputado federal Pedro Paulo (DEM), que ficou de fora do segundo turno na eleição em 2016. "Sou candidato a relator [na comissão especial] da reforma da Previdência. Uma coisa de cada vez. E meu candidato em qualquer hipótese é Eduardo Paes", despista Pedro Paulo.

Uma semana antes da abertura do impeachment de Crivella, o ex-prefeito do Rio por três mandatos e vereador Cesar Maia relatou ao Valor ter tido uma conversa com Paes sobre a sucessão. Presidente estadual do DEM, Maia avisou ao correligionário que o projeto do partido é lançar um nome novo. Questionado se o plano de descartar Paes se manteria caso haja eleição antecipada neste ano, Cesar Maia preferiu considerar o cenário sem impeachment. "No DEM só vamos tratar de eleição para prefeito no final do primeiro semestre de 2020", afirma.

Os atores políticos, porém, já estão se mexendo. O PSB nacional, por exemplo, quer apostar suas fichas na candidatura de Alessandro Molon, que quase triplicou sua votação a deputado federal no ano passado. Ainda pela esquerda, a deputada estadual e ex-delegada Martha Rocha é o nome do PDT. O ex-ministro do Trabalho Brizola Neto, com a incorporação do PPL para sobreviver à cláusula de barreira, deve ser o representante do PCdoB.

Sexto colocado na corrida presidencial, com 1,3 milhão de votos, o ex-deputado Cabo Daciolo aceitou o convite de filiação ao Podemos, feito pela presidente nacional da legenda, deputada federal Renata Abreu, de olho na eleição a prefeito. Cioso de seu espaço, o senador Romário - que ficou em quarto lugar na disputa a governador, atrás de Witzel, Paes e Tarcisio Motta - já tratou de informar que Daciolo será candidato, desde que ele, que comanda a sigla no Estado, não queira.

Matriarca de um tradicional clã de políticos da zona norte, iniciado por seu pai, a vereadora Rosa Fernandes (MDB) é apontada como interessada no impeachment de Crivella, para abrir caminho para o filho, o ex-deputado estadual Pedro Fernandes - o que ela nega. Diz enxergar poucos nomes interessados numa disputa para mandato-tampão. "Seria uma eleição de segunda linha", diz Rosa. Afirma que seu conselho de mãe seria para não concorrer. Secretário estadual de Educação, Fernandes tenta voos majoritários mais altos e ficou em quinto lugar na eleição a governador. No entanto, está sem filiação partidária prévia, depois de sair do PDT no ano passado.

Ex-integrante do governo Crivella - foi secretária de Desenvolvimento, Emprego e Inovação - a deputada federal Clarissa Garotinho (Pros) é outra que já se posicionou no páreo, no qual ninguém se surpreenderia se contasse com a presença do juiz federal Marcelo Bretas. Responsável pela força-tarefa da Lava-Jato no Rio, Bretas pode repetir a trajetória de Wilson Witzel, que saiu da magistratura para entrar para a política - o que seria mais provável em 2020.

Ao Valor, um dos pré-candidatos, que preferiu não se identificar, afirmou que a disputa tende a ter entre dez e 12 concorrentes, mas cairia para "três ou quatro", caso fosse realizada indiretamente pelos 51 vereadores. Essa possibilidade foi derrotada no dia 26 de março, por apenas um voto, mas parlamentares ainda tentam emplacar a manobra. "Aí será um jogo de cartas marcadas", disse. Nesse cenário, prevê, seriam fortalecidos os nomes de Cesar Maia e do vereador Paulo Messina (PRB), ex-secretário da Casa Civil de Crivella.