Correio braziliense, n. 20485, 22/06/2019. Política, p. 2

 

Os aliados que só dizem sim

Rodolfo Costa

Ingrid Soares

22/06/2019

 

 

Presidente troca o general Floriano Peixoto pelo major da reserva da PM do Distrito Federal Jorge Oliveira, ex—funcionário de gabinetes dos Bolsonaros. Governistas temem que proximidade dos atuais convocados anule ainda mais eventuais contrapontos em relação às ideias do chefe

O presidente Jair Bolsonaro iniciou um novo modus operandi para a cúpula da Presidência da República. Um modelo pautado por aliados que dificilmente irão contrapor alguma ordem. Depois de demitir o general Carlos Alberto Santos Cruz da Secretaria de Governo e substituí-lo pelo general Luiz Eduardo Ramos, ele confirmou ontem a transferência do general Floriano Peixoto da Secretaria-Geral para os Correios. No lugar, assume o atual titular da Subchefia de Assuntos Jurídicos (SAJ), Jorge Oliveira. Os dois substitutos são amigos próximos do capitão reformado. A proximidade é tanta que, entre os interlocutores palacianos, há quem acredite que dificilmente haverá contraponto às ideias do capitão reformado.

A escolha por Oliveira foi correlacionada publicamente por Bolsonaro à amizade entre os dois logo no início do pronunciamento feito por ele ontem, no Palácio do Planalto. “É uma pessoa que me aconselha há mais de 10 anos”, declarou, antes de ser prontamente corrigido pelo novo ministro. “São 15 anos”, disse Jorge. “O pai dele me acompanhou por praticamente 20 anos. É uma pessoa muito afeta à burocracia, que é uma missão difícil. Podemos dizer que é o prefeito aqui do Planalto. E desejo a ele boa sorte e felicidades. E, mais do que isso, temos plena confiança no trabalho dele, como tínhamos, também, no Floriano Peixoto”, continuou o presidente.

O sucessor de Peixoto é próximo de Bolsonaro e dos filhos, sobretudo do deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP). A proximidade levanta questionamentos entre alguns no governo. Não por atrelá-lo ao campo ideológico, como um “olavista”, aficionado pelo escritor Olavo de Carvalho. Major da reserva da Polícia Militar do Distrito Federal (PM-DF), ele não é um seguidor fiel do “guru” de Bolsonaro, segundo dizem pessoas próximas. No entanto, os fortes laços de amizade e a recente derrota do governo no Senado envolvendo o Decreto 9.785/2019, que flexibiliza a posse e porte de armas, geram dúvidas entre alguns na Esplanada dos Ministérios sobre até que ponto irá a autonomia do ministro.

A ida de Oliveira para a Secretaria-Geral é acompanhada pela transferência da SAJ da Casa Civil — chefiada por Onyx Lorenzoni — para a pasta, conforme previsto na medida provisória 886. Depois de o Senado aprovar o projeto de decreto Legislativo (PDL) 233/2019, que susta os efeitos do decreto 9.785, ficou nítido que Bolsonaro quer o assessoramento jurídico feito pelo ministro diretamente a ele, não sob o comando de Onyx. Resta saber se não haverá pressões sobre o controle da legalidade dos atos assinados, de forma a “forçar a constitucionalidade” de determinados dispositivos, como questiona o Congresso em relação ao “decreto das armas”.

Em entrevista ao Correio, Jorge Oliveira afirmou: “Meu compromisso é pela verdade e pela lealdade com o que penso. Como jurista, tenho que dizer o que não cabe e é inconstitucional.” Mas quem observa a mudança de fora do governo também levanta dúvidas sobre a gestão de Oliveira. O general da reserva Paulo Chagas, candidato a governador do DF nas últimas eleições, conhece o novo ministro e, apesar das boas referências, questiona a nomeação. “Em que pese ser um cara ótimo e sempre muito gentil, além de técnico, sendo formado em direito, fico em dúvida se ele tem capacidade para administrar tendo a autoridade de alguns militares que estão na própria Secretaria-Geral, como o general Santa Rosa (titular da Secretaria Especial de Assuntos Estratégicos)”, ponderou. O deputado Coronel Tadeu (PSL-SP), policial militar da reserva, defende o novo ministro. “O Jorge só subiu um degrau. Nada o Jair assina se não tiver a rubrica do Jorge”, destacou.

Comportamento

As relações familiares também pesaram na escolha do novo presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Gustavo Montezano. O mesmo também ocorreu na Secretaria de Governo, com a ida de Ramos, amigo pessoal de Bolsonaro desde 1973. Apesar da proximidade, interlocutores acreditam que ele fará uma boa gestão. “O general é maleável. Vai saber construir articulação de Estado entre o Congresso e o presidente”, declarou um assessor palaciano.

No “sim” ou no “não”, na amizade incondicional ou na base de um relacionamento profissional menos afetuoso, o modelo de gestão de Bolsonaro não dará certo se o presidente não mudar o próprio comportamento, alerta o cientista político Enrico Ribeiro, coordenador legislativo da Queiroz Assessoria em Relações Institucionais e Governamentais. “Bolsonaro frita todos próximos a ele. Se ele não gosta de algo, não mede esforços para fritar”, ponderou. Para o especialista, é preciso, também, alterar a estrutura de governo e delimitar espaços de atuação de cada um na articulação. “Se não fizer isso, pode botar qualquer um que não vai melhorar. Será o velório do corpo presente”, acrescentou.

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O primeiro PM na Esplanada

Augusto Fernandes

22/06/2019

 

 

 

 

O novo ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República, Jorge Antonio de Oliveira Francisco, é o primeiro policial militar do Distrito Federal a ocupar um cargo no primeiro escalão do Palácio do Planalto. Na corporação, Oliveira atuou por 20 anos, de 1993 a 2013, tendo ingressado como oficial e chegado ao posto de major. Ele foi para a reserva remunerada há seis anos. Recebe, hoje, cerca de dois terços do salário de um major na ativa (cerca de R$ 15.600).

Após ingressar na PM, Oliveira dividiu as responsabilidades como policial com formações acadêmicas. Dentro da corporação, na Academia de Polícia Militar de Brasília, tornou-se bacharel em administração de segurança pública, em 1995, e se especializou em gestão de segurança, em 2008. Além disso, formou-se bacharel em direito pelo Instituto de Educação Superior de Brasília (Iesb), em 2006. No ano seguinte, fez pós-graduação em direito público no Instituto Processus e, em 2009, obteve o diploma de docente em assessoria e consultoria parlamentar no Centro Universitário UDF.

Graças à formação, Oliveira atuou como assessor parlamentar na Câmara Legislativa do Distrito Federal e no Congresso Nacional entre 2003 e 2013. Após isso, de 2013 a 2018, exerceu a função de assessor jurídico e de orçamento em gabinetes parlamentares na Câmara dos Deputados. Neste período, um dos assistidos por Oliveira foi o próprio Jair Bolsonaro, à época deputado federal. Na Casa, o agora ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República também foi assessor parlamentar da Polícia Militar do DF e chefe de gabinete e assessor jurídico do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP).

O major de 44 anos também é um velho conhecido de Bolsonaro por ser filho do capitão do Exército Jorge Francisco, que trabalhou com o hoje presidente da República durante duas décadas. Antes de assumir como ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República, Oliveira vinha exercendo o cargo de Subchefe de Assuntos Jurídicos da Casa Civil, responsável pela normatização de atos do presidente da República. Por enquanto, ele acumulará as duas funções.

É apontado por Bolsonaro como extremamente técnico e entendido do trâmite legislativo. “Uma pessoa muito afeta à área da burocracia, uma missão difícil aqui. Temos plena confiança no trabalho dele”, frisou o presidente, ao anunciá-lo como ministro.