O globo, n.31389, 16/07/2019. País, p. 04

 

Baixa na Lava-Jato em Brasília 

Aguirre Talento 

16/07/2019

 

 

Exoneração. O procurador José Alfredo coordenava grupo que investigava autoridades com foro especial no Supremo

Em mais um capítulo na sucessão da Procuradoria-Geral da República (PGR), o coordenador do grupo de trabalho da Operação Lava-Jato na PGR, José Alfredo de Paula, pediu exoneração do cargo e deixou a função na última sexta-feira, a dois meses do fim da atual gestão da procuradora-geral, Raquel Dodge.

Sua saída amplia o desgaste interno de Dodge e representa a perda de um dos postos mais importantes da sua gestão, em um momento no qual ela se articula por uma recondução ao cargo por fora da lista tríplice. O procurador José Alfredo havia sinalizado antes que ficaria no cargo até setembro, quando termina a atual gestão, mas acabou antecipando sua saída oficialmente por motivos pessoais.

Interlocutores do procurador afirmam que ele estava insatisfeito com o ritmo lento das investigações, emperradas devido ao excesso de centralização do gabinete de Raquel Dodge, e com a tentativa de recondução fora da lista tríplice.

Em meio à baixa na PGR, integrantes da Lava-Jato de Curitiba, entre eles o coordenador Deltan Dallagnol, terão hoje uma reunião com Dodge em Brasília.

MARCHA LENTA

Um dos casos represados por Dodgeéa delação premiada do ex-presidente da OAS Léo Pinheiro. Assinada em dezembro por Dodge, a delação está parada em seu gabinete desde o fim de janeiro.

Dodge até hoje não mandou o material para homologação (aval jurídico) do ministro relator no Supremo Tribunal Federal (STF), Edson Fachin, o que impede o prosseguimento das investigações. A delação de Léo Pinheiro atinge integrantes do mundo político e do Judiciário, que são valiosos aliados de Dodge no processo de recondução ao cargo.

Procurada ontem, a PGR não respondeu até a conclusão desta reportagem. Quando fez um balanço do seu primeiro ano de gestão, Dodge anunciou que apresentou 46 denúncias contra políticos com foro privilegiado e negou uma diminuição no ritmo da Lava-Jato. Disse ainda que um dos focos do trabalho tem sido acompanhar o cumprimento dos acordos de delação já assinados anteriormente.

Dados divulgados pelo gabinete de Fachin sobre os processos da Lava-Jato no Supremo, com atualização até 31 de maio deste ano, comprovam a diminuição no ritmo da operação. Não houve, por exemplo, nenhuma delação premiada homologada em 2019 e foram apenas três inquéritos instaurados pela PGR neste ano, segundo as estatísticas.

O ex-coordenador José Alfredo comandava o grupo de procuradores da PGR responsáveis pelas investigações de políticos com foro privilegiado na Lava-Jato e também articulava o diálogo da PGR com as forças-tarefas da operação nos estados. Passavam por ele as negociações dos acordos de delação premiada, oferecimentos de denúncias, pedidos de operações policiais e de quebras de sigilo, dentre outras medidas.

Ele era subordinado à procuradora Raquel Branquinho, secretária da Função Penal Originária no STF, que cuidadas investigações criminais relacionadas apessoas de foro privilegiado em andamento na PGR. Branquinho já avisou aos colegas que deixará o cargo em setembro, ao fim da gestão atual, independentemente de uma recondução de Dodge.

Na semana passada, José Alfredo comunicou a Dodge e às forças-tarefas da LavaJato que deixaria o cargo na sexta-feira. Agora, ele voltará a exercer a função de procurador regional da Procuradoria Regional da República da 1ª Região, onde está originalmente lotado.

Ainda não há um nome previsto para ocupar o cargo de José Alfredo na PGR. A função deve permanecer vaga até setembro, quando se define o novo mandato de procurador-geral da República. Até lá, a procuradora Raquel Branquinho deve acumular a função e coordenar os trabalhos. Caso Dodge seja reconduzida, uma das dificuldades de sua nova gestão será encontrar procuradores para ocupar esses postos-chave, já que há uma grande resistência interna a seu nome no Ministério Público Federal.

A lista tríplice deste ano, votada pela categoria para compor os três nomes mais cotados para o cargo de procurador-geral, é formada pelos subprocuradores Mário Bonsaglia, Luiza Frischeisen e pelo procurador regional Blal Dalloul. Cabe ao presidente Jair Bolsonaro decidir se indica um nome da lista ou se escolhe alguém de fora.

Desde 2003, a lista tríplice tem sido respeitada pelos presidentes da República na nomeação de PGR. Desgastada internamente, Dodge não concorreu à eleição que formou a lista e articula nos bastidores políticos a sua recondução. Também corre por fora da lista o subprocurador Augusto Aras.

ATRITOS INTERNOS

1 Procuradores veem ritmo mais lento na Lava-Jato com Dodge

Procuradores reclamam que a PGR tem sido lenta, na atual gestão, no andamento das investigações de autoridades com foro. A queda na assinatura de acordos de delação premiada também ocorreu. De janeiro até 31 de maio deste ano, segundo o gabinete do ministro Edson Fachin, do STF, a PGR instaurou apenas três inquéritos no âmbito da LavaJato e não fechou delação.

2 A crise do fundo organizado pela Lava-Jato

Em março, a força-tarefa da Lava-Jato no Paraná anunciou a intenção de criar um fundo que administraria cerca de R$ 2,5 bilhões pagos pela Petrobras à Justiça americana pelo prejuízo aos investidores da estatal. A ideia de criar um fundo privado recebeu críticas, o que fez os procuradores recuarem. Dodge foi além da crítica: foi ao Supremo Tribunal Federal (STF) contra a iniciativa.

3 Silêncio no episódio das mensagens vazadas

Um dos mais recentes atritos entre a chefe da PGR e os procuradores de Curitiba foi a reação aos vazamentos das mensagens trocadas entre integrantes da força-tarefa. Os procuradores têm se queixado de pouco apoio e reclamam que Raquel Dodge não se pronunciou publicamente em defesa deles. Hoje, ela recebe os procuradores de Curitiba e deve tratar do tema.

4 Procuradoria cita ‘quebra de princípios’

Se Raquel Dodge não fez ainda uma defesa enfática dos procuradores da Operação Lava-Jato no caso das mensagens vazadas, a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC) fez ontem a primeira manifestação em tom crítico sobre o caso oriundo de um órgão do Ministério Público Federal. A nota da PFDC diz que o combate à corrupção não pode ser feito com a “quebra de princípios” constitucionais.

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Investigado, Flávio faz reunião com nº 1 da lista tríplice 

Bela Megale 

16/07/2019

 

 

Encontro. Flávio Bolsonaro tem conversado com candidatos a assumir PGR

O senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), se reuniu, há poucos dias, com o subprocurador Mário Bonsaglia, nome mais votado na lista tríplice de indicados para o comando da Procuradoria-Geral da República (PGR) com 478 votos. A interlocutores, o filho mais velho do presidente Jair Bolsonaro relatou que saiu do encontro com uma boa impressão do candidato.

Flávio é investigado por movimentações financeiras atípicas em sua conta e sob suspeita de organizar um esquema de recolhimento de parte dos salários de ex-assessores na Alerj. Embora ele seja senador, o caso não está sendo apurado pela PGR, mas sim pelo Ministério Público estadual do Rio (MPRJ), porque os fatos são anteriores a seu atual mandato.

Ele não foi o único nome ligado ao presidente que se encontrou com o subprocurador. Integrantes da equipe jurídica de Bolsonaro também estiveram com o candidato, e perguntaram até seu posicionamento ideológico.

Bons aglia tema simpatia de parte do Palácio do Planalto, que defende a escolha de um nome da lista para a sucessão de Raquel Dodge. Desde 2003, todos os presidentes da República indicaram o mais votado da lista, elaborada em votação da Associação Nacional dos Procuradores( AN PR ).

A conversa entre Bonsaglia e o senador aconteceu de maneira reservada e foi celebrada pelos poucos integrantes da entidade que souberam do encontro.

— Sem dúvida é um sinal positivo, a nossa preferencia é que seja alguém da lista. Se Flávio recebeu o primeiro colocado é um bom sinal. Acreditamos que ele terá um peso grande na escolha, até por ser senador — disse um integrante da associação.

No início do mês, Bolsonaro recebeu em mãos do presidente da ANPR, Fábio George, a lista tríplice, mas não se comprometeuem segui-la. Ele tem dito que está “sem pressa” e que fará a escolha nos “48 minutos do segundo tempo”.

O encontro com Bonsaglia não foi o primeiro do senador com um candidato ao posto. Em maio, Flávio se reuniu com o subprocurador Augusto Aras, que está na disputa. Assim como Dodge, ele corre por fora da lista. Aras também se reuniu com o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP). Procurado, Bonsaglia não quis se pronunciar.