O globo, n. 31287, 05/04/2019. Rio, p. 9

 

Procuradoria fez ressalvas

Luiz Ernesto Magalhães

05/04/2019

 

 

 Recorte capturado

Parecer listava condições para renovar concessão

A Procuradoria-Geral do Município deu parecer afirmando que era “juridicamente viável” renovar o contrato de concessão do mobiliário urbano do Rio, mas com ressalvas. No texto em que o prefeito Marcelo Crivella afirma ter se baseado para autorizar a operação, o então procurador-geral, Antônio Carlos Sá, destacou que a falta de documentos, como o contrato inicial e o primeiro termo aditivo, prejudicava a análise do caso, e fez uma série de recomendações. Entre elas, destacou que um “desequilíbrio econômico-financeiro” do contrato, alegado pela empresa que explora o negócio, deveria ser constatado pelo município. A prorrogação do serviço foi assinada duas semanas depois.

Procurada ontem, a prefeitura não informou se o estudo técnico, considerado necessário pela Procuradoria, foi realizado. O município alegou que não poderia dar mais detalhes porque trabalha num relatório para entregar à Câmara de Vereadores, onde corre o processo de impeachment de Crivella.

Empresa alegou prejuízo

A análise da Procuradoria, à qual O GLOBO teve acesso, trata da elaboração de termos aditivos para dois contratos da Cemusa, que foi comprada pela JCDecaux. Logo no início, Antônio Sá ressaltou que não dispunha de estudos técnicos da prefeitura e mencionou que só contava com um parecer da então subsecretária de Patrimônio, Maria Elisa Dutra da Silva Werneck Martins, que afirmava não se “opor” à medida. Além disso, só havia uma manifestação do secretário municipal de Fazenda, César Barbieiro, em que, de acordo com o ex-procurador geral, era abordado o desequilíbrio contratual aferido pela “própria parte”. A empresa estimava que seu prejuízo era de R$ 9,6 milhões com nova cobrança de ISS, a partir de 2018.

A partir daí, o ex-procurador-geral enumerou uma série de “pressupostos” para viabilizar a extensão da concessão. Um deles era que a iniciativa fosse a melhor alternativa para atender ao interesse público. Para isso, sugeriu estudos sobre relação custo-benefício e que a Secretaria municipal de Fazenda, junto com a Controladoria-Geral, elaborasse e juntasse aos autos cálculos e análises. Antônio Sá observou ainda que dava um parecer porque havia pedido de urgência, sem informar, no entanto, de quem partira a solicitação.

Os contratos com a JCDecaux foram assinados em 1999, na gestão do então prefeito Luiz Paulo Conde. Após uma tentativa de renovação em 2016, que não avançou, a empresa, em agosto de 2018, enviou novo ofício à prefeitura sobre um pedido de instalação de 300 novos abrigos de ônibus, sem publicidade. Para atendê-lo, ela pedia para ampliar o prazo da concessão.

Na negociação, a empresa propôs ainda que os sanitários públicos — previstos no contrato original, mas que nunca foram completamente instalados —fossem retirados das ruas. No acordo, a JCDecaux ofereceu a antecipação de R$ 15 milhões, em três parcelas anuais, relativas a recebimentos futuro saque o município tem direito sobre a venda de publicidade.

O processo passou ainda pelo subsecretário de Assuntos Compartilhados, Fernando Meira Júnior. Em seu parecer, ele reproduziu planilhas com valores apresentados pela JCDecaux e disse que considerava o negócio “extremamente vantajoso” para a prefeitura.

Para o advogado especializado em Direito Administrativo, Hermano Cabernite, a administração pública deve agir sempre com cautela:

—Acho curioso que um assessor da prefeitura faça a prorrogação apenas combas e em informações da empresa.

A reportagem não teve acesso à prorrogação do contrato da Clear Channel (Adshel).

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Crivella dá cargos para fortalecer base

Paulo Cappelli

05/04/2019

 

 

Políticos do PP são nomeados secretários

O prefeito Marcelo Crivella (PRB) anunciou ontem a nomeação de dois políticos do Progressistas (PP) para o seu primeiro escalão. Marcelo Queiroz será o novo secretário de Meio Ambiente, e Paulo Jobim assumirá a pasta de Turismo. Com a escolha, Crivella conquista o apoio de dois vereadores do partido na Câmara, mas ainda assim terá dificuldade para remontar sua base e, desta forma, barrar o processo de impeachment, sobre o qual deverá ser oficialmente notificado hoje. Parlamentares que já deram sustentação ao prefeito no início da gestão afirmam que é impossível a volta ao barco do governo. Segundo vereadores ouvidos pelo GLOBO, nem mesmo a promessa de cargos seria capaz de restabelecer o laço entre o Executivo e o Legislativo.

O ex-governador Francisco Dornelles, presidente do PP, destacou as afinidades de ideias entre seu partido e o governo de Crivella.

—Existe uma identidade muito grande entre o Progressistas e Vossa Excelência. Às vezes, não sei se você veio do meu partido ou eu que vim do seu —disse Dornelles para o prefeito.

Rogério Rocal (PTB), que apoiou o governo em um projeto-chave como o aumento do IPTU, diz que Crivella “perdeu a confiança” do parlamento por descumprir acordos.

—Posso dar exemplos concretos que aconteceram comigo. Para ajudar na votação do IPTU, fiz um pedido republicano de que fosse inaugurada uma Clínica da Família em Campo Grande. Até hoje, ela não foi inaugurada. Além disso, o prefeito e eu fomos, em março de 2018, a quatro escolas em Campo Grande. Ele prometeu que, em novembro, todas já teriam passado por reformas. Até hoje, nenhuma foi reformada. Mesmo tendo bons secretários, fica muito difícil confiar no prefeito. É zero a possibilidade de eu voltar a apoiá-lo —disse.

Célio Lupparelli (DEM), por sua vez, reclamou de, mesmo quando integrava a base governista, não ter sido recebido por Crivella. O político acredita que o clima de insatisfação na Câmara é irreversível.

—O vereador que voltar atrás após ter votado pela abertura do processo de impeachment vai ter que se explicar para o seu eleitor. A chance do governo seria costurar uma aliança com os partidos, mas isso é muito difícil —avaliou.

Já o presidente da Câmara, Jorge Felippe (MDB), parafraseando Tancredo Neves, disse que “o impossível na política é Deus pecar”.

—Isso (a recomposição da base) vai depender da competência do prefeito — disse Felippe.

Um vereador que apoia Crivella e preferiu não se identificar acredita que o impeachment perderá fôlego:

—Em caso de cassação do mandato do prefeito e eleições diretas, um candidato apoiado pela maioria dos vereadores que querem o impeachment não teria força. Então, isso não seria jogo para eles.