O globo, n. 31288, 06/04/2019. Rio, p. 14

 

Crivella diz que o motivo foi a crise

Natália Boere

Paulo Cappelli

06/04/2019

 

 

Sob risco de cassação, prefeito alega que precisava pagar aos aposentados

No dia em que foi notificado da abertura de um processo de impeachment contra ele na Câmara Municipal do Rio, o prefeito Marcelo Crivella rebateu a acusação de irregularidade na renovação do contrato de exploração de publicidade no mobiliário urbano e alegou que, em 19 de dezembro do ano passado, quando foram assinados os termos aditivos, a cidade enfrentava uma “crise absurda”. Segundo ele, a medida era necessária até para pagar salários. — Precisávamos muito naquele momento dos aditivos para pagar aos aposentados, por exemplo — afirmou ele, ironizando críticas feitas à prefeitura por ter tomado a iniciativa de fazer um aditivo que, de acordo com ele, era positivo. — “Ah, mas não podia porque tinha um detalhe assim”. A prefeitura estava rigorosamente sem recursos. Quero agradecer à Câmara porque, passado o dilúvio de ódios e paixões, vejo que há caminho para diálogo e distensões. Com a notificação, Crivella tem até o próximo dia 17 para apresentar sua defesa prévia ao Legislativo carioca. Ontem, em uma rede social, o prefeito comentou a reportagem do GLOBO que revelou trechos do parecer da Procuradoria-Geral do Município sobre a renovação do contrato de concessão — para o órgão, a operação seria “juridicamente viável” desde que fossem cumpridas algumas condições. Entre elas, uma análise do corpo técnico do município sobre um suposto desequilíbrio econômico-financeiro do contrato, alegado pelas concessionárias para tentar obter a extensão do prazo do serviço. Crivella disse que a informação de que a prefeitura não cumpriu ressalvas feitas pela Procuradoria “é fora da realidade”.

— Havia uma autorização jurídica da Procuradoria-Geral do Município para que fosse feito o aditivo, que veio da época de Eduardo Paes (ex-prefeito). O parecer foi acatado por mim. Havia pequenas ressalvas, mas não tocavam no âmago. A Procuradoria disse que não haveria prejuízo para o erário — sustentou Crivella durante o evento de apresentação, no Palácio da Cidade, em Botafogo, do programa Territórios Sociais, que pretende beneficiar 420 mil moradores de comunidades carentes.

Falta de documentos

Ainda no parecer, assinado pelo então procuradorgeral do município, Antônio Sá, consta que faltavam documentos, como o contrato original e o primeiro termo aditivo, para que fosse possível uma análise mais completa da questão. Antônio Sá observou havia um pedido de urgência para o trâmite do processo.

Com a defesa que encaminhará à Câmara, Crivella tentará estancar o andamento do processo de impeachment. Embora tenha dito a aliados que apresentaria seu relatório sobre os fatos por escrito, o prefeito também tem a opção de se defender pessoalmente ou por meio de um representante. De acordo com fontes do governo, o chefe de gabinete de Crivella, Aílton Cardoso, trabalha na redação do texto que será enviado aos vereadores. Após apreciar os argumentos do município, os três vereadores que integram a comissão que pode levar à cassação de mandato (Willian Coelho, do MDB; Luiz Carlos Ramos Filho, do PODE; e Paulo Messina, do PROS) terão cinco dias para opinar pelo arquivamento ou pelo prosseguimento da denúncia. Mesmo que concluam pelo arquivamento, a decisão ainda deverá ser confirmada pelo plenário da Casa numa votação por maioria simples (metade mais um do total de vereadores). Se a comissão votar pelo prosseguimento do processo, terá início a fase de instrução, com produção de provas e convocação de servidores para prestarem depoimentos.

Opinião do GLOBO

Urgência

ENTRE OS muitos fatos que precisam ser esclarecidos na prorrogação do contrato com uma empresa de mobiliário urbano, sem que isso estivesse previsto no edital da prefeitura, está o pedido de urgência feito na consulta à Procuradoria. A dilatação do prazo embasa a abertura de um pedido de impeachment contra Crivella.

O QUE justifica tal urgência em relação ao mobiliário urbano? Pelo jeito, a prefeitura usa critérios distintos para estabelecer suas prioridades. A saúde, por exemplo, não parece uma delas.