Correio braziliense, n. 20363, 20/02/2019. Economia, p. 8

 

Reforma cria alíquota extra para servidores

Alessandra Azevedo

Rosana Hessel

Hamilton Ferrari

20/02/2019

 

 

 Recorte capturado

 

 

Conjuntura » Proposta que muda o sistema previdenciário será levada hoje ao Congresso pelo presidente Jair Bolsonaro. Além da idade mínima para a aposentadoria, texto pode permitir que estados e o Distrito Federal aumentem contribuição dos funcionários

Após meses de discussão, o governo divulga, na manhã de hoje, o texto da reforma da Previdência. O presidente Jair Bolsonaro entregará a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), às 9h30 e, à noite, fará um pronunciamento para defendê-la. As mudanças devem valer para trabalhadores da iniciativa privada e para servidores públicos da União e dos estados, mas os militares terão um projeto de lei à parte. O ponto em comum entre todas as categorias é a exigência de uma idade mínima para aposentadoria.

Para sustentar a ideia de corte de privilégios, Bolsonaro deve propor um reajuste nas alíquotas de contribuição dos servidores, que deve passar de 11% para 14%. Também pode ser incluído um dispositivo  para permitir que governos estaduais criem uma alíquota extra de até 8%, a depender da situação específica de cada ente  e do valor da remuneração. Assim, os que recebem supersalários — valores acima do teto constitucional de R$ 39,3 mil — poderão ter que contribuir com até 22%.

Em contrapartida, quem ganha um salário mínimo, que hoje recolhe 8% do rendimento, pode ter o desconto reduzido a 7,5%. O objetivo do governo é se antecipar ao discurso da oposição de que a reforma vai tirar direitos dos brasileiros de baixa renda.

O governo também deve limitar a concessão de benefícios aos servidores. Quem entrou no serviço público depois de 2003 só deve ter direito à integralidade (aposentadoria com o último salário) e paridade (reajustes iguais aos dos trabalhadores da ativa) caso se aposente após completar a idade mínima definida, de 65 anos (homens) e 62 (mulheres).

A idade mínima para aposentadoria foi um dos primeiros itens sobre os quais o governo bateu o martelo. Homens só poderão se aposentar quando completarem 65 anos e mulheres, 62. A regra valerá tanto para iniciativa privada quanto para servidores públicos. Assim que a reforma for aprovada, a exigência será de 60/56 anos e aumentará seis meses a cada ano — em 2021, será de 61/57; em 2023, de 62/58; e assim por diante, até chegar aos 65/62 em 2031.

Há outras duas opções de transição. Uma prevê que, se a pessoa estiver a dois anos ou menos de completar os 35/30 anos exigidos para aposentadoria por tempo de contribuição (que deixará de existir), pague um pedágio de 50% sobre esse tempo. Ou seja, quem estiver a um ano de completar a exigência trabalhará por mais seis meses, mas não precisará completar a idade mínima. Também incidirá o fator previdenciário, que diminui o valor do benefício.

A terceira alternativa é o sistema de pontos, que já existe, mas passará a ser uma exigência para quem escolher essa transição. Nesse caso, será possível se aposentar quando a soma da idade com o tempo de contribuição chegar a, pelo menos, 86/96 (mulheres/homens), em 2019. A pontuação aumentará todos os anos, até chegar a 100/105, em 2033. Depois disso, a única possibilidade de aposentadoria será pela idade mínima, que já será de 65/62 ao fim do período de transição.

Os militares também devem ter uma idade mínima para aposentadoria — de 55 anos. Além disso, o tempo de contribuição exigido para entrar na reserva deve passar de 30 para 35 anos. Segundo o líder do governo na Câmara, Major Vitor Hugo (PSL-GO), a equipe ainda discutia o texto ontem.

Votos

O vice-presidente Hamilton Mourão acredita que o governo tem 250 dos 308 votos necessários para aprovar a matéria na Câmara. “A oposição tem cerca de 150 votos. Sobram 363 para serem garimpados. Acredito que temos 250. Então, entre 60 e 70 votos terão que ser buscados”, avaliou.  O cientista político Christopher Garman, diretor do Eurasia Group, consultoria sediada em Washington, considera que o apoio está longe disso.

“O Planalto fez pouco progresso na criação de uma rede de apoio ou diálogo com líderes partidários, particularmente, na Câmara”, afirmou. “A decisão do governo de não distribuir cargos para aliados gera um ambiente desafiador para criar uma coalizão no Congresso.”

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Privilégios no setor público

Marilia Sena

20/02/2019

 

 

A aposentadoria média dos servidores do Poder Legislativo é, em média, 19 vezes maior do que a dos trabalhadores da iniciativa privada, vinculados ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). O funcionário do Legislativo recebe cerca de R$ 26 mil quando para de trabalhar, e o aposentado pelo INSS, R$ 1.400. Os dados foram apresentados pelo diretor da Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado, Gabriel Leal de Barros, ao programa CB.Poder, uma parceria entre o Correio Braziliense e a TV Brasília. As aposentadorias das demais instâncias do governo federal também são bem mais altas que a do INSS. No Executivo, o aposentado recebe, em média, R$ 8 mil por mês. No Judiciário, o valor é de R$ 18 mil e no Ministério Público, de R$ 14 mil.

Barros avalia que a Previdência, no modelo atualmente em vigor, é uma “transferência de renda do pobre para o rico”. De acordo com o economista, o maior problema do Brasil são os gastos públicos excessivos. Segundo ele, o Brasil, que é um país de população ainda relativamente jovem, gasta mais com Previdência do que o Japão, que tem um número bem maior de idosos.

Outro ponto abordado na entrevista foi a possibilidade de mudança da proposta de reforma da Previdência no Congresso. Para Barros, o desgaste do governo com o caso do ex-ministro Gustavo Bebianno pode atrapalhar a tramitação do texto no Congresso e provocar alterações significativas na proposta original. “A reforma precisa ser significativa, sem perder de vista o ganho fiscal para o Brasil que o projeto do governo pretende alcançar”, disse.

O economista também avalia que, apesar de participarem de um sistema trabalhista diferente do que os outros integrantes da Previdência, os militares não podem ficar de fora da reforma. “A situação do Brasil vai exigir sacrifício de todo mundo, mesmo nos casos em que não existem os mesmos benefícios trabalhistas”.

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Apoio de govendadores

20/02/2019

 

 

O ministro da Economia, Paulo Guedes, foi enfático com os governadores que se reuniram com ele na noite de ontem: não adianta pedir ajuda financeira à União se não houver apoio à aprovação da reforma da Previdência. Também é necessário fazer o dever de casa, que engloba no corte de gastos e privatização de estatais. Com a situação drástica nas contas, os administradores regionais devem declarar o apoio à Proposta de Emenda à Constituição (PEC), que será apresentada hoje.

Guedes se reuniu com os governadores do Acre, Gerson Cameli (PP); da Paraíba, João Azevedo (PSB);  e do Rio Grande do Norte, Fátima Bezerra (PT). Na reunião com Fátima, Guedes chegou a provocar uma situação constrangedora, segundo fontes que participaram do encontro, que teve a presença de integrantes da bancada petista no Congresso. Segundo o ministro, as gestões passadas do partido dela contribuíram para implementar um estado de corrupção no país. De acordo com a fonte, Guedes foi quem mais falou. “Dos 50 minutos da reunião, ele teve a palavra por 48 minutos”, afirmou um integrante da bancada do Rio Grande do Norte.

Debate

Na saída da reunião, Fátima Bezerra disse que teve diálogo republicano com o ministro e que ele sinalizou que as portas estão abertas. “A proposta (de reforma) ainda não foi apresentada ao Fórum dos Governadores ou o Congresso Nacional. Estamos aguardando. Isso sendo apresentado, que se garanta transparência total e ampla participação no debate”, ressaltou. O Rio Grande do Norte passa por dificuldades financeiras, com deficit de mais de R$ 4 bilhões.

O deputado federal Rafael Motta (PSB-RN), que também participou da reunião, disse que Guedes foi enfático ao ressaltar a necessidade de venda de ativos estaduais. E afirmou que a governadora pouco falou durante o encontro. Fátima tratou com o ministro sobre “todo o esforço que a administração regional vem fazendo” para reduzir gastos. Mas também pediu ajuda da União. “Nós colocamos a necessidade imperiosa de contar com a contribuição do governo federal por meio de recursos extras para que possa fazer o enfrentamento diante do desequilíbrio fiscal”, afirmou a governadora.

O governador do Acre, Gerson Cameli (PP) destacou que há boa vontade de todos os integrantes do Fórum de Governadores, que ocorre hoje, para apoiar as mudanças na Previdência. “Os 27 governadores estão em sintonia para aprovar a reforma. Fizemos uma pauta para apresentar ao ministro no encontro, que inclui apoio à reforma, e também pede um novo pacto federativo e a renegociação da dívida de estados e municípios”, afirmou. (HF e RH)