O globo, n. 31355, 12/06/2019. Economia, p. 17

 

Impacto das mudanças

Geralda Doca

Renata Vieira

Leo Branco

12/06/2019

 

 

Economia cairia R$ 300 bilhões, mas relator deve propor compensações

As mudanças que o relator Samuel Moreira (PSDB-SP) estuda fazer na reforma da Previdência podem levar a queda de R$ 300 bilhões na economia prevista em dez anos. Governadores condicionam apoio à retirada de quatro pontos do texto, entre os quais a capitalização.

As mudanças que o relator da reforma da Previdência, deputado Samuel Moreira (PSDB-SP), estuda fazer na proposta podem fazer com que a economia prevista para os cofres públicos seja reduzida em R$ 300 bilhões. Isso significa que o ganho cairia de R$ 1,2 trilhão em dez anos para R$ 900 bilhões. O parecer de Moreira deve ser apresentado amanhã na Comissão Especial da Câmara.

Diante disso, técnicos que acompanham as negociações afirmam que Moreira deve propor medidas para compensar as perdas, mesmo que parcialmente. Ele poderia sugerir a redução dos repasses constitucionais do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) ao BNDES. Também estaria no radar o aumento da alíquota de Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) dos bancos. Esses recursos ficariam na área de seguridade.

Ontem, em São Paulo, o presidente Jair Bolsonaro demonstrou otimismo em relação ao texto que será votado no Congresso:

— Estou otimista com uma proposta quase nada desidratada.

Já o relator prometeu a governadores reunidos em Brasília que vai entregar um parecer com mudanças em relação à proposta enviada pelo governo ao Congresso. Além de retirar da reforma medidas que afetavam benefícios assistenciais e aposentadorias rurais, Moreira afirmou, sem dar maiores detalhes, que vai flexibilizar as regras de aposentadoria de mulheres e professores:

— Posso afirmar que vamos avançar. Com relação às mulheres, nós teremos uma PEC melhor, com os professores também, com o BPC (Benefício de Prestação Continuada) e com o rural também. Temos pontos para resolver? Temos. Os estados e municípios.

Nova regra em estudo

A exclusão das mudanças propostas pela equipe econômica no BPC e na aposentadoria rural teria impacto de R$ 120 bilhões. Além disso, ajustes no pagamento do abono salarial podem reduzir a economia em mais R$ 80 bilhões. O texto enviado pelo governo restringe o pagamento do abono a um salário mínimo, mas a ideia do relator é adotar a solução intermediária de 1,4 salário. Haverá ainda impacto de ajustes nas pensões e na regra da transição.

Segundo técnicos que acompanham as negociações, Moreira estuda mais uma regra de transição para trabalhadores do INSS e para servidores que ingressaram na carreira depois de 2003.

A medida, que seria uma forma de compensar benefícios que serão dados a servidores públicos, poderia prever uma idade mínima de 57 anos para mulheres e de 60 para homens com a cobrança de um pedágio de 100% sobre o tempo que falta para aposentadoria. Não há detalhes sobre como essa regra seria aplicada —se valerá, por exemplo, para pessoas que estão prestes a se aposentar —, mas os técnicos afirmam que ela poderia reduzir a economia em R$ 100 bilhões para os cofres públicos.

Causa deve ser blindada

O relator defendeu que estados e municípios permaneçam na reforma, sob o argumento de que o déficit dos regimes de previdência estaduais beira R$ 100 bilhões por ano, podendo atingir R$ 1 trilhão em uma década se eles forem excluídos das mudanças nas regras de aposentadoria. Contudo, mencionou que é preciso encontrar um entendimento com os parlamentares. Eles não querem assumir sozinhos o ônus de votar um projeto impopular.

Em meio à repercussão das supostas mensagens trocadas entre o ministro Sergio Moro e o procurador Deltan Dallagnol no meio político, Moreira afirmou que é preciso blindar a reforma para evitar que o caso atrapalhe a votação das mudanças nas aposentadorias no Congresso.

— Eu acho que nós temos uma causa, uma causa muito relevante, que deve inclusive ser blindada de todas as outras questões que possam surgir, que é a questão da Previdência. Eu acho que ela unifica todo o país.

Bolsonaro colocou sobre o Congresso a responsabilidade de manter estados e municípios na reforma:

—Isso está uma interrogação no Parlamento. Mas cada dia na política vai de um lado para o outro. Nós gostaríamos que todo mundo fosse incluído. Mas em grande parte quem vai decidir isso daí é o Parlamento.

___________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

Por apoio, governadores pedem retirada da capitalização

12/06/2019

 

 

Eles também defendem que os parâmetros para concessão de aposentadorias sejam mantidos na Constituição Federal

Reunidos para o Fórum de Governadores, em Brasília, os chefes dos governos estaduais, sobretudo do Nordeste, condicionaram o apoio mais efetivo à reforma da Previdência ao atendimento de quatro reivindicações, que alteram significativamente o texto apresentado pelo governo federal. Eles querem excluir da proposta as mudanças que mexem nas regras de concessão do BPC (Benefício de Prestação Continuada) e da aposentadoria rural, retirar o sistema de capitalização, em que os trabalhadores poupam para a própria aposentadoria, e manter na Constituição os parâmetros da aposentadoria, já que o Executivo havia proposto retirar da Carta todas as regras da Previdência.

Esses pontos foram apresentados ontem ao relator da proposta, deputado Samuel Moreira (PSDB-SP), que participou do encontro.

O governador do Distrito Federal (DF), Ibaneis Rocha (MDB), um dos organizadores do Fórum, afirmou que os governadores vão aguardar a decisão do relator sobre os pleitos apresentados para assinarem um documento, no qual vão se comprometer a trabalhar de forma efetiva para aprovar a reforma da Previdência. Essa é uma condição imposta pelos parlamentares para manter estados e municípios na proposta.

—Acolhidos os pontos, todos terão o compromisso de ir para dentro das bancadas e pedir apoio à reforma — disse o governador do DF.

Ele afirmou que seu partido deverá fechar questão pela aprovação da reforma se o relator acatar no seu parecer os quatro pontos defendidos pelos governadores. Segundo ele, Moreira ficou de dar uma resposta hoje, depois de se reunir com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, e com líderes dos partidos.

O governador de São Paulo, João Doria, afirmou que seu partido, o PSDB, fecharia apoio à reforma, o que se confirmou à tarde:

—É a primeira vez em 30 anos que o PSDB propõe fechamento de questão, e será o voto pela reforma da Previdência.

Ele destacou que o relator acolheu com sensibilidade o pleito dos governadores.

O governador do Piauí, Wellington Dias (PT), comentou que os governadores do Nordeste apanharam nos últimos dias, diante das acusações de que estariam fazendo jogo duplo ao defenderem a reforma em Brasília e a criticarem nos seus estados. Mas destacou que as mudanças sugeridas na reforma estão sendo discutidas desde o envio da proposta ao Congresso.

— Desde fevereiro, quando Paulo Guedes (ministro da Economia) entregou seu projeto à Câmara, já falávamos em abrir entendimento para tirar esses quatro pontos (BPC, rural, capitalização e desconstitucionalização) —afirmou Dias.

PMs e bombeiros

Outro pedido feito pelos governadores é que a reforma abra a possibilidade de os governos regionais optarem por seguir o projeto de lei que enquadra policiais militares e bombeiros nas mesmas regras da União ou propor projetos às assembleias para mudar as regras para essas categorias.

Somente governadores de Maranhão e Amazonas não participaram do encontro.