Valor econômico, v. 18, n. 4458, 09/03/2018. Política, p. A8

 

Ação contra Lula e Dilma vai para 1ª instância

Maíra Magro

09/03/2018

 

 

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Edson Fachin determinou o desmembramento do inquérito conhecido como "quadrilhão do PT", com o envio da denúncia contra os ex-presidentes Dilma Rousseff e Luiz Inácio Lula da Silva para a Justiça Federal do Distrito Federal.

Eles são acusados de integrar o "núcleo político" de uma organização criminosa que retirava dinheiro da Petrobras.

Fachin também encaminhou as investigações referentes a Antonio Palocci, Guido Mantega e João Vaccari Neto, que constavam no mesmo inquérito, para a mesma sessão judiciária no DF.

Apenas a senadora Gleisi Hoffmann, presidente nacional do PT, e seu marido, o ex-ministro Paulo Bernardo Silva, responderão à acusação no STF, já que Gleisi tem foro privilegiado e os crimes atribuídos a Paulo Bernardo estão diretamente relacionados ao caso da senadora.

Já o ex-ministro Edinho Silva (PT-SP), atualmente prefeito de Araraquara, terá seu caso encaminhado ao Tribunal Regional Federal da 3ª Região, em São Paulo.

"Há, a meu sentir, razões suficientes para se determinar o processamento em conjunto, neste mesmo feito, tão somente dos denunciados Gleisi Helena Hoffmann e Paulo Bernardo Silva, sob pena de prejuízo à escorreita compreensão dos fatos narrados e à instrução probatória", afirmou Fachin.

Segundo o ministro, "as normas constitucionais alusivas à prerrogativa de foro devem ser interpretadas restritivamente, impondo, por essa razão, o desmembramento do processo criminal sempre que possível, mantendo-se sob a jurisdição especial, em regra e segundo as circunstâncias de cada caso, apenas as autoridades indicadas na Constituição."

Ontem também, a presidente do Supremo, Cármen Lúcia, fez um duro discurso contra a corrupção no lançamento do prêmio Innovare, em Brasília, que premia práticas inovadoras no Judiciário, cujo tema deste ano é justamente o combate à corrupção. Cármen disse que "corrupção é crime", que "se combate e pune nos termos da lei".

"Toda forma de corrupção é uma forma de injustiça, e há de ser combatida para que a gente tenha a superação de um momento civilizatório", afirmou. "Qualquer pessoa se sente injuriada diante de situações que demonstrem práticas de corrupção", acrescentou.

A ministra ressaltou que a democracia vive da confiança dos cidadãos nas suas instituições. "E não se confia em instituição corrupta, onde as pessoas pratiquem corrupção e não haja instituições suficientemente fortes, vigorosas e comprometidas com o combate e a superação desse estado de coisas."

Cármen Lúcia falou que o Brasil "tomou o rumo de querer chegar a ser um estado ético para todos" e disse esperar que um dia a corrupção "seja apenas uma triste lembrança".

E concluiu: "A corrupção é inaceitável qualquer que seja sua forma. Corrupção é crime e, como tal, o sistema de Justiça tem o dever de combater todas as práticas que possam conduzir a ela."

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Em carta a Dodge, Temer questiona investigação

Cristiane Bonfanti 

Andrea Jubé 

09/03/2018

 

 

Depois de ser incluído como investigado no inquérito da Odebrecht, o presidente Michel Temer encaminhou à procuradora-geral da República, Raquel Dodge, uma carta e um parecer do jurista Ives Gandra da Silva Martins questionando a responsabilização de um presidente da República, durante a vigência de seu mandato, por atos praticados fora do exercício de suas funções.

O parecer é acompanhado de um artigo do ministro da Justiça, Torquato Jardim, que segue a mesma interpretação. Com base no quarto parágrafo do artigo 86 da Constituição, Ives Gandra argumenta que o presidente só deve responder por atos que guardem estrita relação com o exercício do mandato - o que buscaria garantir, entre outras finalidades, a estabilidade política do país. Depois de deixar o cargo, explica, o presidente responderá integralmente pelas eventuais infrações cometidas perante a justiça comum. "Não se apresenta razoável que se pudesse investigar o presidente da República por atos estranhos ao mandato, para ao fim e ao cabo não ser possível ingressar com a ação penal contra ele", escreve o jurista.

Torquato segue a mesma linha de raciocínio e afirma que, em duas interpretações possíveis sobre o dispositivo, a conclusão é a mesma: "Até o final do seu mandato o presidente da República não pode ser investigado por atos estranhos a sua função." O ministro da Justiça argumenta que, quando a Constituição diz que o presidente "não pode ser responsabilizado", isso significa que ele não pode responder. "A investigação exige respostas. Portanto, o início da responsabilidade se dá pelo início da investigação, quando respostas serão dadas pelos mais variados meios, com vistas a corporificar a responsabilização já iniciada", escreve o ministro.

Toda a polêmica gira em torno da decisão de Raquel Dodge de pedir a inclusão de Temer como investigado no inquérito que apura suspeitas de repasses de caixa dois da Odebrecht para campanhas eleitorais do MDB em 2014. O caso diz respeito a um jantar no Palácio do Jaburu, em maio daquele ano, no qual teria sido acertado o repasse ilícito de R$ 10 milhões. Os ministros Eliseu Padilha (Casa Civil) e Moreira Franco (Secretaria-Geral da Presidência) já eram investigados no caso. Mas, à época da abertura do inquérito, em abril de 2017, o então procurador-geral da República, Rodrigo Janot, decidiu deixar Temer fora da investigação, em função de seu atual cargo.

Ives Gandra argumenta que o caso é integralmente abrangido pelo texto constitucional, uma vez que a suposta prática de infrações ocorreram em 2014, antes de Temer assumir a Presidência. "Parece não restarem dúvidas de que as acusações recaem sobre atos estranhos à função de presidente, eis que a Presidência da República à época (2014) era exercida pela Sra. Dilma Rousseff", escreve o jurista.

Na carta que acompanhou os documentos, Temer disse a Dodge que encaminha a cópia dos textos por "mero interesse acadêmico", tendo em vista o "vício intelectual" que o acompanha há muito tempo com vistas a discutir os grandes temas do Direito Constitucional. "Reitero que o objetivo é meramente acadêmico, já que não me insurgirei contra o despacho dado pelo ministro Fachin acolhendo sua postulação. E de logo registro que respeito e respeitarei sempre as suas manifestações, já que, tenho absoluta certeza, são guiadas pela sua convicção jurídica", concluiu o presidente.

Em entrevista, o ministro da Secretaria de Governo, Carlos Marun, negou que, com a carta, Temer tenha a intenção de pressionar Raquel Dodge. "Tem viés do enriquecimento do debate", afirmou.

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TSE revoga trecho da resolução sobre pesquisas

Maíra Magro

09/03/2018

 

 

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) revogou na ontem o controverso trecho de uma resolução que impedia a realização de perguntas não relacionadas à eleição nas pesquisas eleitorais.

A revogação foi proposta pelo presidente do TSE, ministro Luiz Fux, para quem a inserção dos trechos na resolução gerou "incerteza jurídica sobre seu alcance". Os artigos que limitaram o escopo das pesquisas, aprovados no dia 1º de março, geraram críticas de diversos institutos de pesquisas e entidades do setor.

Um dos trechos questionados dizia: "Nos questionários aplicados ou a serem aplicados nas pesquisas de opinião pública (...) são vedadas indagações a respeito de temas não relacionados à eleição." O outro dispositivo revogado impedia os questionários de fazer "afirmação caluniosa, difamatória ou injuriosa" sobre os candidatos.

Os ministros decidiram então revogar os parágrafos 10º e 11º do artigo 2º da Resolução 23.549, que impunham as limitações. A decisão ocorreu durante sessão administrativa na corte.

"A finalidade do tribunal é uniformizar o direito e gerar decisões que não acarretem incertezas e dúvidas", afirmou Fux.

O Supremo Tribunal Federal (STF) também deliberou ontem sobre regras eleitorais. A corte derrubou a exigência uma decisão final da Justiça para a realização de novas eleições nos casos de indeferimento de registro, cassação de diploma ou perda de mandato.

A regra foi introduzida ao Código Eleitoral pela minirreforma eleitoral, aprovada em 2015.

Os ministros entenderam que o julgamento final na Justiça Eleitoral já é suficiente para a substituição do cargo, sem a necessidade de aguardar um posicionamento do STF.

Relator do caso, o ministro Luís Roberto Barroso afirmou que a exigência do trânsito em julgado permitiria o exercício do cargo por um período muito longo.

O STF também derrubou a regra, prevista na minirreforma eleitoral de 2015, que previa a realização de eleições diretas se os cargos de presidente e vice-presidente da República ficarem vagos nos primeiros três anos e meio de mandato.

Segundo a decisão do STF, no caso de vacância dos dois cargos, prevalece o que diz a Constituição - ou seja, eleições diretas se os dois cargos ficarem vazios nos primeiros dois anos de mandato, e eleições indiretas se a vacância ocorrer nos dois últimos anos.

Os ministros também derrubaram a regra que previa eleições diretas para senadores se o cargo ficar vazio durante os primeiros três anos e meio de mandato. O mecanismo de novas eleições previsto na minirreforma eleitoral foi mantido, porém, para governadores e prefeitos, no caso de dupla vacância do titular e do vice.

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Paes nega que soubesse de pedidos de propina

Cláudia Schüffner 

09/03/2018

 

 

O ex-prefeito do Rio de Janeiro Eduardo Paes (PMDB) disse que nunca teve conhecimento da cobrança de propinas por secretários durante o seu governo. Paes depôs ontem como testemunha do ex-secretário de Obras da Prefeitura do Rio, Alexandre Pinto, que foi denunciado três vezes pelo Ministério Público Federal (MPF).

Ao falar com jornalistas, Paes disse que nunca recebeu nenhuma denúncia, e nem chegou a seu conhecimento a existência de esquemas de cobrança de percentual pelas obras para a Copa do Mundo e Olimpíada.

As denúncias contra Pinto se referem à cobrança de propinas relacionadas às obras de restauração da Linha Vermelha; do Programa Asfalto Liso; Transoeste; entorno do Maracanã; Transcarioca; prestação de serviços relacionada às obras do Corredor Transbrasil por parte do Consórcio Dynatest-TCDI.

Segundo Eduardo Paes, se ele tivesse recebido alguma denúncia contra seu ex-secretário, o que ele disse nunca ter acontecido, Pinto teria sido demitido.

"Você tem órgãos de controle municipais, da União, força-tarefa do Ministério Público e a imprensa por causa da Olimpíada. E em nenhum momento houve qualquer denúncia, nenhuma notícia que fosse, a esse respeito. De fato, espero que não seja verdade, mas se for, não chegou ao meu conhecimento", disse Paes.

Foi o terceiro depoimento de Paes como testemunha para o juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal Criminal. Paes afirmou ter conhecimento de que delatores nunca o envolveram. "Todos os colabores dizem que comigo não tinha conversa, que comigo não tinha contrapartidas, ao contrário. O que se tem a meu respeito é de dez, onze delatores dizendo a mesma coisa, que eu não dava esse tipo de liberdade e nunca misturei uma coisa que era legal, que é a doação de campanha, com qualquer relação com a Prefeitura", disse.

O advogado Felipe Machado Caldeira, que defende Alexandre Pinto, gostou do depoimento do ex-prefeito, apesar das acusações de corrupção e lavagem de dinheiro contra o seu cliente. "O que eles tentam fazer é equiparar o que acontece [em termos de investigação] no Estado para o Município. Só que existem 21 denúncias contra Sérgio Cabral e ele é um personagem muito diferente do Eduardo Paes", disse Caldeira.

Alexandre Pinto foi preso preventivamente em janeiro deste ano na Operação Mãos à Obra, quando o doleiro Juan Luis Bertran Bitllonch também foi preso. O MPF afirma que ele lavou dinheiro com ajuda de familiares e que Juan Bertran tinha R$ 6 milhões que pertenciam a Pinto. O doleiro contou que fez remessas de dólar para o exterior para abastecer uma conta chamada Centovali. Já o advogado afirma que o ex-secretário só conheceu o doleiro na cadeia.