O globo, n. 31272, 21/03/2019. País, p. 4

 

Aprovação em queda

Daniel Gullino

21/03/2019

 

 

 Recorte capturado

 

 

Avaliação positiva do governo diminui 15 pontos, aponta Ibope

Cidades pouco populosas confiam mais em Bolsonaro do que os grandes centros

Uma pesquisa divulgada ontem pelo Ibope mostra que a aprovação do presidente Jair Bolsonaro caiu 15 pontos percentuais desde a posse, em janeiro. Segundo o levantamento, 24% dos entrevistados consideram a atual administração ruim ou péssima, enquanto 34% avaliam como ótima ou boa —percentual que, em janeiro, era de 49%.

De acordo com o Ibope, a avaliação do governo Bolsonaro é pior do que a registrada por seus antecessores na mesma altura do primeiro mandato. No seu terceiro mês após tomar posse, em março de 2011, Dilma Rousseff (PT) tinha um governo avaliado como ótimo ou bom por 56% dos entrevistados pelo Ibope.

Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Fernando Henrique Cardoso (PSDB) também registravam aprovações superiores à de Bolsonaro neste ponto do governo. No caso do tucano, o percentual que avaliava o mandato como regular (43%) era superior aos que consideravam o governo ótimo ou bom (41%).

Quebra de expectativa

A diretora-executiva do Ibope, Márcia Cavallari, lembrou que uma pesquisa realizada pelo Ibope em dezembro, antes da posse de Bolsonaro, mostrou que 64% dos entrevistados consideravam que o presidente faria uma gestão ótima ou boa. Bolsonaro foi eleito, em outubro, com 55,13% dos votos válidos.

— Esta pesquisa de expectativa em relação ao novo governo era bem parecida com a de outros presidentes. Todo mundo caiu em relação a essa expectativa, mas a queda foi menor (nos antecessores). Aparentemente, essas pessoas que não votaram (em Bolsonaro), mas estavam dando um voto de confiança, estão saindo de forma mais intensa —avaliou Cavalari.

Os principais índices negativos a Bolsonaro aparecem no Nordeste, onde 49% afirmam desaprovar o atual governo. A região, a única em que Bolsonaro não obteve mais votos nas eleições de 2018, também registrou o recuo mais acentuado na aprovação do governo, que caiu 19 pontos desde janeiro. Houve ainda uma queda significativa entre quem ganha entre dois e cinco salários mínimos, segmento em que a aprovação do presidente diminuiu 17 pontos, e entre homens, com queda de 18 pontos percentuais.

O porta-voz da Presidência, Otávio Rego Barros, afirmou que o governo irá analisar os dados, mas ressaltou que se trata de uma “fotografia de momento”.

— Como as pesquisas são fotografias de momento, apenas nesse momento nós devemos qualificá-la. Nosso presidente tem um projeto, um pensamento claro, e eventualmente precisa enfrentar algumas vicissitudes —afirmou.

Bolsonaro também enfrenta rejeição nos principais centros do país. Nos municípios acima de 500 mil habitantes, 53% dos entrevistados declararam que “não confiam” no presidente. A aprovação de Bolsonaro nessas cidades diminuiu 15 pontos desde janeiro.

Adesão de evangélicos

Já os melhores índices de Bolsonaro aparecem entre evangélicos — segmento em que 61% aprovam o governo — e eleitores mais ricos. Entre os entrevistados que recebem acima de cinco salários mínimos, a aprovação do presidente é de 55%. Bolsonaro também mostra força nas regiões Norte e Centro-Oeste, onde 42% avaliam positivamente a atual gestão.

Os evangélicos são também os que mais confiam em Bolsonaro, segundo o Ibope: 56% dos entrevistados responderam confiar no presidente, enquanto só 35% disseram não confiar. Durante a campanha eleitoral, lideranças importantes entre os evangélicos manifestaram apoio a Bolsonaro.

O atual governo também mostra adesão nos municípios menos populosos, abaixo de 50 mil habitantes, em que 54% dos entrevistados pelo Ibope dizem confiar em Bolsonaro.

A avaliação positiva (ótima ou boa) do governo, que alcançava 49% dos entrevistados em janeiro, já apresentava queda em fevereiro e desceu novamente em março, para 34%. Já índice de quem considera o governo ruim ou péssimo subiu 13 pontos percentuais, em relação ao levantamento de janeiro, e cinco pontos em comparação a fevereiro, chegando a 24%.

O Ibope realizou 2.002 entrevistas entre os dias 16 e 19 de março. O nível de confiança da pesquisa —isto é, a possibilidade de os resultados retratarem a realidade — é de 95%, e a margem de erro é de dois pontos percentuais, para mais ou para menos.

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É difícil governar só para convertidos

Paulo Celso Pereira

21/03/2019

 

 

Uma das origens da crise que fulminou o segundo governo da ex-presidente Dilma Rousseff estava na incompreensão da petista em relação ao resultado de sua reeleição. Após derrotar o tucano Aécio Neves pela menor margem vista em nossa história republicana, Dilma entendeu que a população lhe dera um salvo conduto para dobrar a aposta em seu estilo. Tratava-se do oposto. Em vez de processar o mea-culpa pelos muitos erros cometidos até então, Dilma fechou-se ainda mais em torno de seus seguidores incondicionais. Deu no que deu.

Desde que foi eleito, o presidente Jair Bolsonaro adotou postura semelhante. Em nenhum momento fez acenos aos derrotados e seguiu com ataques a inimigos reais e imaginários — em suma, todos que não partilham integralmente de sua visão de mundo. De fato foi o discurso radical que o tirou do baixo clero do Congresso e o levou ao papel de principal representante da direita brasileira. Mas sua chegada ao Planalto não foi consequência de um alinhamento da sociedade com o discurso extremista. Pelo contrário.

A principal razão para sua eleição foi a rejeição da maioria da sociedade a dar mais um mandato presidencial ao PT. Durante a campanha, as pesquisas mostravam que qualquer adversário, que não Fernando Haddad, bateria o então candidato do PSL no segundo turno.

Em vez de olhar para o resultado com humildade e buscar um caminho que unisse o país após quatro longos anos de crise política, o presidente optou pelo oposto. Desde outubro, suas manifestações são direcionadas essencialmente para o núcleo que o tirou do ostracismo, os militantes mais aguerridos da direita brasileira. Nessa trilha, Bolsonaro abriu mão inclusive de organizar uma base parlamentar que dê sustentação efetiva às reformas imprescindíveis para a retomada econômica.

A pesquisa Ibope divulgada ontem mostra que a estratégia está dando errado. A queda de 15 pontos percentuais na avaliação positiva do governo em dois meses é de impressionar. Para efeito de comparação, quando a crise de popularidade de Dilma começou, pouco depois da reeleição, sua avaliação despencou19 pontos no Datafolha igualmente num período de dois meses, entre dezembro de 2014 e fevereiro de 2015.

O patamar atual de Bolsonaro ainda é significativamente melhor que aquele do início do segundo governo da petista, mas há um ditado que deve servir de alerta: em pesquisa, o que vale é o “filme”, não a “foto”.