O globo, n. 31229, 06/02/2019. Economia, p. 17

 

Em fase de calibragem

Geralda Doca

Gabriela Valente

Marcello Corrêa

Karla Gamba

06/02/2019

 

 

Guedes já negocia com Congresso, e pontos como idade mínima começam a ser revistos

O vazamento de uma das propostas de reforma da Previdência em estudo no governo deixou claro que as ambições da equipe econômica e do Palácio do Planalto em relação ao tema são diferentes. Enquanto o time do ministro da Economia, Paulo Guedes, quer ousar mais, fixando idade mínima de aposentadoria igual — de 65 anos — para homens e mulheres, a ala política pisa no freio, preocupa dacoma resistência que a reforma pode enfrentar. Diante disso, começam a aparecer sinais de negociação dos pontos mais controversos, em versões alternativas a um texto mais duro. Como resumiu Guedes após encontro com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), para tratar de Previdência, a reforma está sendo “calibrada”.

— Saindo da cirurgia, ele (Jair Bolsonaro) olha e diz: isso aqui, sim; isso aqui, não. Ele tem o cálculo político dele. Estamos calibrando — disse Guedes, em referência ao fato de o presidente estar internado em São Paulo.

A idade mínima, um dos pontos sensíveis, já conta com duas alternativas mais amenas. Uma opção é que a idade mínima de 65 anos só valha para trabalhadores que ingressarem no mercado após a aprovação da reforma. Além disso, existe a possibilidade de que a idade mínima seja diferente para homens (65 anos) e mulheres (63 anos).

Para quem já está no mercado de trabalho, não haverá idade mínima expressa em lei. Estes trabalhadores deverão seguir regras de transição, num sistema de contagem de pontos similar à norma 86/96 (que soma idade e tempo de contribuição), mas com parâmetros mais duros.

O texto final, no entanto, ainda será submetido a governadores e a lideranças no Congresso. Mesmo assim, fazer uma reforma mais dura não será fácil. O vice-presidente Hamilton Mourão reiterou ontem que Bolsonaro não concorda com Guedes sobre a idade mínima:

—O Guedes tem a visão dele, mas é o presidente que vai decidir. Na visão dele (Guedes) é todo mundo igual. Não é isso que se busca hoje? A igualdade? Mas o presidente (Bolsonaro) não concorda.

Ele negou, porém, que a divergência entre os dois em um dos pontos principais da reforma possa trazer atrito:

—Não vai trazer problema. Quem decide é o presidente, ele que foi eleito, nós aqui somos só atores coadjuvantes.

O ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, deixou clara a preocupação do Planalto com uma proposta mais dura. Ao falar sobre a minuta que veio a público, afirmou em entrevista à radio CBN:

—Não, não é. Asseguro que não é. Vocês vão ver quando o projeto chegar que ele é muito diferente doque está publicadono jornal. Ali era um dos ensaios, mas ensaio não é jogo.

O porta-voz da Presidência, Otávio do Rêgo Barros, afirmou ontem, após visita ao presidente no Hospital Albert Einstein, que Bolsonaro está se empenhando para apresentara reforma ao Congresso“no menor prazo possível ”.

Guedes afirmou que o importante é que a reforma da Previdência faça uma economia significativa aos cofres públicos:

— Ai deiaé que ela( a economia) chegue apelo menos R $1 trilhão. Isso é o valor hoje em dez anos. Há simulações de R $1 trilhão em 15 anos também. O importante é que ela tenha potência fiscal para resolver o problema.

O ministro não deu certeza sobre qual idade mínima será apresentada ao Congresso e lembrou que Bolso na rojá defendeupatamar de 62 anos para homens e 57 para mulheres.

Novo projeto na Câmara

Após encontro com Guedes, o presidente da Câmara afirmou que a reforma pode ser votada na Casa ainda em maio e, no Senado, até julho. Mas defendeu que todos os partidos tenham tempo para debatera matéria—oque implicaria n are aberturadas discussões nas comissões. Isso indica que o governo pode ter de enviar novo projeto de Previdência, no lugar de aproveitara proposta do governo Michel Temer, oque aumentaria o tempo de tramitação.

—Não vou da ruma sinalização hoje que mostre um desrespeito ao regimento eque vai criar um ambiente de mui totens ion amento coma oposição, coma minoria, no plenário da Câmara. E não é esse o nosso problema. É discutir que em dois meses tenha 320, 330 deputados a favor — afirmou o parlamentar, que disse que o país teria expansão da economia de 6% em 12 meses após aprovara reforma.

A reforma da Previdência é importante porque ajudará a equilibrar as contas públicas. Só neste ano, o governo precisará desembolsar R$ 218 bilhões para cobrir o rombo no INSS, que paga os benefícios dos aposentados no setor privado. O problema de gastar tanto com aposentadorias e pensões é que sobra pouco para investir em outras áreas. Em 2019, despesas com Previdência consumirão 32,6% do Orçamento da União. Os investimentos ficarão restritos a 8% do total.

“Saindo da cirurgia, ele (Jair Bolsonaro) olha e diz: isso aqui, sim; isso aqui, não. Ele tem o cálculo político dele. Estamos calibrando”

Paulo Guedes, ministro da Economia

“Na visão dele (Guedes), é todo mundo igual. Não é isso que se busca hoje? A igualdade? Mas o presidente (Bolsonaro) não concorda”

Hamilton Mourão, vice-presidente

“Não é esse o nosso problema (os termos da proposta). É discutir que em dois meses tenha 320, 330 deputados a favor”

Rodrigo Maia, presidente da Câmara

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PMs e bombeiros podem entrar na reforma dos militares

Geralda Doca

06/02/2019

 

 

Inclusão foi pedida pelos próprios governadores. Categorias continuariam sem exigência de idade mínima para se aposentar

Os policiais militares e bombeiros dos estados serão enquadrados no estatuto das Forças Armadas (lei 6.880/1980) na reforma da Previdência a ser encaminhada pelo governo ao Congresso. Essa legislação trata dos direitos e deveres das três Forças (Aeronáutica, Marinha e Exército), das condições de quem está na ativa e na reserva e de seus dependentes. Segundo técnicos a par das discussões, a mudança para a categoria vai ocorrer assim que a proposta for aprovada. Com isso, eles passarão a ter um regime próprio de previdência. Mas a questão dos salários continuará sendo uma prerrogativa dos governadores.

O texto da reforma da Previdência que circulou na segunda-feira dava aos governadores prazo de dois anos para aprovação de uma lei específica para os policiais estaduais. Mas isso mudou na versão final da proposta a pedido dos próprios governos regionais e PMs, que sempre defenderam o mesmo tratamento das Forças Armadas, explicou a fonte.

Com isso, assim que o governo federal conseguir aprovar no Congresso um projeto de lei que ajusta o regime de aposentadorias das Forças Armadas, as mudanças valerão imediatamente para os militares dos estados. Entre as medidas em discussão e já acordadas com os comandantes estão aumento do tempo na ativa de 30 para 35 anos e cobrança de contribuição previdenciária de alunos em escola de formação (academia) e de pensionistas. Esses pontos, segundo uma fonte, darão alívio para os estados, que arcam com as despesas de segurança. Os PMs e bombeiros deverão continuar sem exigência de idade mínima para se aposentar.

Caberá ao presidente Jair Bolsonaro decidir sobre o momento de enviar a reforma dos militares ao Congresso. Como a mudança depende apenas de projeto de lei ou mesmo uma medida provisória, um dos planos é esperar que a proposta dos civis, que exige quórum mais qualificado e, portanto, é mais difícil de ser aprovada, avance um pouco no Legislativo.

No Rio, o ingresso de policiais e bombeiros na reserva remunerada ocorre de forma voluntária, depois de 30 anos de serviço, ou em caráter compulsório, após o militar completar 60 anos de idade. No caso da ida para a reserva, os praças e oficiais têm direito ao vencimento integral pago à patente imediatamente superior à sua. É necessária, porém, a permanência na última patente da atividade por um determinado período.