O Estado de São Paulo, n. 45748, 18/01/2019. Política, p. A4

 

Fux paralisa investigação do MP sobre caso Queiroz

Contança Rezende, Rafael Moraes Moura e Teo Cury 

18/01/2019

 

 

O vice-presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Luiz Fux, atendeu a um pedido do deputado estadual e senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) e determinou a suspensão da investigação sobre movimentações financeiras atípicas do ex-assessor parlamentar Fabrício Queiroz. A decisão de Fux paralisa a apuração e vale até o ministro Marco Aurélio Mello, relator do processo no Supremo, analisar o caso depois que o tribunal retomar as suas atividades, em 1.º de fevereiro.

Fux também deixou com Marco Aurélio a decisão sobre o pedido de Flávio para que as “provas” que “instruíram” o procedimento de investigação criminal sejam declaradas ilegais. Marco Aurélio vai determinar se a investigação ficará ou não no STF.

Um relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), revelado pelo Estado em dezembro do ano passado, apontou movimentações atípicas de servidores da Assembleia Legislativa do Rio. O órgão constatou que, de janeiro de 2016 a 31 de janeiro de 2017, Queiroz movimentou mais de R$ 1,2 milhão em uma conta bancária. A quantia foi considerada incompatível com a renda do servidor, perto de R$ 23 mil mensais. Outros funcionários e ex-funcionários de 21 deputados também são investigados.

Neste período de pouco mais de um mês, Queiroz e Flávio faltaram aos convites para depor no procedimento criminal do Ministério Público fluminense.

A suspensão da apuração sobre as movimentações financeiras do ex-assessor ocorre na mesma semana em que o procurador-geral de Justiça do Rio, Eduardo Gussem, disse que pode encerrar a investigação e propor ação penal sem que Queiroz e Flávio prestem depoimento. A decisão de Fux foi tomada anteontem, horas depois de a defesa do senador eleito entrar com uma reclamação na Corte.

Reservadamente, um ministro do STF considerou que a reclamação feita pela defesa de Flávio levou o caso, até então circunscrito ao MP do Rio, para o Supremo – abrindo a possibilidade de a Procuradoria-Geral da República a investigar o senador eleito e, eventualmente, atingir até o presidente Jair Bolsonaro.

No período investigado, Queiroz fez repasses de R$ 24 mil para a primeira-dama, Michelle Bolsonaro. O dinheiro, segundo o presidente, era parte do pagamento de uma dívida com ele, feito na conta de sua mulher. Nathalia Melo de Queiroz, uma das filhas do ex-assessor, foi funcionária do gabinete de Jair Bolsonaro na Câmara.

Foro. O foro privilegiado – duramente criticado pelo presidente quando ainda era deputado – foi utilizado por Flávio para fundamentar os pedidos de suspensão das investigações e de anulação das provas. Em vídeo intitulado “Quem precisa de foro privilegiado?, publicado em março de 2017, Flávio aparece ao lado do pai, que diz: “Eu não quero essa porcaria de privilégio”.

Ao acionar o STF, a defesa de Flávio ressaltou que, em 14 de dezembro do ano passado, depois das eleições, o Ministério Público fluminense pediu informações ao Coaf referentes ao período de 2007 para cá sobre dados sigilosos do senador eleito, o que representaria “usurpação de competência do Supremo”.

Em maio do ano passado, a Corte reduziu o alcance do foro privilegiado para os crimes cometidos no exercício do mandato e em função do cargo – Fux foi um dos sete ministros que votaram a favor desta tese. Na ocasião, foi enfático na restrição do alcance do foro: “Ora o candidato exerce um cargo, ora exerce outro. Quando o processo baixa, ele não anda. Se ele baixa e não anda, quando ele voltar já está prescrito. Então é preciso, efetivamente, que ele tenha um juízo próprio e que o Supremo seja reservado somente para os ilícitos praticados no cargo e em razão dele”, afirmou Fux.

No despacho, o ministro destacou que Flávio foi diplomado no cargo do senador da República, “o qual lhe confere prerrogativa de foro perante o Supremo Tribunal Federal”. Ao suspender as investigações, Fux apontou que cabe ao Supremo decidir se tem ou não competência para cuidar do caso. O ministro afirmou que suspendeu as investigações com o “fim de proteger a efetividade do processo”.

Em entrevista ao Estado, ele defendeu sua decisão. “Tomei uma medida de urgência provisória até o pronunciamento do ministro Marco Aurélio, que deve ocorrer daqui a nove dias úteis, quando acaba o recesso. A minha atuação antecedente e independente em todos os processos demonstra não ser inerente à minha atuação suspender investigações fundadas.”

DO COAF AO SUPREMO

6/dezembro de 2018 Relatório do Coaf

Estado revela que Coaf viu movimentação atípica de R$ 1,2 mi na conta de Queiroz, ex-assessor de Flávio Bolsonaro. Outra transação citada é cheque de R$ 24 mil para Michelle Bolsonaro.

6 e 7/dezembro ‘Confiança’

Flávio diz que Queiroz é de “confiança”. Jair Bolsonaro afirma que cheque é referente a uma dívida do ex-assessor com ele.

17/dezembro Investigação

Promotoria do Rio abre 22 procedimentos de investigação com base no relatório do Coaf – Queiroz é um dos investigados.

19 e 21/ dezembro

Depoimento

Queiroz alega motivos de saúde e não depõe ao MP.

9/janeiro de 2019 ‘Pior bandido’

Queiroz diz ao Estado que vai esclarecer o caso “em breve” e reclama por ser tratado como “o pior bandido do mundo”.

10 e 15/janeiro ‘Padrão Queiroz’

Flávio falta a depoimento. Coaf diz que 28 servidores da Alerj tiveram movimentações atípicas como as de Queiroz.

16/janeiro Suspensão

A pedido de Flávio, STF suspende investigação de Queiroz.