Correio braziliense, n. 20299, 18/12/2018. Política, p. 3

 

Área indígena em discussão

Gabriel Vinhal

18/12/2018

 

 

GOVERNO EM TRANSIÇÃO » Bolsonaro afirma em discurso que a reserva Raposa Serra do Sol, em Roraima, deve ser explorada. STF tirou fazendeiros do local em 2009

O presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL), disse ontem que a demarcação da reserva indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima, será revista no governo dele. A equipe de transição, inclusive, prepara um decreto para oficializar a medida. “É a área mais rica do mundo. Você tem como explorar de forma racional, e, no lado dos índios, dando royalties e integrando o índio à sociedade”, disse. A afirmação foi dada durante participação de Bolsonaro na inauguração do 3º Colégio da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro, batizada de Percy Geraldo Bolsonaro, em homenagem ao pai dele. O colégio é destinado a filhos de policiais militares da Baixada Fluminense.

A Raposa Serra do Sol é uma das maiores áreas de terras indígenas do país, com 1,7 milhão de hectares. Na parte montanhosa, está o monte Roraima, onde está a tríplice fronteira entre Brasil, Guiana e Venezuela. A região, identificada pela Fundação Nacional do Índio (Funai) nos anos 1990, foi demarcada no governo de Fernando Henrique Cardoso. Contudo, só foi homologada em 2005, pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Ainda durante a campanha eleitoral e mesmo depois da vitória nas urnas, Bolsonaro já havia afirmado que, se eleito, novas terras indígenas não seriam demarcadas. Ele já havia defendido a ideia de “integrar o índio à sociedade” e tratá-lo “como um cidadão”, com a justificativa de que todo “índio quer energia elétrica, quer médico, quer dentista, quer internet e quer jogar futebol”. Entretanto, a proposta de Bolsonaro de rever a demarcação da Raposa Serra do Sol esbarra em decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2009.

À época, durante uma disputa judicial entre a União, Roraima e produtores de arroz, a Corte determinou a demarcação contínua das terras e manteve a homologação decretada pelo petista. O governo de Roraima e os arrozeiros da região queriam a revisão das áreas cultivadas com a justificativa de que o grupo produzia cerca de 150 mil toneladas por ano e o território era um tesouro de recursos hídricos e minerais que atraía a atividade clandestina, supostamente comandada pelos indígenas.

 

Ideologia de gênero

Durante a solenidade, que fazia parte da agenda de compromissos do presidente eleito, Bolsonaro também voltou a afirmar que as instituições de ensino militares “estão à frente em grande parte dos demais”, porque  impõem hierarquia e autoridade aos alunos. O futuro chefe de Estado criticou ainda o que chama de “ideologia de gênero”.

“Com o tempo, passou-se a instituir outras coisas à sociedade, como a malfadada ideologia de gênero, dizendo que ninguém nasce homem ou mulher, que isso é uma construção da sociedade. Isso é uma negação a quem é cristão, é uma negação a quem realmente acredita no ser humano. Ou se nasce homem, ou se nasce mulher”, destacou. No fim da visita, Bolsonaro sugeriu que uma passagem bíblica fosse pintada em um dos muros da escola.